Luísa Baptista vive o presente e sonha em voltar a competir um dia

Luísa Baptista vive o presente e sonha em voltar a competir um diaMarcos Escrivani

Adjetivos não faltam. Guerreira, perseverante, obstinada, lutadora. Uma leoa, na acepção da palavra. Assim é Luísa de Baptista Bastos Duarte, 30 anos. Ou apenas Luísa Baptista, triatleta olímpica que marcou presença em Tóquio e na França, representando o Brasil.

Integrante da equipe Sesi São Carlos, ela é natural de Araras. Filha de Jaqueline de Baptista Bastos Duarte, 58 anos e Ronaldo Centelha Bastos Duarte, 60 anos. Tem como irmão, Vítor de Baptista Bastos Duarte.

Em uma entrevista exclusiva, Luísa relatou detalhes dos últimos dois anos. Desde o trágico acidente na Vicinal Abel Terrugi, que liga os distritos de Água Vermelha e Santa Eudóxia, no fatídico 23 de dezembro de 2023.

Luísa, desde então foi uma lutadora. Sofreu múltiplas fraturas, teve 30 ossos do seu corpo quebrados e perfurações no pulmão. Foi internada na Santa Casa de São Carlos, depois no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), foi transferida para o Hospital São Luiz – Itaim, na Zona Sul da capital paulista, onde permaneceu por mais de dois meses na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Fez fisioterapia na Rede Lucy Montoro.

Luísa ficou internada por longos 127 dias, entre UTI e quarto normal. Sessões de fisioterapia para aprender a andar novamente. Voltou a falar gradativamente.

Foi lutadora durante todo esse período e relatou que hoje quer viver intensamente o presente. Não projeta o futuro e agradece a Deus a nova oportunidade de vida.

Como tudo começou

Ararense, Luísa disse que sempre foi apaixonada pelo esporte e fez de tudo, um pouco. Natação, vôlei, tênis, futsal, capoeira, handebol, atletismo. Mesmo criança, parava para assistir os Jogos Olímpicos, seu projeto de vida. “Queria estar nas Olimpíadas. Como técnica ou atleta”.

“Me emocionei, por exemplo, no jogo de vôlei entre Brasil e Itália, quando o técnico Bernardinho ganhou a medalha. Queria fazer Educação Física. Eu era movida pelo sonho olímpico”, lembra.

Ela disse que em determinado momento, quando treinava no A.A. Ararense, teve oportunidade com o Triathlon de conquistar seus sonhos. “Assistia até o Mundialito que passava na Globo. Acreditava que me daria bem neste esporte”.

O que era sonho, começou a se tornar realidade quando tinha 15 anos. O técnico Marcelo Graff a convidou para um teste, pois nadava, corria e pedalava com desenvoltura. “Aprendi o triathlon e participei de uma prova quando o técnico Cali, em 2011, me convidou para disputar uma prova de biathlon e fui bem. Passei a integrar a equipe do Sesi São Carlos e em 2012 cheguei à seleção brasileira júnior. Foi muito rápido. Conquistei títulos brasileiros, sul-americanos e pan-americanos. Disputei duas Olímpiadas (Tóquio, 2021 e França, 2024). Acumulou vitórias e conquistas, mas conviveu com lesões, que em determinados momentos de sua carreira, impediu que conquistasse resultados mais expressivos.

A entrevista

Simpática e atenciosa, Luísa concedeu entrevista e detalhou os momentos tristes que marcaram sua vida, quando aconteceu o acidente, mas frisou a recuperação e a nova oportunidade de poder viver o dia a dia.

São Carlos Agora – Naquele sábado, como você levantou, com quem estava, e porque optou pela vicinal Abel Terruggi? Era um local que normalmente treinava?

Luísa de Baptista Bastos Duarte – Não lembro bem daquele sábado (23 de dezembro de 2023). Apagou da memória. Saí para pedalar com quatro triatletas. Eu, o Messias, o Colucci e o Paulão. Em determinado momento, o Paulão teve uns problemas e eu e ele ficamos para traz. Resolvi fazer uma série (treino) e o Paulão pedalou mais devagar. Então comecei a treinar sozinha. Treinava naquela rodovia desde 2011 e que me lembre, nunca aconteceu algo tão grave.

SCA – Por ser um local movimentado, não causava receio aos triatletas que necessitam longa distância como preparação física?

Luísa – O local é movimento, mas sempre respeitei as regras de trânsito. Treinava bem no cantinho e nunca tive qualquer tipo de receio.

SCA – Consegue descrever como foi instantes antes do acidente? Chegou a ter algum tipo de aviso, sinal?

Luísa – Tudo apagou da minha memória. Não tive um aviso, um sinal do acidente;

SCA – Quais foram os ferimentos que sofreu? Quanto tempo ficou internada. Em quais hospitais? Quando começou a recobrar a consciência?

Luísa – Quebrei 30 ossos do meu corpo e passei por oito cirurgias. Em breve irei para o novo procedimento. Tive duas perfurações no pulmão. Fiquei dois meses em coma e 167 dias internada. Foram dois meses na UTI e dois meses de reabilitação. Depois do acidente fui para a Santa Casa de São Carlos, depois para o Hospital das Clínicas em São Paulo, para o Hospital São Luiz, para a Rede Lucy Montoro e depois retornei para o São Luiz.

SCA – Qual foi a importância da sua família nas primeiras semanas? E dos profissionais da saúde?

Luísa – Minha família foi tudo. Sem eles, não estaria aqui e não teria passado por tudo isso. Foi algo fenomenal. Nos 167 dias que fiquei internada, minha mãe (Jaqueline) se afastou de todos seus afazeres e ficou ao meu lado. Mesmo na UTI que era humanizada. Meus pais e meus amigos sempre comigo no hospital. Quando sai do coma estava amparada e sabia o que aconteceu.

SCA – Após meses internada, entre UTI e quarto, o que pensava durante os momentos que ficava pensativa? Temia pelo pior?

Luísa – Mesmo no período de coma, na UTI, não pensava no pior. Pensava em sair dali e me recuperar. Era meu foco. No São Luiz (hospital) fiz minha caminhada quando mudei de leito. Deveria ir em uma cadeira de rodas, mas ao lado de um fisioterapeuta, fui andando uns 160 metros. Fiz um vídeo até. Foi difícil, mas meu foco era me recuperar. Não temia pelo pior e sim em voltar ao esporte. E vou conseguir fazer isso um dia.

SCA – No dia de sua alta, consegue descrever as sensações, os momentos? O que mais deixou feliz?

Luísa – Quando tive alta fiquei muito feliz. Foi incrível. A princípio ia voltar para a Rede Lucy Montoro (sessão de fisioterapia) para me recuperar de uma cirurgia. Mas o médico disse para fazer em casa, pois era um ambiente tranquilo e com a família que me ama.

SCA – Os primeiros dias em casa, com a família e amigos, como foi? Se sentiu muito paparicada?

Luísa – Acabava a rotina e voltei para casa. Faço fisioterapia até hoje. Mas após minha alta teve festa em casa, no clube (AA Ararense) onde comecei. Lembro que minha alta foi no dia 6 de junho e eu faço aniversário dia 15 de junho. Então comemorei o aniversário em casa.

SCA – Passado os momentos mais sensíveis e dolorosos, como é a Luísa hoje? O que ela quer para seu presente e seu futuro? Que lição tira do passado recente?

Luísa – A Luísa hoje é bem diferente. Antes era perfeccionista e isso fez com que as lesões acontecessem devido aos treinos. Hoje não sou tão perfeccionista. Sou mais feliz, mais grata a vida. Tenho uma nova oportunidade para viver. Comemoro isso todo dia. Aproveito ao máximo. Quero viver intensamente.

SCA – Sonha em voltar a competir em alto rendimento? Pretende estudar para se tornar uma profissional liberal?

Luísa – Sonho em voltar ao esporte de alto rendimento. Mas meu foco mesmo é viver o dia a dia, trabalhar duro. Acredito nesta possibilidade. Pretendo estudar sim, mas as opções são várias. Na verdade, o futuro é incerto, pois não existe estudos sobre meu caso no sentido de voltar a treinar em alto rendimento. Hoje penso no dia a dia e evoluir gradativamente.

SCA – Qual o legado que a Luísa pretende deixar para o futuro?

Luísa – Fazer as pessoas acreditarem, ter esperança, um futuro melhor. Espero que tenha mais pessoas praticando esporte. Ele me deu tudo o que tenho hoje, me deu a vida. Quero inspirar pessoas e quem sabe, proporcionar um futuro melhor. O esporte é incrível. É uma ferramenta única de educação, disciplina, dedicação, foco, respeito, trabalho em equipe. Não existe nada melhor que o esporte. Ele ensina coisas para toda nossa vida.

SCA – Que recado deixa para atletas que treinam em locais movimentados?

Luísa – Respeite as regras de trânsito, não tenham medo. O que aconteceu comigo foi um acaso, uma infelicidade do meu destino. Quando Deus me criou, colocou uma regrinha. No dia 12 de dezembro de 2023 iria sofrer um acidente. Só que Ele nunca soltou minha mão. Em momento nenhum. Por isso estou vida até hoje. O que aconteceu comigo foi o fato de um indivíduo que não cumpriu as leis de trânsito. Apenas acho que a Justiça deveria ter leis mais severas de trânsito. Achar o responsável, comprovar que ele causou o acidente e ser preso. As leis tem que ser mais severas e cumpridas.

SCA – Se encontrasse o responsável pelo acidente em sua frente o que diria a ele? Teria seu perdão? Aconselharia ele?

Luísa – Se eu encontrasse o indivíduo? Seria difícil eu perdoar. Acho que perdoaria ele, após ele pagar na Justiça o que ele fez. Mas até agora não pagou e tenta se defender e não teve um pedido de desculpas da parte dele. Quando tiver um pedido de desculpa formal, talvez perdoe. E que um dia possa se arrepender de ter cometido aquele acidente.

SCA – Por fim, Luísa, qual mensagem que deixa para sua família, seus amigos, sua torcida, para as crianças e para a população em geral?

Luísa – Quero agradecer a minha família, aos meus amigos. Foram primordiais na recuperação. Feliz por ter saído dessa. Que as crianças não temam o que aconteceu comigo. Não parem de praticar esporte. Assim, quem sabe, não teremos um atleta olímpico. Esporte ensina. Que a população não tema o que aconteceu comigo. Que respeite as regras de trânsito.

Fonte: São Carlos Agora. Leia o artigo original: Luísa Baptista vive o presente e sonha em voltar a competir um dia

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