Entidade na mão de político cooptou diretores do INSS e pagou lobista

São Paulo — Uma das associações investigadas pela Polícia Federal (PF) no bilionário esquema de fraude contra aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA) é comandada por um ex-dirigente do Republicanos, pagou cifras milionárias a operadores acusados de corromper agentes do órgão federal, como o “Careca do INSS”, e teve um salto de 300 mil filiados em apenas um ano, chegando a faturar R$ 123 milhões com descontos sobre aposentadorias.

O escândalo do INSS foi revelado pelo Metrópoles em uma série de reportagens publicadas a partir de dezembro de 2023. Três meses depois, o portal mostrou que a arrecadação de 29 entidades com descontos de mensalidade de aposentados havia disparado, chegando a R$ 2 bilhões em um ano, enquanto elas respondiam a milhares de processos por fraude nas filiações de segurados.

As reportagens do Metrópoles levaram à abertura de inquérito pela PF e abasteceram as apurações da Controladoria-Geral da União (CGU). Ao todo, 38 matérias do portal foram listadas pela PF na representação que deu origem à Operação Sem Desconto, deflagrada no dia 23/4 e que culminou nas demissões do presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, e do ministro da Previdência, Carlos Lupi.


CBPA, políticos e INSS

  • A CBPA tem como presidente Abraão Lincoln, que já comandou o Republicanos no Rio Grande do Norte e foi candidato a deputado federal pelo partido em 2018. Ele mantém relação com políticos do partido, tanto figuras regionais como nacionais. Na última semana, por exemplo, ele esteve no aniversário do presidente nacional da legenda, Marcos Pereira.
  • No evento, publicou uma foto com o deputado federal Marcelo Crivella (Republicanos-RJ). “Ao lado de grandes amigos e líderes, celebrando o aniversário do nosso querido Marcos Pereira”, disse. Também declarou apoio presencialmente a Hugo Motta (Republicanos) na disputa à presidência da Câmara dos Deputados, em novembro de 2024 (foto em destaque).
  • Segundo a Polícia Federal, a CBPA não tinha um associado em 2022, quando firmou seu acordo com o INSS para poder efetuar descontos de mensalidade sobre aposentados.
  • No ano seguinte, já eram mais de 340 mil, resultando em uma arrecadação anual de R$ 57,8 milhões. No primeiro trimestre de 2024, auge da farra dos descontos, o número de filiados chegou a 445 mil, e o faturamento bateu R$ 41,2 milhões no período.
  • Agentes da Controladoria-Geral da União (CGU) entenderam que a confederação não tem estrutura para atender esse contingente e desconfiam de fraude.
  • Como o próprio Metrópoles mostrou, nos tribunais de todo o país, a CBPA responde a milhares de processos e tem sido condenada por não ter provas de que filiou aposentados de forma voluntária.
  • Em 2024, o ex-diretor de benefícios, André Fidelis, pegou uma diária somente para ir a uma festa da entidade. Ele foi demitido em julho daquele ano em consequência da série de reportagens “Farra do INSS“, do Metrópoles

Propina e “conflito de interesse”

Fidelis não era o único dirigente do INSS bem relacionado com a CBPA. A PF identificou que o Guilherme Serrano, que foi presidente do instituto de previdência no governo de Jair Bolsonaro, estava em uma assembleia da entidade em agosto de 2021, justamente aquela em que ficou decidido que ela poderia fazer o acordo com o órgão para poder descontar mensalidade direto da folha de pagamento dos aposentados.

Depois, ele seria justamente o signatário do acordo da CBPA com o INSS, órgão que comandou entre abril de 2022 e janeiro de 2023. A PF levantou a possibilidade de conflito de interesse nessa proximidade de Serrano com a entidade suspeita.

Sobre a CBPA também recaem suspeitas de pagamento de propina a agentes do INSS. Ela deu procuração para que o empresário Adelino Rodrigues atuasse em seu nome. Ele é um dos investigados pelo pagamento de propinas na Operação Sem Desconto. Fez pagamentos de R$ 60 mil, por exemplo, à mulher do procurador-geral do orgão, Virgílio Oliveira Filho, afastado do cargo após a ação da PF.

A CBPA ainda aparece como uma das entidades que pagaram o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”. Ele é suspeito de fazer pagamentos milionários à esposa do procurador-geral do INSS e também ao filho de Fidelis, que, segundo a PF, seria propina de entidades para manter seus acordos de cooperação com o INSS.

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