Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) aponta para falhas na implementação do PAC Cidades Históricas (PAC-CH) no Rio de Janeiro (RJ).
O programa do governo federal, que surgiu em 2013, visava a manutenção e restauro de monumentos e conjuntos urbanos em cidades históricas brasileiras, que receberiam cerca de R$ 1,6 bilhão em investimentos.
A análise da CGU focou apenas na cidade do Rio de Janeiro, cujo valor previsto, segundo o órgão, era de R$ 203,6 milhões. O relatório, no entanto, concluiu que os objetivos do programa -como preservação histórica e da infraestrutura- não foram alcançados na capital fluminense.
Segundo o Iphan, órgão responsável por avaliar os projetos, as ações no Rio de Janeiro incluíam a restauração dos seguintes bens:
- Antigo Automóvel Clube, destinado a sediar o Centro de Representação da Cidade do Rio de Janeiro nos eventos internacionais;
- Palácio Gustavo Capanema;
- Biblioteca Nacional;
- Museu Nacional de Belas Artes;
- a antiga sede das Docas na Avenida Rio Branco (atual Superintendência do Iphan-RJ);
- casarão na Praça da República (Centro Nacional de Arqueologia);
- Museu da República e seu jardim histórico;
- Museu Histórico Nacional; e
- tradicionais bicas e chafarizes do Rio de Janeiro, como o do Lagarto, Paulo Fernandes e Riachuelo.
Além das obras de restauração, o plano também contemplava ações como a revitalização do Museu do Trem e a requalificação do entorno do Passeio Público, no Bairro Serrador. Já as intervenções exclusivamente de requalificação previam melhorias no entorno do Passeio Público e a complementação do projeto Lapa Legal.
Embora mais de uma década tenha passado desde o começo do programa, a CGU afirma que os resultados ainda não foram atendidos.
“Verificou-se que a implementação do PAC-CH na cidade do Rio de Janeiro apresentou falhas, e os objetivos não foram atingidos após mais de 11 anos do lançamento do Programa”.
Segundo o documento, o montante previsto para a capital foi de aproximadamente R$ 203,6 milhões, dos quais apenas 50% foram executados.
Desse total, diz a Controladoria, R$ 31,3 milhões foram aplicados em obras ou projetos concluídos e utilizados. Outros R$ 67,6 milhões foram empregados em obras ainda em andamento. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) aponta que a execução do programa foi prejudicada por cortes orçamentários.
“Como pode ser observado, apenas cerca de 50% dos recursos previstos foram executados, o que não resultou na mesma proporção em intervenções finalizadas e aderentes aos objetivos desejados, dentre eles a preservação da história e/ou a infraestrutura cultural e turística do município para seus cidadãos e visitantes”, diz trecho do documento.
No PAC CH, iniciado em 2013, foi previsto que 44 cidades, de 20 estados, reconhecidas como patrimônio nacional e/ou mundial, receberiam o investimento de R$ 1,6 bilhão para a recuperação, restauro e qualificação de seus conjuntos urbanos e monumentos.
Dentro do programa, foram contempladas 425 ações de conservação e requalificação urbana de edifícios e espaços públicos e coube ao Iphan a concepção dessa linha do programa.
O objetivo do PAC era estimular a geração de renda e novos empregos por meio da restauração do patrimônio cultural do país, além de auxiliar no planejamento urbano das cidades contempladas.
O escopo da avaliação da CGU se deu dentro desses objetivos, e não foram avaliados processos licitatórios, itens orçamentários e decisões técnicas de engenharia.
Dentro do programa, coube ao Iphan avaliar e aprovar os projetos de arquitetura e engenharia, além dos orçamentos, de acordo com os decretos e normativas federais. Os parceiros ficam responsáveis por produzir os projetos de acordo com os critérios estabelecidos.
O órgão repassa o recurso e estes parceiros ficam responsáveis pelos contratos dos projetos e da obra.

“Obras inservíveis”
Algumas das falhas citadas pela CGU têm relação com a execução e pagamentos de obras e projetos “inservíveis”, ou seja, ociosos, que somam R$ 2,4 milhões.
O resultado, segundo a auditoria, foram dois museus fechados à visitação, dois imóveis voltados para a atividade administrativa indisponíveis para ocupação e dois museus em funcionamento, mas em situação de risco de “danos irreversíveis” e uma biblioteca que precisa de reforma na parte elétrica.
O valor milionários, segundo a CGU, foi aplicado em projetos que não serão executados por “razões diversas ou obras canceladas por não atenderem a padrões aceitáveis”.
A Fundação Biblioteca Nacional, por exemplo, está aberta, mas apresenta problemas nas instalações elétricas. Já o Museu do Trem está fechado enquanto aguarda o novo plano museológico e recursos para obras.
O Museu da República e seu jardim histórico também enfrentam dificuldades. Apesar de aberto, há a necessidade de escoramento de parte do prédio, além de outros problemas. O Museu de Belas Artes está fechado e em obras com recursos de outra fontes.
Além das questões físicas, a CGU também aponta para diferenças financeiras entre o valor estimado no processo de seleção das intervenções e o valor de fato aplicado.
“Constata-se assim que as ações selecionadas pelo PAC CH no município do Rio de Janeiro, via de regra, não foram executadas e concluídas em conformidade com os projetos, orçamentos e cronogramas estipulados nos contratos, nem dentro de um horizonte planejado para o Programa. Vale destacar que as metas previstas não estavam bem definidas em todas as ações, o que dificultou algumas análises”, concluiu a CGU.
Recomendações
O trabalho de auditoria resultou na recomendação de uma série de melhorias que devem ser adotadas para uma nova etapa do PAC. Foi indicado ao Iphan, por exemplo, que aperfeiçoe a instrução dos processos para obter mais transparência quanto às alterações orçamentárias.
A CGU recomenda ainda que o órgão institua um plano de implementação com cronogramas, metas e um plano de monitoramento, com a definição de um fluxo de acompanhamento periódico das ações.
Além das recomendações, a CGU levanta a possibilidade de que alguns dos problemas relatados no PAC podem ser reflexo da extinção da Diretoria que supervisionava e monitorava a execução das obras do programa.
“Conclui-se, portanto, que a extinção da área específica do Iphan que visava o gerenciamento do PAC Cidades Históricas pode ter contribuído para uma estrutura de governança inadequada e, consequentemente, para as falhas na execução do Programa, diz a CGU.
O Iphan, contudo, argumenta que a Diretoria do PAC não foi extinta, mas apenas passou por uma reestruturação.
“Em 2017, por meio do Decreto nº 9.238, foi aprovada uma nova estrutura regimental que instituiu o então Departamento de Projetos Especiais (DPE). “Na atual gestão, o Iphan promoveu a reestruturação de seu Regimento Interno, e o DPE passou a ser denominado Departamento de Ações Estratégicas e Intersetoriais (DAEI)”, diz o órgão.
Defesa
Procurado pela coluna, o Iphan afirmou que o PAC-CH foi direcionado a cidades com sítios tombados em nível federal que apresentaram um Plano de Ação ao Iphan, com prioridade para as cidades declaradas Patrimônio da Humanidade, as que estavam em maior risco e as que eram marcos no processo de ocupação do país.
No entanto, diz o órgão, “a execução do programa foi prejudicada por cortes orçamentários, levando à diminuição significativa de suas atividades em 2019”.
Segundo o Iphan, a governança do PAC foi estruturada a partir da cooperação entre diferentes órgãos, entes e entidades. No âmbito do PAC Cidades Históricas (PAC-CH), ganhou destaque a participação de municípios, estados, universidades e outras instituições federais, além do apoio técnico da Caixa Econômica Federal.
“Cada etapa das ações era conduzida por um dos executores, com os cronogramas sendo estabelecidos de acordo com o progresso de cada atividade. Assim, a conclusão das ações era determinada somente após a contratação das obras e a apresentação do cronograma físico-financeiro ao órgão responsável pela contratação”, afirmou em nota enviada à coluna.
“O Iphan, com apoio do Governo Federal, segue descentralizando os recursos conforme as demandas, garantindo a execução das ações de preservação e valorização do patrimônio cultural”, concluiu.
O instituto também apresentou uma resposta à CGU no curso da auditoria.
Afirmou que possui planilhas específicas para registrar as ações do programa, um sistema de alerta de vencimentos de projetos, além de haver o monitoramento contínuo da vigência dos instrumentos firmados e um sistema de arquivamento organizado para todos os documentos relacionados aos contratos.