Hidrogênio Verde: projetos no Brasil focam na exportação de energia

Em uma reunião na Organização das Nações Unidas (ONU) há quase 10 anos, Dilma Rousseff sugeriu, em seu pronunciamento, a ideia de estocar “vento”. A fala feita em setembro de 2015 prontamente virou munição contra a então presidente do Brasil, com inúmeros memes que rapidamente se espalharam pela internet.

Os anos se passaram e, hoje, o que se vê é o desenvolvimento dos projetos de geração de hidrogênio verde. De acordo com um levantamento da Confederação Nacional da Indústria em 2024, são previstos investimentos superiores a R$ 188 bilhões no desenvolvimento de plantas do hidrogênio verde no país dentro dos próximos anos.

A produção de hidrogênio verde é feita a partir de um processo chamado de eletrólise da água, que quebra a molécula de H₂O e separa oxigênio de hidrogênio, utilizando energia elétrica renovável, como a produzida por meio eólico ou solar – sendo assim, livre de emissões de carbono –, com possibilidade de ser armazenado como gás ou líquido e facilmente transportado. As células, então, podem abastecer inúmeras indústrias, como siderurgias, refinarias e outras, substituindo o combustível fóssil e, consequentemente, a emissão de carbono no meio ambiente.

“(Hidrogênio verde) é literalmente estocar vento. Você transforma o vento em energia líquida e exporta para qualquer lugar. A mesma coisa com energia solar. Então, hidrogênio é uma forma de transformar sol e vento em energia que transporta para qualquer canto, mesmo sem um cabo de transmissão”, resume o ex-presidente da Petrobras Jean-Paul Prates.

A lista de projetos nessa área no Brasil chega quase a duas dezenas de iniciativas, passando desde o Porto do Açu, no Rio de Janeiro, até o Piauí, passando pelo Complexo do Pecém, no Ceará, por Minas Gerais e pela Bahia, quase todos com foco em uma rota de exportação da energia “estocada” para Europa e Ásia.

No entanto, para Jean-Paul, o Brasil ainda está em um estágio embrionário no que diz respeito ao hidrogênio verde. O ex-gestor da empresa estatal, que há mais de 30 anos atua na área de geração de energia no Brasil e no exterior, destaca que os projetos no país seguem também uma lógica internacional.

“A gente está na fase zero. E o que é isso? É muito projeto apenas no papel. O fato de você não ter chegado ainda ao momento de ter uma planta em escala, com um contrato firme de suprimento e um preço mais ou menos definido de mercado, não significa que nós não estejamos prontos, mas é que o mercado mundial mesmo não está pronto.”

Ex-presidente da Petrobras Jean-Paul Prates

Foto colorida de exemplos de energia limpa - Metrópoles
Hidrogênio verde é uma forma de transformar sol e vento em energia

Futuro sustentável

Na visão de Jean-Paul Prates, o hidrogênio verde é a chave para um futuro sustentável.

“Isso é o futuro para o Brasil e o nosso Nordeste, principalmente. Embora não tenha inaugurado ainda nenhuma planta, está progredindo muito. Tem projetos muito sérios que estão progredindo, fazendo estudos no mar, para um eventual suprimento de energia em offshore”, completou.

Um passo dado pelo Brasil nesse panorama mundial, na avaliação da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV), foi a aprovação da Lei nº 14.948, em agosto de 2024, que criou o Marco Legal do Hidrogênio de Baixo Carbono e o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono. O programa assegura um incentivo fiscal de R$ 18 bilhões para o desenvolvimento industrial com a energia limpa entre 2028 e 2032.

Desafios da nova tecnologia

No entanto, apesar da perspectiva positiva para a economia e, especialmente, para o meio ambiente, os especialistas alertam para gargalos e desafios na implantação da nova tecnologia para geração de energia limpa.

“Os projetos de hidrogênio estão aí, mas as petroleiras decidiram aumentar a velocidade de produção, porque se sabe que vai chegar a uma restrição tal que não vai se conseguir explorar. Temos informações de várias petroleiras se preparando para o mercado de hidrogênio, investindo em pesquisa. Se a gente ficar esperando, vai ter que comprar a solução dos outros, como aconteceu com a energia eólica, como aconteceu com a solar”, ressalta o professor Ricardo Lúcio Ribeiro, do Departamento de Engenharia Elétrica e líder do Grupo de Transição Energética da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Na mesma linha, o ex-presidente da Petrobras alerta para a necessidade de um ambiente de negócios seguro para os investimentos. Como exemplo, Prates cita a recente questão dos cortes de geração que levaram usinas eólicas e solares à Justiça, cobrando um prejuízo superior a R$ 2 bilhões.

“Temos a oportunidade de atrair uma indústria verde que pudesse vir para cá consumir energia 100% limpa e renovável, mas você acaba tendo problemas de credibilidade e de atratividade em função dessas situações como agora, por exemplo, em que há um corte de quase 70% da receita de um parque eólico”, avalia Jean.

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