Escolhas de Lula mostram incoerência entre agenda ambiental e petróleo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou à Presidência com a promessa de retomar a política ambiental brasileira, mas esbarrou, ao longo do primeiro ano de mandato, na defesa da exploração de novas fronteiras de petróleo.

A 28ª Conferência das Nações Unidas para Mudança do Clima (COP28) em Dubai, nos Emirados Árabes, ocorreu em dezembro de 2023. O evento internacional reuniu lideranças mundiais para discutir o futuro global em meio à emergência climática. O petista também esteve presente nos painéis de discussão e levou ministros da área para abrir diálogo com outros países.

Durante o painel sobre proteção das florestas, em 2 de dezembro, o presidente Lula chegou ao palco acompanhado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), e se emocionou ao falar sobre o trabalho realizado por ela sobre preservação ambiental.

“Acho que é justo que, para falar da floresta, em vez de falar o presidente, que é de um Estado que não é da floresta, a gente ouça ela, que é a responsável pelo sucesso da política de preservação ambiental que estamos fazendo no Brasil”, afirmou Lula, diante de aplausos dos participantes.

Contudo, toda a emoção do presidente ocorreu horas depois de ele defender a participação do Brasil na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep+), que, segundo o mandatário brasileiro, seria para influenciar os produtores de petróleo a reduzir a exploração de combustíveis fósseis.

“Eu acho importante a gente participar [da Opep+], porque precisamos convencer os países produtores de petróleo de que eles precisam se preparar para o fim dos combustíveis fósseis”, alegou Lula.


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Entretanto, o discurso não convenceu todo mundo. Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, alertou para a incoerência do presidente em pedir a defesa do meio ambiente, mas colocando o Brasil como grande potência exportadora de petróleo.

“O governo Lula quer ao mesmo tempo ser um líder climático e um petro-Estado. Quer passar de nono produtor de petróleo do mundo para quarto lugar. Isso não é consistente com essa liderança climática e ambiental de forma mais ampla que o governo Lula se propõe a assumir”, argumentou Suely Araújo.

Marina Silva defendeu, em diferentes encontros na COP28, o fim do uso de combustíveis fósseis e comentou sobre a necessidade em dar mais atenção à emergência climática.

“A métrica do sucesso da COP depende da linguagem em relação aos combustíveis fósseis. É preciso uma linguagem clara em relação a essa questão para viabilizar os meios para a adoção de energias renováveis e os meios para tirar o pé do acelerador dos combustíveis fósseis”, ressaltou a ministra do Meio Ambiente.

Mas o discurso do governo Lula em defesa do fim dos combustíveis fósseis não durou muito tempo. Logo depois da COP28, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou, no fim da primeira quinzena de dezembro, as sessões para licitação do 4º Ciclo da Oferta Permanente, onde ofertou cerca de 600 blocos de exploração de petróleo e gás em diferentes partes do país.

Margem Equatorial

Em outubro, Alexandre Silveira (PSD-MG), ministro de Minas e Energia, defendeu a expansão da fronteira de petróleo. “Nós temos reservas de petróleo que nos colocam entre os maiores produtores do mundo. O país ainda é dependente do combustível fóssil, e nossa melhor área de nova fronteira é a Margem Equatorial”, afirmou.

A Margem Equatorial citada por Silveira se estende do litoral do Rio Grande do Norte até o Amapá e conta com cinco bacias. A Petrobras tem estudado a possibilidade de exploração de petróleo durante toda a extensão.

Uma das bacias da Margem Equatorial é a Foz do Amazonas, localizada no extremo norte do país. Ambientalistas têm se posicionado contra a autorização para exploração de combustíveis fósseis no local.

Luiza Lima, porta-voz do Greenpeace Brasil, destacou a necessidade de um discurso coerente no governo Lula, algo que demonstre a real intenção do Executivo em proteger o meio ambiente.

“É fundamental que o governo como um todo possa se posicionar de uma forma enfática contra a exportação de petróleo em áreas sensíveis como na Amazônia, e que novos projetos energéticos tenham garantia e salvaguardas bem desenhadas de proteção ambiental e social”, ressaltou Luiza Lima.

O presidente Lula tem se colocado em defesa da pesquisa sobre a possibilidade para exploração de combustíveis fósseis na Margem Equatorial, apesar dos alertas apresentados pela ala ambiental conduzida por Marina Silva.

“Se encontrar a riqueza que se pressupõe que exista lá, aí, é uma decisão de Estado se você vai explorar ou não. Mas, veja, é uma exploração a 575 km à margem do [rio] Amazonas. Não é uma coisa que está vizinha do Amazonas”, argumentou o petista durante coletiva de imprensa em Nova Délhi, na Índia, em setembro.

A discussão sobre o aumento da fronteira de petróleo tem evidenciado a diferença entre os discursos do primeiro escalão do Executivo, e há uma tendência do Planalto em apoiar o aumento da exploração de combustíveis fósseis.

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