Cidades prontas para o futuro (por Marcos Magalhães)

As eleições de outubro darão às cidades brasileiras um gostinho daquele raro protagonismo que elas experimentam a cada quatro anos. Mas a súbita importância terá pouco a ver com o debate sobre os espaços urbanos que abrigam 61% da população.

Muita gente vai especular como as vitórias municipais moverão peças no grande jogo da política nacional. Os melhores comentaristas serão escalados para identificar como as escolhas de 2024 afetarão as chances dos candidatos às grandes eleições de 2026.

Nem sempre as urnas locais ditam as tendências esperadas para dois anos depois. Elas merecem atenção, porém, por um motivo que ainda não foi captado pelos radares de muitos analistas: as cidades, em si, têm projeção política cada vez maior.

E a qualidade de vida nos grandes centros tem cada vez mais importância nas decisões de pequenas e grandes empresas sobre futuros investimentos, assim como na atração dos nômades digitais, que escolhem onde no mundo montarão suas tendas.

O papel das cidades nesse mundo que se redesenha – especialmente após a pandemia – atraiu a atenção da escola de negócios IESE, ligada à Universidade de Navarra, na Espanha.

A escola criou o índice IESE Cities in Motion, dedicado a medir a “complexidade e o dinamismo das cidades no atual contexto global”. Alguma coisa como identificar que cidades no mundo estão mais preparadas para o futuro.

Para a edição de 2024, que acaba de ser publicada, foram analisadas 183 cidades em 92 países. Tudo sob nove dimensões: capital humano, coesão social, economia, governança, meio ambiente, mobilidade, planejamento urbano, perfil internacional e tecnologia.

O trabalho atraiu atenção do Fórum Econômico Mundial, que o republicou em suas redes sociais. E mostra o quanto nossos grandes centros urbanos ainda estão distantes, segundo os critérios escolhidos, das principais metrópoles globais.

A maior cidade brasileira, São Paulo, com seus 11,4 milhões de habitantes, está neste ano na posição de número 128 do índice IESE. O Rio de Janeiro, com 6,2 milhões, detém a posição 134. E mesmo Curitiba, cidade modelo de 1,7 milhão, ficou em 148º lugar.

A cidade mais bem posicionada da América Latina foi Santiago do Chile, em posição de número 91. Ou seja, 37 passos à frente de São Paulo. A capital chilena ganhou pontos ao garantir que 30% de sua frota de ônibus já seja movida a eletricidade. São Paulo promete 20% de ônibus elétricos até o fim deste ano.

Depois de Santiago, as cidades mais bem posicionadas na América Latina são Buenos Aires (115), Montevidéu (119), Cidade do México (120) e Cidade do Panamá (127).

E quais são as metrópoles globais no topo do índice elaborado pela escola espanhola de negócios? As cinco primeiras se distribuem entre três continentes: três na Europa, uma na América do Norte e uma na Ásia.

A grande campeã é Londres. Ela vem em primeiro lugar nos itens perfil internacional e planejamento urbano. Ou seja, tem projeção global e pode ser vista como modelo de cidade voltada para o século 21.

A capital do Reino Unido é apontada como a mais inteligente da Europa, graças à sua rede de telefonia 5G e de carregadores de veículos elétricos, além da maior quantidade de edifícios ambientalmente certificados.

A cidade estabeleceu a meta de emissão líquida zero de carbono até 2030. A estratégia de segurança inclui o uso extensivo da rede 5G por sensores, câmeras, drones e robótica para ampliar a vigilância e fornecer rápida resposta a incidentes.

Nova York, maior cidade dos Estados Unidos e sede da Organização das Nações Unidas, vem em segundo lugar no índice IESE, especialmente por causa de sua pujança econômica – o que inclui o PIB atual e a quantidade de empresas inovadoras.

Em seguida vem Paris, que recebe neste ano os Jogos Olímpicos. A capital francesa destaca-se em aspectos como mobilidade urbana e capital humano. O quarto lugar pertence a Tóquio, que lidera o ranking na Ásia, seguida de perto por Singapura.

E a lista dos cinco primeiros lugares termina com Berlim. Segundo o levantamento, o foco da capital alemã em qualidade ambiental e coesão social ressalta seu “compromisso com um futuro “equitativo e sustentável”.

Os altos níveis de desenvolvimento dos países onde se situam as cinco metrópoles exercem, naturalmente, grande influência em seus bons posicionamentos no índice.

Mas nem tudo se explica pela economia. Beijing, a capital da segunda maior potência global, por exemplo, ficou em quarto lugar na Ásia e na 17ª posição global.

Ao mesmo tempo, Londres se mantém no topo do índice desde 2021, apesar de o Reino Unido ocupar a posição de sexta maior economia global – três degraus acima do Brasil.

Pois, se o Brasil agora tem a nona maior economia do mundo, segundo o Fundo Monetário Internacional, ainda está longe de ver suas maiores cidades entre as mais importantes metrópoles globais.

As eleições deste ano oferecem uma boa oportunidade para desenhar um futuro mais promissor para os nossos grandes centros urbanos. O primeiro passo será garantir ao tema da qualidade de vida nas cidades a importância que ele merece.

 

Marcos Magalhães. Jornalista especializado em temas globais, com mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Southampton (Inglaterra), apresentou na TV Senado o programa Cidadania Mundo. Iniciou a carreira em 1982, como repórter da revista Veja para a região amazônica. Em Brasília, a partir de 1985, trabalhou nas sucursais de Jornal do Brasil, IstoÉ, Gazeta Mercantil, Manchete e Estado de S. Paulo, antes de ingressar na Comunicação Social do Senado, onde permaneceu até o fim de 2018.

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