Geralmente definida como a faixa etária entre 50 e 60 anos, a meia-idade é um ponto de inflexão. É um momento em que nossos comportamentos passados começam a nos afetar e começamos a notar nossos corpos e mentes envelhecendo — às vezes, de maneiras frustrantes ou desconcertantes. Mas também é uma oportunidade: o que nossos anos mais avançados parecerão e sentirão não está pré-destinado, e ainda há tempo para fazer ajustes para melhorar a saúde e o bem-estar no futuro.
– Coisas que você faz ou coisas que acontecem na meia-idade podem ter efeitos a longo prazo na vida posterior – disse Margie Lachman, professora de psicologia na Universidade de Brandeis e especialista em meia-idade. – Então, é um período realmente importante para prestar atenção ao seu corpo.
O jornal The New York Times pediu aos leitores suas perguntas mais urgentes sobre a meia-idade, e recebeu mais de 800 respostas, que variam do mundano ao existencial. Embora a experiência de envelhecimento de cada um seja diferente, sete questões apareceram repetidamente.
Aqui está o que os especialistas disseram sobre essas preocupações comuns, como e por que elas surgem, quais podemos retardar ou adiar, e por que nem todas as mudanças são ruins.
De onde vêm essas dores e desconfortos?
Algumas dessas dores podem ser apenas dores musculares simples. As pessoas tendem a ser menos ativas na meia-idade do que eram na juventude, e se você não está acostumado a trabalhar um grupo muscular específico, tarefas como limpar o jardim ou remover a neve podem deixá-lo dolorido depois, disse Scott Trappe, professor de bioenergética humana e diretor do Laboratório de Performance Humana da Universidade de Ball State.
A massa muscular também começa a diminuir naturalmente na meia-idade, o que pode resultar em articulações doloridas.
– O que o músculo faz é carregar parte do peso que você está carregando e aliviar as articulações da dor – explica Arun Karlamangla, professor de medicina na Universidade da Califórnia de Los Angeles (UCLA) especializado em geriatria.
Além disso, nossas articulações ficam mais rígidas à medida que envelhecemos devido ao acúmulo de desgaste, o que pode resultar em tecido cicatricial.
– Os tendões e os músculos perdem um pouco de sua plasticidade – pontua Trappe – E quando você combina músculos fracos e articulações rígidas com movimento, especialmente movimentos rápidos (de torção ou de alta força), você pode acabar com algo que se rompe ou estala – afirmou.
Existe um risco adicional de lesões nas mulheres, à medida que os ossos se tornam mais fracos quando o estrogênio diminui durante a menopausa.
– Você não sente a perda de densidade óssea. Não dói – detalha a diretora do Centro de Saúde da Mulher da Mayo Clinic e diretora médica da The Menopause Society (em português, A Sociedade da Menopausa), Stephanie Faubion – Você não sente nada até quebrar algo.
Há algo que eu possa fazer?
Todos esses problemas — força muscular, densidade óssea e saúde das articulações — podem ser melhorados com exercícios. O treinamento de força é crucial para compensar a diminuição da massa muscular e da densidade óssea, e o exercício aeróbico tem importantes benefícios cardiovasculares e outros para a saúde.
– A solução é a atividade física – disse Karlamangla.
Isso se aplica não apenas a problemas musculares e articulares, mas praticamente a qualquer mudança relacionada à idade.
Karlamangla acrescentou que não há razão para não continuar se desafiando em seus treinos, como correr em vez de caminhar ou aumentar os pesos que você está levantando.
– Mesmo um pouco de atividade física é boa – disse ele – Mas para obter o maior benefício, procure uma intensidade moderada ou vigorosa. Converse com um personal trainer, fisioterapeuta ou seu médico, se tiver lesões ou preocupações de saúde específicas a serem consideradas.
Por que estou ganhando peso de repente?
Por décadas, a suposição geral era que as pessoas enfrentam mais dificuldades com o peso na meia-idade, uma vez que ometabolismo diminui repentinamente. No entanto, um artigo de 2021 publicado na revista Science levantou dúvidas sobre essa conclusão. A pesquisa mostrou que a quantidade de calorias que as pessoas queimam, através do metabolismo basal e das atividades diárias é, na verdade, bastante estável dos 20 aos 60 anos. (O metabolismo é mais rápido da infância até a adolescência, de acordo com o estudo, e diminui novamente na velhice.)
– Todo mundo pensava que ele diminuiria na meia-idade, mas não diminui nada – disse Herman Pontzer, professor de antropologia evolutiva na Universidade Duke, que liderou o trabalho.
Em vez disso, Pontzer disse que o que parece ser um ganho de peso repentino quando você atinge a meia-idade é mais provavelmente o acúmulo de um ou dois quilos por ano ao longo das últimas décadas. As pessoas podem apenas não ter notá-lo até atingir os 40 anos e estarem nove quilos mais pesadas do que eram na faculdade. Esse ganho de peso gradual, acrescentou ele, geralmente é causado pelo fato de as pessoas comerem calorias a mais do que o corpo queima todos os dias.
Nem todos concordam com a conclusão de Pontzer. Susan Roberts, associada sênior mais antiga de pesquisa fundamental na Faculdade de Medicina Geisel, de Dartmouth, disse que algumas mudanças biológicas começam a ocorrer na meia-idade e podem afetar a composição e o metabolismo do corpo.
Primeiro, o declínio natural na massa muscular pode alterar a aparência de uma pessoa no espelho, especialmente se tiver aumentado a gordura corporal ao longo dos anos. No entanto, essa mudança não tem um grande efeito no metabolismo — um quilo de músculo queima apenas cerca de 4 calorias a mais por dia do que um quilo de gordura.
Um fator maior na desaceleração do metabolismo é o cérebro, que representa cerca de 20% do uso de energia do corpo. Nossos cérebros começam a encolher gradualmente na idade adulta, e um menor volume cerebral pode significar menos calorias queimadas, disse Roberts.
– Não acho que o cérebro seja o único fator, mas acho que é importante e não é realmente reconhecido.
Por que tudo parece se acumular na minha região abdominal?
Homens e mulheres tendem a se queixar de um aumento na gordura abdominal, em particular, na meia-idade. Há evidências de que, pelo menos para as mulheres, a queixa é justificada: por razões que os cientistas ainda não entendem completamente, à medida que os níveis hormonais mudam com o início da menopausa, a gordura começa a se acumular mais na barriga e menos nos quadris ou nas coxas.
Nós nos transformamos de peras em maçãs, disse Faubion.
– Isso não se traduz em uma mudança na balança. Os fatores mencionados acima causam isso. Mas, juntos, é uma combinação um pouco desagradável para as mulheres.
Perimenopausa; que diabo é isso?
A perimenopausa pode pegar as mulheres de surpresa. A menopausa é definida como a ausência de menstruação por um ano, e ocorre, em média, por volta dos 51 anos. Porém as mulheres podem experimentar flutuações dramáticas na função ovariana e nos níveis de estrogênio por até 10 anos antes de parar de menstruar — em alguns casos, começando muito cedo,como em meados dos 30 anos.
Historicamente, essa “montanha-russa hormonal” da perimenopausa era descartada pelos médicos, disse Faubion.
– Nós costumávamos dizer às mulheres — eu costumava dizer às mulheres — que, “Oh, você ainda está menstruando regularmente, você não pode estar tendo sintomas de menopausa”. “Mas agora sabemos que você pode, de fato, ter os mesmos sintomas da menopausa e estar na perimenopausa.
Os fogachos e os suores noturnos são os sintomas mais frequentemente relatados, mas irritabilidade, confusão mental e sentimentos de ansiedade e depressão também são comuns. Muitas mulheres experimentam distúrbios do sono devido aos suores noturnos, embora Faubion acredite que as mudanças hormonais possam contribuir para a insônia de outras maneiras que ainda não entendemos.
A terapia hormonal pode ajudar, e os riscos de efeitos colaterais são menores quando é iniciada precocemente.
Tecnicamente, o tratamento é aprovado para fogachos, secura vaginal e prevenção da perda óssea, mas Faubion disse que também pode ajudar com sintomas de humor e sono. Em mulheres que estão na perimenopausa e ainda podem engravidar, os médicos podem prescrever anticoncepcionais hormonais para ajudar a regular os hormônios.
Para onde foi minha libido?
Homens e mulheres podem experimentar uma diminuição do desejo sexual na meia-idade por uma variedade de razões.
Por que isso pode acontecer com os homens?
Às vezes, os hormônios são os culpados. Preocupações com a baixa testosterona têm recebido muita atenção recentemente, e os níveis realmente caem com a idade. No entanto, “a maioria dos homens continuará a manter níveis normais ao longo da vida”, afirma o endocrinologista Shalender Bhasin, que trabalha no Brigham and Women’s Hospital, em Boston, e pesquisa a terapia com testosterona.
É difícil determinar exatamente quantos homens experimentam deficiência de testosterona. As estimativas variam de 2% a 50% dos homens em qualquer idade, de acordo com a American Urological Association (traduzida como Associação Americana Urológica).
Para homens que têm níveis clinicamente baixos de testosterona, também conhecidos como hipogonadismo, a terapia com testosterona pode ajudar a tratar os sintomas, que incluem diminuição da massa muscular, depressão e fadiga, além de baixa libido.
Não está claro se a terapia com testosterona é benéfica e segura para homens que não têm hipogonadismo, principalmente porque o tratamento não foi testado nesta população em um grande ensaio clínico.
No entanto, a libido vai além da testosterona. Segundo uma estimativa recente, cerca de um quarto dos homens entre 45 e 54 anos enfrentam dificuldades com a ereção – e essa porcentagem aumenta com a idade. A disfunção erétil pode fazer com que os homens se sintam constrangidos e menos dispostos a ter relações sexuais, explicou Alan Shindel, professor de urologia na Universidade da Califórnia, em São Francisco.
A disfunção erétil pode ocorrer por uma variedade de razões — questões de saúde comuns, como hipertensão, colesterol alto e diabetes — e pode ser tratada com medicamentos ou mudanças no estilo de vida, incluindo exercício e uma dieta saudável.
– Tudo que é bom para o seu coração é bom para o seu pênis, e também será bom para a sua libido – completa Shindel.
Por que isso pode acontecer com as mulheres?
As mudanças nos níveis hormonais na meia-idade também podem afetar a libido das mulheres, embora de forma mais indireta. Os poucos estudos sobre o tema não mostram uma correlação clara e consistente entre a queda dos níveis de estrogênio durante a menopausa e a baixa libido, e o tratamento com terapia hormonal de estrogênio não parece aumentar a libido, disse a professora assistente de medicina e ciência clínica e translacional na Universidade de Pittsburgh Holly Thomas.
Mulheres que experimentam frequentes ondas de calor e distúrbios do sono têm mais chances de relatar baixa libido, e a secura vaginal que surge para algumas mulheres durante a menopausa pode tornar o sexo doloroso e, como resultado, indesejável. Tratar esses sintomas pode melhorar o bem-estar geral da mulher e, por consequência, o interesse pelo sexo.
Fatores psicossociais provavelmente desempenham um papel maior, disse Thomas. Pesquisas mostram que a qualidade dos relacionamentos, estresse, fadiga e outros problemas de saúde, incluindo depressão, têm uma influência significativa na libido das mulheres pós-menopáusicas.
– Quando você tem uma capacidade mental sendo ocupada por estressores, faz sentido que você possa não ter tanta capacidade mental para pensar sobre intimidade – ela disse.
Questões psicossociais também podem afetar os homens, disse Shindel, embora eles possam “ter dificuldade em aceitar que há algum aspecto psicossocial nas preocupações sexuais.” Mas, acrescentou:
– Sempre quero destacar isso e normalizá-lo para os homens.
Se está preocupado com sua libido, converse com seu parceiro e considere consultar um terapeuta sexual. Você também pode pedir ao seu ginecologista ou urologista para verificar quaisquer preocupações de saúde física.
E, embora a libido tende a diminuir com a idade, Shindel aponta, “ela nunca desaparece. Você nunca é velho demais para sexo.”
É apenas na minha cabeça ou estou começando a esquecer coisas?
Sua memória provavelmente não é tão boa quanto era entre os 20 e 30 anos. Mas isso é apenas uma parte normal do desenvolvimento do cérebro.
O volume cerebral atinge o pico na casa dos 20 anos e depois diminui lentamente ao longo da vida adulta; essa perda começa a acelerar na casa dos 50 e 60 anos. Regiões envolvidas na atenção, memória e funções executivas são especialmente afetadas, o que, por sua vez, podem alterar alguns aspectos da cognição, como a rapidez do pensamento.
– As mudanças na memória que vemos na meia-idade normalmente não indicam algum tipo de demência – esclarece Lachman. – As pessoas podem ter algo que querem lembrar, mas isso leva um pouco mais de tempo apenas por causa da desaceleração geral do sistema nervoso central.
Embora todos experimentem essas mudanças cerebrais relacionadas à idade, a rapidez com que ocorrem e o quanto a cognição declina varia de pessoa para pessoa. Nossa saúde e comportamentos — particularmente exercício, nutrição, sono, conexões sociais e desafios mentais — contribuem para o envelhecimento cerebral saudável.
– Esta é a primeira janela de tempo em que começamos a ver essas separações entre as pessoas, e é por isso que é um período tão importante para entender – detalha Gagan Wig, professor associado de ciências comportamentais e cerebrais na Universidade do Texas, em Dallas.
Embora raro, o início precoce da demência ocorre e pode estar relacionado à genética.
O principal sinal de que algo pode estar errado é se sua memória estiver muito pior em comparação com seus pares, ou se ela declinar rapidamente, disse Wig. Se está preocupado com a perda de memória, ou se tem um histórico familiar de demência precoce, consulte seu médico.
Por outro lado, alguns processos cognitivos realmente melhoram com a idade — uma mudança que é “pouco destacada,” disse Wig.
– Mesmo que sua velocidade possa estar diminuindo, seu conhecimento verbal, conhecimento de mundo e acesso à informação semântica, na verdade, aumentam.
Conhecimento de mundo vem das informações e experiências que uma pessoa acumula ao longo de sua vida, acrescenta. Alguns cientistas se referem a isso como “inteligência cristalizada”; outros podem chamar de sabedoria.
Quais problemas de saúde devo começar a observar?
Não é coincidência que os exames para muitas doenças crônicas relacionadas à idade comecem agora: a meia-idade é quando nossos comportamentos, exposições tóxicas e o desgaste geral do corpo começam a se manifestar. (Por exemplo, décadas de pequenas exposições frequentes a um carcinógeno, como a radiação UV do sol, podem causar mutações genéticas que levam ao câncer.)
Nas mulheres, a menopausa também aumenta o risco de várias condições relacionadas à idade, principalmente doenças cardiovasculares. Os cientistas acreditam que isso ocorre porque o estrogênio e outros químicos produzidos pelos ovários pré-menopáusicos são protetores para muitos órgãos do corpo.
– Enquanto as mulheres têm uma vantagem biológica sobre os homens antes da menopausa, parte dessa diferença entre homens e mulheres em termos de risco cardiovascular e riscos metabólicos se fecha após a transição da menopausa – disse Karlamangla.
Alguns exames de saúde comuns, incluindo mamografias e colonoscopias, são realizados para detectar uma doença em seu estágio mais precoce possível, o que pode tornar o tratamento mais bem-sucedido. Outros, como exames de colesterol e testes de glicose no sangue, têm o objetivo de acompanhar como um aspecto da saúde muda ao longo do tempo, para que os médicos possam saber se e quando é necessário intervir.
Você deve verificar sua pressão arterial e colesterol regularmente, mesmo antes de entrar na meia-idade. Faça o teste de pré-diabetes aos 35 anos se estiver acima do peso ou obeso, e aos 45 anos, caso contrário. As mamografias são recomendadas a partir dos 40 anos, e você deve fazer sua primeira colonoscopia aos 45 anos. As análises de densidade óssea não são oficialmente recomendadas para mulheres antes dos 65 anos, mas se você tem um histórico familiar de osteoporose, deve conversar com seu médico sobre a possibilidade de ser examinada antes. O tratamento do câncer de próstata se tornou mais detalhado nos últimos anos, e, como resultado, também foram ajustadas recomendações para a triagem; peça orientação ao seu médico. E se você for um fumante atual ou ex-fumante pesado, faça uma triagem para câncer de pulmão a partir dos 50 anos.
Por que a vida parece tão difícil?
A geração sanduíche é real: você pode estar simultaneamente cuidando de filhos em crescimento e pais envelhecendo, sem mencionar o equilíbrio com a carreira que você vem construindo há décadas.
– As pessoas na meia-idade estão realmente esgotadas porque têm muito a fazer – reforça Lachman.
Essa é a má notícia. A boa é que você está mais bem equipado para lidar com todas essas responsabilidades do que quando era mais jovem, afirma David Almeida, professor de desenvolvimento humano e estudos familiares na Universidade Estadual da Pensilvânia.
Há mais de duas décadas, Almeida realiza pesquisas sobre os níveis diários de estresse em adultos de todas as idades. Em contraste com a infame curva de felicidade em forma de U, que sugere que as pessoas são mais infelizes na meia-idade, Almeida descobriu que, pelo menos quando se trata de lidar com o estresse, as coisas tendem a melhorar com a idade. Isso pode ser porque “é um momento da vida em que estamos mais propensos a estar no comando”.
– Não é realmente o momento de crise da vida que as pessoas pensam que é – acrescenta Almeida – Em termos de vida diária, é realmente bastante bom, em média.
Estudos sobre bem-estar emocional confirmam isso. A meia-idade não é o período mais feliz da vida (isso é na velhice), nem o mais complicado (isso é na juventude), mas é relativamente estável.
Assim, um dos trabalhos mais recentes de Almeida indicou que as coisas podem estar mudando. Ele descobriu que a meia-idade é mais estressante agora do que em décadas anteriores, possivelmente devido a pressões financeiras adicionais.
E quanto àquela curva em forma de U? Susan Charles, professora de ciência psicológica na Universidade da Califórnia, em Irvine, acredita que a satisfação com a vida atinge um nadir (o ponto mais baixo) na meia-idade porque é um período em que as pessoas começam a refletir sobre suas vidas.
– Na nossa juventude, pensamos que, você sabe, todo mundo pode crescer e se tornar presidente, e temos essas esperanças e sonhos. E então, a meia-idade é um momento em que você meio que reconcilia o que tem com o que esperava e sonhava – conclui Charles.
Mas, acrescentou, quando as pessoas alcançam a idade avançada, a maioria já está bem resolvido com tudo isso. Elas se sentem gratas pelo que têm e pensam: “Sim, estou bastante feliz com isso”.
Fonte: O Globo