OPINIÃO: O que o Norte Global tem a aprender com as favelas?

Neste ano, minha perspectiva mudou, e tenho me deparado com uma pergunta constante: o que o Norte Global tem a aprender com as favelas? Esse questionamento tem permeado minhas conversas e reflexões, tanto durante o SXSW (South by Southwest) quanto em outros contextos. A realidade é que existe um futuro imaginado pelo Norte Global e outro construído diariamente por nós, aqui, em meio a uma realidade brasileira complexa e multifacetada. Quantos “Brasis” existem dentro do Brasil?

Desde o ano passado, tenho reiterado a ideia de que buscamos fora as respostas para o futuro, quando, na verdade, elas já estão em nossas próprias casas. Já considerou que o futuro é uma construção? Uma narrativa inventada por alguém? E é aí que surge a questão: a concepção de futuro apresentada pelo Norte Global pode parecer ficção aos ouvidos daqueles que lidam com a realidade brasileira, que vai muito além dos centros urbanos mais desenvolvidos e da Faria Lima.

O futuro é sobre as ações que tomamos no presente, é sobre o “agora” coletivo, inclusivo e acessível. Portanto, ao pensar no Brasil, como a maior delegação presente no maior evento de inovação, criatividade e tecnologia do mundo, não podemos conceber o futuro sem considerar as favelas. Desconsiderar a inovação que surge desses territórios é se desconectar da realidade. Projetos como o DiversiGames, no Rio de Janeiro, que promove o letramento digital por meio de jogos e capacita jovens de áreas periféricas, e a presença de Bia Ferreira, com seu projeto MMP (Música de Mulher Preta), são exemplos inspiradores, mas ainda há muito a ser feito, muitas vozes a serem ouvidas.

Tenho trabalhado com diversos parceiros para descentralizar o conhecimento presente nesses eventos. Por anos, cobri festivais de inovação de diferentes perspectivas: como jornalista, criadora de conteúdo para diversas mídias e empreendedora. A cada ano que passa, percebo que nossa delegação cresce, mas parece distante da nossa realidade. Não existe desenho de futuro sem as favelas. Sem considerar a inovação que vem das quebradas e distintos territórios, das mais de 18 milhões de pessoas, que geram mais de 40 bi de dólares em renda por ano (dados IBGE e DataFavela) –ou a nossa concepção de futuro vira deslocamento da realidade.

Neste ano, tive a oportunidade de apresentar um painel, a convite da CasaSP, sobre o projeto Conecta Cria. Esse projeto visa descentralizar o acesso às discussões presentes nesses espaços, trazendo as favelas para o centro das soluções inovadoras do mundo. É um convite para criar pontes de conhecimento e se comprometer a ampliar o acesso e promover uma verdadeira “transferência” de inovação, inspirada pelo que é discutido fora, mas ancorada em nossa realidade local. A ideia é realizar o Conecta Cria em parceria com pessoas, articuladores, coletivos e iniciativas de inovação de diferentes favelas e capitais do país.

Enquanto muitos futurólogos lutam para prever o futuro, nas favelas e periferias brasileiras, já estamos vivendo em 2050. Acredito que, juntos, podemos mostrar ao mundo que as soluções que procuramos já estão em nossa própria casa.

A verdadeira inovação nasce da conexão entre negócios, narrativas e comunidades. Minha experiência de quase 20 anos como executiva de marca e agência na indústria criativa me ensinou que a inovação surge quando diferentes partes se unem para resolver desafios contemporâneos. Hoje, como fundadora da Lemme.Cria, uma consultoria estratégica e criativa, busco soluções de comunicação para os desafios do mundo contemporâneo. A Lemme.Cria opera em São Paulo e no Rio de Janeiro e está expandindo suas operações em parceria com coletivos da Amazônia, Salvador e Fortaleza.

A Lemme.Cria foi selecionada pelo Creative SP, uma iniciativa que conecta empreendedores da indústria criativa de São Paulo com o mundo, o que demonstra a necessidade de expandir essas parcerias para impulsionar mudanças significativas.

O conhecimento sem legado não gera transformação. Convido a todos a se unirem para construir o futuro que desejamos ver.

*Babi Bono é criativista, CCO e fundadora da Lemme.Cria. O hub atua nos pilares de Clima, Territórios e Inovação para ajudar marcas, organizações e influenciadores a unirem a criatividade com a capacidade de transformar realidades.

 

 

 

The post OPINIÃO: O que o Norte Global tem a aprender com as favelas? appeared first on Billboard Brasil.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.