Renegociação de dívidas gera tensão entre estados e governo federal

A sanção, com vetos, do projeto de lei que trata da renegociação das dívidas bilionárias dos estados com a União tem causado um atrito entre governadores e integrantes do governo Lula (PT).

O Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) deverá ter um impacto fiscal de R$ 20 bilhões por ano, segundo cálculos do Tesouro Nacional. Esse prejuízo é financeiro, sem impacto no resultado primário (o saldo das receitas e despesas do governo).

O que aconteceu:

  • O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou o projeto de repactuação das dívidas dos estados na última terça (14/1) e vetou alguns trechos do texto aprovado pelo Congresso Nacional.
  • Os dispositivos vetados, de acordo com o governo federal, poderiam gerar impacto primário nas contas públicas – ou seja, poderiam reduzir as receitas ou aumentar as despesas do governo federal de forma direta.
  • As dívidas dos estados com a União chegam a R$ 797 bilhões, segundo dados do Tesouro. Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul são os maiores devedores.
  • Governadores criticam as alterações feitas na proposta, que foi articulada pelos entes federativos junto ao Ministério da Fazenda e ao senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Congresso Nacional e autor do texto.
  • Agora, o Congresso Nacional vai analisar os vetos presidenciais e pode decidir derrubá-los, incluindo na lei as partes retiradas por Lula.

Ainda na terça-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o texto sancionado “foi além do que foi pedido pelos governadores”. O titular da Fazenda disse que o presidente Lula “deixou de lado todas as divergências” com os governadores, visto que os maiores devedores são de partidos de oposição.

“É preciso notar que o esforço que o governo federal fez foi bem grande para corrigir os problemas e se eu fosse um governador mesmo da oposição eu daria um telefonema agradecendo”, destacou Haddad.

Críticas dos governadores

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), acusou o Palácio do Planalto de “mutilar“, com os vetos, o programa de renegociação dos débitos. “O federalismo brasileiro foi golpeado pelas costas”, considerou ele.

Na visão do governador, o veto ao uso do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) – aprovado na reforma tributária – para o abatimento da dívida representou uma quebra de acordo.

“É sabido que, nos corredores do Palácio do Planalto, pessoas de baixo espírito público eram contra a sanção do Propag, alegando que esse projeto beneficiaria apenas os estados governados por aqueles que não apoiaram a eleição do atual Presidente da República”, acusou Castro.

Outro governador a se manifestar foi Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do Sul, que disse ter recebido a notícia “com extrema preocupação e indignação”. Segundo ele, os vetos geram uma perda de cerca de R$ 5 bilhões que ajudariam na reconstrução após as enchentes de 2024.

“Com os vetos, para aderir ao Propag o Rio Grande do Sul fica obrigado a repassar valores para um fundo, criado para compensar os Estados em melhor situação fiscal. Na prática, voltaríamos a repassar valores à União, contrariando a suspensão da dívida pelo período de três anos, cujos valores estão sendo destinados ao Fundo do Plano Rio Grande (Funrigs) para reconstrução”, criticou Leite.

De forma conjunta, os governadores estudam acionar suas bancadas estaduais no Congresso Nacional na retomada dos trabalhos legislativos, em fevereiro, para reverter os vetos presidenciais.

Entenda

O Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) prevê que os estados podem renegociar as dívidas com juros reduzidos, além de escolher parcelar os débitos em até 30 anos, mediante algumas contrapartidas, como exigências de investimento em educação, formação profissional, saneamento, habitação, enfrentamento das mudanças climáticas, transporte e segurança pública.

O texto do projeto aprovado pelos parlamentares mantém o formato atual dos juros (IPCA + 4%), mas prevê mecanismos para reduzir e até zerar esses 4% adicionais. Também cria um fundo de equalização federativa para compensar os estados menos endividados e permite a federalização de ativos para abater o valor da dívida com a União.

A possibilidade de Lula vetar trechos do projeto tinha sido antecipada por Haddad. Segundo o ministro, o presidente foi aconselhado pelos colegas da Esplanada para vetar as partes que gerariam impacto no resultado primário. Um dos vetos mais criticados pelos governadores foi ao trecho que permitia o uso de verbas do novo fundo  para abatimento dos juros.

O estado pode ficar no Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e aderir ao Propag, não havendo uma necessidade obrigatória de migração. Os estados terão até 31 de dezembro de 2025 para solicitar adesão ao Propag.

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