Após transplante cardíaco, advogado leva incentivo a quem está na fila

São Paulo — No dia em que não conseguiu subir as escadas de casa, em 2023, o advogado Jovino Magalhães, de 58 anos, percebeu que seu problema cardíaco era mais sério do que imaginava.

Com dois stents no coração — tubos de metal usados para manter as artérias abertas —, Jovino (foto de capa, de camiseta branca) não conseguiu se levantar da cama ao acordar no dia seguinte ao episódio das escadas, quando o cansaço incomum o paralisou.

Levado às pressas pela família ao Hospital do Coração, na região central de São Paulo, o advogado recebeu o diagnóstico. “Achei que ia tomar um remédio debaixo da língua e ir embora para casa. Mas a médica disse: ‘O senhor está morrendo. O senhor é cardíaco. Vai internar e vai direto para UTI’”, disse Jovino ao Metrópoles.

Jovino, então, foi informado sobre a necessidade de fazer um transplante de coração. No primeiro momento, ele decidiu não fazer o procedimento “de jeito nenhum”, por não querer que os filhos tivessem que cuidar dele.

“Eu falei ‘não’, já fiz o que tinha que fazer nesse mundo, eu acho que minha missão aqui já se deu. Eu estava plenamente conformado a morrer em casa”, afirmou Jovino. Somente depois de uma conversa com uma psicóloga do hospital, ele repensou a decisão.

Foram seis meses e meio na fila até realizar o transplante, em setembro daquele ano. “Foi na mesma época que o Faustão transplantou o dele”, lembrou Jovino. Segundo ele, houve um aumento na oferta de coração por causa do apresentador. “Tinha todos aqueles artistas fazendo campanha”.

Visitas pós-transplante

Após o sucesso do transplante, Jovino continuou frequentando o hospital, agora por um motivo diferente. “A gente sempre recebia visitas de voluntários da igreja, que vinham dar uma palavra de conforto. E eu pensei: ‘poxa vida, quero retribuir toda essa atenção’”, disse.

A psicóloga que o acompanhou durante a internação sugeriu que ele fizesse visitas às pessoas que estão na fila de transplantes, que geralmente chegam desorientadas, segundo ele. “Eu não posso dar conselhos, só posso contar a minha história. É uma forma de retribuir tudo aquilo que recebi”, afirmou Jovino.

Amizade no hospital

Uma das pessoas com quem Jovino fez amizade ao longo das visitas foi Celso Luiz, de 57 anos. O desenvolvedor de sistemas aguarda há seis meses por um novo coração. Ele está internado do Hospital do Coração com um quadro de miocardite.

Em setembro do ano passado, Celso foi listado para o transplante, e atualmente se encontra no primeiro estágio de prioridade na fila. “Eu me afeiçoei muito ao Celso, porque ele chegou e falou para mim: ‘quando eu transplantar, quero fazer junto com você o que está fazendo’’, afirmou Jovino.

A filha de Celso, Caroline Ciarini, contou ao Metrópoles que o pai está na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com dois drenos, um em cada perna. “A gente já está na nossa última alternativa para receber esse coração e a fila não anda”, disse.

“Durante a internação, teve várias intercorrências. Passamos aniversário, Natal e Ano-Novo no hospital. Depois da virada do ano, ele teve uma piora muito grande e tiveram que colocá-lo no balão”, afirmou Caroline.

Ela também mencionou o “efeito Faustão”, que fez com que as doações aumentassem. No entanto, esse fenômeno não durou muito, segundo Caroline. “Como saiu muito na mídia, isso movimentou informação. Depois disso, a fila estagnou, porque não se fala mais”, disse.

A situação do pai e a demora da fila motivou Caroline e a família a criarem uma campanha de divulgação sobre transplantes de coração nas redes sociais. O perfil “Um coração para o vovô” compartilha registros de Celso junto aos três netos e publica informações sobre o tema.

Celso Luiz ao lado dos três netos

“Nesse perfil eu tenho tentado não só trazer o que minha família está passando, porque não é uma oferta de coração que a gente vai receber. Como você informa as pessoas que a gente precisa falar de doação de órgãos, que esse assunto não precisa ser um tabu? Pode ser a esperança de muita gente. Então é mais para esse lado que a gente está indo”, disse Caroline.

Fila de transplante de coração

Dados do Ministério da Saúde apontam que, até 31 de janeiro, 444 pessoas esperavam por transplante de coração no Brasil. O estado de São Paulo é o que tem mais pacientes na fila, com 254.

Homens entre 50 e 64 anos, faixa etária de Jovino e Celso, compõem o maior grupo de espera — são 132 no momento, de acordo com o órgão.

Como mostrou o Metrópoles, vários critérios técnicos são levados em consideração para que uma pessoa receba um órgão. Fatores como o tipo sanguíneo, a compatibilidade genética e até o tamanho da caixa torácica do paciente definem quem recebe cada coração doado, explica Daniela Salomão, coordenadora geral do Sistema Nacional de Transplantes.

Além disso, a gravidade da doença também define quem tem prioridade na lista de espera. A lista é única para todo o país, mas cada estado gerencia as doações para seus moradores. A definição é feita por um sistema informatizado, que contém os dados de todos os pacientes que esperam pelo órgão.

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