Demi Moore: indicação ao Oscar premia uma carreira definida pelo desafio

Caroline Ruddell, Brunel University of London

Demi Moore ganhou o Globo de Ouro de melhor atriz em janeiro por sua atuação no filme de ficção científica de terror The Substance (“A Substância” no Brasil). Em seu discurso de aceitação, ela contou que, há 30 anos, um produtor lhe disse que ela era uma “atriz pipoca”. A insinuação era de que ela não era o tipo de atriz “séria” que poderia ganhar prêmios.

Agora que também recebeu uma indicação ao Oscar pelo papel, parece que seu trabalho está finalmente sendo levado a sério. Durante as décadas de 1980 e 1990, Moore foi uma grande estrela, conhecida por aparecer em filmes de grande orçamento e de grande popularidade – daí o rótulo de “pipoca”. Mas, se voltarmos aos filmes pelos quais ela é mais conhecida, surge uma tendência interessante.

Como pesquisadora de gênero no cinema e na televisão, há muito tempo me interesso pelo trabalho de Moore. Isso porque, embora talvez seja mais explícito em The Substance, a maior parte de sua obra questiona a feminilidade e o poder.

Em The Substance, Moore interpreta com ferocidade a celebridade em declínio Elisabeth Sparkle. Mas os elogios ao seu desempenho não significam que isso seja algo novo – essa ferocidade sempre esteve presente em seus papéis na tela grande.

Como a femme fatale Meredith em Disclosure (“Assédio Sexual”) (1994), por exemplo, ela dominou todas as cenas com um poder agressivo que é raro de se ver. Ao escrever sobre o trabalho de Moore em 2004, a pesquisadora de cinema Linda Ruth Williams descreveu esse poder como “sensualidade perigosa” (“dangerous sexiness” no original em inglês).

Meredith é uma mulher do passado do executivo sênior Tom (Michael Douglas). Quando ela retorna à vida dele, chega perto de descarrilá-la completamente por meio de uma mistura de comportamento manipulador e astuto, um impressionante senso de negócios e agressividade pura e simples.

Em um determinado momento, Tom chega a dizer que não seria, de forma alguma, um adversário físico para ela, devido ao tempo que ela passa se exercitando em um aparelho StairMaster. Embora não seja vitoriosa no final, Meredith é de longe a personagem mais poderosa e convincente do filme.

Mesmo nos papéis mais passivos de Moore, como a Molly de Ghost (1990), ela rouba a cena. Grande parte disso se deve à sua incrível capacidade de fazer seus olhos oscilarem entre a fúria sombria e intensa e a dor avassaladora.

E não posso ignorar G.I. Jane (1997). Nesse filme, Moore raspou os cabelos em frente às câmeras e gritou a inesquecível frase “suck my dick” (“chupe meu pau”) para o chefe Urgayle (Viggo Mortensen), o que acabou com as expectativas sociais em relação às mulheres nas forças armadas, ou pelo menos as perturbou. Grande parte da força do desempenho de Moore nesse filme está na forma como ela se transformou fisicamente para o papel. Williams descreveu o papel como um trabalho de “transformação corporal” devido ao intenso treinamento físico que Moore realizou para o papel.

Em A Few Good Men (“Uma Questão de Honra”) (1992), sua personagem, a tenente-comandante Joanne Galloway, rivaliza com todas as outras com seu intelecto feroz e conhecimento da lei. Enquanto o tenente Daniel Kaffee, de Tom Cruise, impressiona no tribunal, é o conhecimento de Galloway sobre o caso e sua recusa em se curvar ao poder patriarcal (em grande parte personificado pelo coronel Jessep, de Jack Nicholson) que os ajuda a vencer.

Envelhecendo em Hollywood

Em setembro de 2024, fui entrevistada para um artigo sobre mulheres mais velhas no cinema e na televisão pela jornalista Christobel Hastings.

Nele, Hastings afirmou que “Hollywood tem um longo histórico de ignorar as mulheres atrizes”. Citando vários estudos, ela observou que as carreiras das mulheres atingem o pico aos 30 anos de idade no setor, enquanto as dos homens atingem o pico 15 anos ou mais depois.

Mas ela também argumentou que houve um aumento na diversidade de papéis disponíveis para atrizes mais velhas, tanto no cinema quanto na televisão. Esse movimento em prol das atrizes é defendido há mais de 20 anos pelo Geena Davis Institute, uma organização de pesquisa que se concentra na representação equitativa na mídia.

Se eu tivesse que resumir a carreira de Moore em uma palavra, ela seria desafio. E agora, com The Substance, ela desafiou as expectativas mais uma vez, juntando-se às fileiras (felizmente crescentes) de atrizes que estão encontrando papéis de peso à medida que chegam à meia-idade ou à velhice.

Caroline Ruddell, Reader in Film and Television, Brunel University of London

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