DPU pede R$ 10 mi à União e Latam por morte de imigrante em aeroporto

A Defensoria Pública da União (DPU) entrou, nessa segunda-feira (19/5), com uma ação civil pública contra a União e a companhia aérea Latam pela morte de Evans Ossêi Ússu, imigrante ganês de 39 anos que morreu em agosto do ano passado após passar mal na área restrita do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos.

A DPU pede indenizações por danos morais individuais e coletivos, além de danos materiais, no valor de R$ 10 milhões. A ação também pede a adoção de um plano de acolhimento para os migrantes que aguardam autorização de entrada no país na área restrita do aeroporto de Guarulhos. No ano passado, a DPU classificou que havia “reiteradas situações de violação de direitos humanos” na retenção de centenas de imigrantes no aeroporto.

De acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), em 11 de agosto de 2024, o imigrante passou mal na área restrita, recebeu atendimento no Posto Médico do Aeroporto de Guarulhos e foi encaminhado ao Hospital Geral de Guarulhos. Dois dias depois, em 13 de agosto, ele faleceu.

Evans morreu de infecção generalizada, após ter sido diagnosticado com um quadro de infecção urinária. Ele foi enterrado no Cemitério Necrópole do Campo Santo, que é municipal.

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Evans Ossêi Ússu, de 39 anos, proveniente de Gana, passou mal na área restrita e morreu

Cartaz com orientações da supervisão sobre o tratamento que deve ser destinado aos imigrantes retidos
São 466 imigrantes retidos em área restrita do Aeroporto Internacional de Guarulhos
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Imigrantes em aeroporto

Reprodução/TV Globo

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Evans Ossêi Ússu, de 39 anos, proveniente de Gana, passou mal na área restrita e morreu

Arquivo Pessoal

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Cartaz com orientações da supervisão sobre o tratamento que deve ser destinado aos imigrantes retidos

Defensoria Pública da União (DPU)

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São 466 imigrantes retidos em área restrita do Aeroporto Internacional de Guarulhos

Reprodução/TV Globo

De acordo com o defensor regional de direitos humanos de São Paulo, Murillo Martins, a ação busca reparar a família de Evans e a coletividade dos migrantes inadmitidos, com pagamento de indenização coletiva para evitar que situações como a que aconteceu se repitam.

“Apontamos na petição que, a partir da investigação conduzida pela DPU, se identificou que os migrantes foram e são submetidos a situação degradante e que, no caso de Evans, resultou no extremo, que foi sua morte”, explica Murillo.

“A conclusão pela responsabilidade da União é tanto pela ausência de assistência aos migrantes retidos — e que estão nessa situação por conta de conduta da própria União, enquanto se aguarda o processamento da solicitação de refúgio — como pela demora no processamento da solicitação de refúgio, que fez com que ele ficasse muito tempo na área restrita”, diz ainda o defensor público federal.

Já contra a companhia aérea, a DPU denuncia a falta de assistência, tanto no momento em que Evans estava em área restrita, como depois do falecimento dele. Para a defensoria, a companhia sonegou informações ao hospital, o que resultou no enterro do imigrante de Gana sem que a família soubesse.

O Metrópoles procurou o MJSP, que informou que ainda não foi notificado. Em nota anterior, do ano passado, a pasta informou que não cabe à Secretaria Nacional de Justiça (Senajus) o acompanhamento da assistência específica ao migrante de Gana. Disse, ainda, que a Senajus não foi comunicada sobre a situação de Evans. “A comunicação aconteceu no dia 16 de agosto, após o falecimento”, informou.

“Imediatamente, o Ministério da Justiça e Segurança Pública enviou ofício ao Ministério das Relações Exteriores solicitando que providências fossem tomadas para a comunicação da situação à Embaixada de Gana —o que, de fato, foi feito pelo Itamaraty”, diz a nota.

A reportagem também procurou a Latam, que também afirmou que não foi notificada e que não comentará o assunto.

Racismo estrutural

A DPU também destacou na ação que o caso revela traços do racismo estrutural presente nas políticas migratórias e nos serviços públicos. Para o órgão, a negligência sofrida por Evans está diretamente ligada à sua cor e origem.

“Será que suas queixas de saúde teriam sido ignoradas por tanto tempo, tivesse ele outra aparência?”, questiona um trecho da petição.

Em nota, a Defensoria afirmou considerar essencial reconhecer a dimensão racial do caso para garantir justiça e evitar que episódios semelhantes se repitam.

Investigações

A Polícia Civil investigou a morte de Evans Ossêi Ússu pela 3ª Delegacia de Atendimento ao Turista (Deatur) do Departamento de Operações Policiais Estratégicas (Dope).

O inquérito policial foi relatado à Justiça em outubro do ano passado. Na mesma ocasião, o Ministério Público requisitou diligências complementares, que foram cumpridas e o procedimento encerrado em abril deste ano.

Em 13 de setembro de 2024, a Polícia Federal (PF) acatou o pedido do Ministério da Justiça e Segurança Pública e abriu um processo de investigação sobre o caso. Quando instaurou o processo, a PF informou que iria trabalhar “no sentido de esclarecer os fatos que antecederam e posteriormente levaram a óbito o imigrante, nacional de Gana”.

STJ autoriza deportação

Em dezembro do ano passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou a deportação de imigrantes ilegais retidos no Aeroporto Internacional de São Paulo. A Defensoria Pública da União recorreu.

Em nota, a DPU alegou que a decisão representa um retrocesso no reconhecimento e na proteção dos direitos fundamentais dessas pessoas,  ao restringir o direito dos migrantes de solicitarem refúgio.

O recurso está concluso para decisão desde 3 de fevereiro deste ano.

A instituição informa que continua acompanhando a situação por meio de visitas e, sobretudo, dos encaminhamentos feitos pelo posto humanizado da assistência social de Guarulhos, que realiza atendimento na área restrita.

“A DPU reafirma seu compromisso com a defesa dos direitos das pessoas migrantes, ressaltando o respeito às garantias legais e aos princípios humanitários previstos na legislação nacional e em tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, tais como o direito de solicitar refúgio em território brasileiro e o princípio do non-refoulement (não devolução)”, afirma.

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