Ato de Natal (por Hermilo Borba Filho)

Quando a trupe chegou, o tomara-que-não-chova ainda não estava armado, mas foi obra de um instante e o cirquinho logo rodeado de tudo quanto era menino da zona se viu, anunciando a Pantomina do Nascimento, que já se estava no dia 24. Véspera do 25, para a noite a pantomima para o dia a Nova-Maior, tomem cantos e danças e passas e doces até na casa dos pobres, perus de papos recheados em casa dos magníficos; e no cirquinho, às seis, Bitom o Palhaço, na casa do 60, chegou, postou-se diante do espelho quadrado, começou a pintar a cara, às sete terminou com 50, às oito, tomando uma cachaça, estava com 40 – era aquilo todos os anos, na noite do 24 para a autora do 25 – entrou no picadeiro, às nove, com 30; às onze, de novo diante do espelho, era Bitom o Palhacinho, com 0; tirou a tinta, foi caminhando para a infância, os artistas abriram alas, ele foi andando e ficando mais menino, atravessou o picadeiro e desapareceu atrás das cortinas, a Trapezista nova perguntando ao Mestre de Cerimônias: Para onde ele vai? Ao que o Mestre de Cerimônias, fazendo uma cara de espanto, respondeu-lhe meio áspero, meio gozador: Oi, não sabe? Ele vai nascer.

 

Hermilo Borba Filho, romancista, dramaturgo, poeta, pernambucano

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