Primeira reitora da Unesp quer cota para docentes na universidade

São Paulo — Primeira mulher eleita reitora na história da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), a professora Maysa Furlan defende que a conquista é fruto do trabalho que desenvolveu ao longo da carreira, mas também de uma mudança dentro da academia, que tem debatido a importância da diversidade no ensino.

“A universidade, que ainda tem maioria masculina, em algumas questões já tem um olhar diferente, que olha para competência”, disse Maysa em entrevista exclusiva ao Metrópoles.

Ex-vice-reitora, Maysa foi eleita com 67% dos votos válidos para o novo cargo e assumiu o posto em janeiro, parabenizada por colegas que ressaltaram o marco histórico da presença de uma mulher à frente da reitoria. Ela, no entanto, ressalta que ainda há muito para avançar nas questões de diversidade e inclusão.

“Fiz um levantamento para fazer o discurso [da posse]: nós temos em torno de 27% [de professoras titulares]. A mulher é maioria no estágio inicial da carreira, mas no estágio final ainda é minoria.”

Na gestão até 2028, a nova reitora diz querer ampliar ainda mais o debate sobre o tema, com a criação de uma pró-reitoria dedicada às questões de políticas afirmativas. Ao Metrópoles, Maysa contou, ainda, que quer iniciar um debate sobre cotas nos concursos para servidores.

“Nós temos que avançar em todas as políticas, não só para estudantes, mas nas contratações de técnicos e docentes. Temos alunos pretos que têm que ter professores pretos. A universidade está se transformando e essa transformação daqui pra frente vai se agigantar”, prometeu.

A reitora falou também sobre a criação de cotas para estudantes trans, que podem ser aprovadas ainda para o vestibular deste ano.

Como é ser a primeira reitora na história da Unesp?

No desenrolar da minha carreira, eu fui me preparando, mesmo inconscientemente, para esse momento. Estou muito feliz por ter tido a oportunidade de me engajar nessas questões todas que eu penso que me prepararam.

Quando uma mulher assume uma posição de liderança, ela passa a ser um espelho para as outras mulheres. Para chegar à reitora, você tem que ter uma carreira que chega lá no alto, tem que ser professor titular e ter uma expressão acadêmica. Então, quando uma mulher atinge uma posição de liderança, ela exprime aquele anseio de todas as mulheres.

Por que acha que demorou tanto para que houvesse uma mulher reitora? 

A universidade é um reflexo da sociedade, ela não está excluída. Existe uma luta para ter uma sociedade mais equânime e mais justa. E esses movimentos acontecem na universidade também. Nós fortalecemos muito as ações afirmativas na universidade nos últimos quatro anos.

É um letramento. Hoje, a Unesp tem 50% de um público que vem de escola pública. São pretos, pardos ou indígenas, e a universidade tem que estar preparada para recebê-los. Nós temos que avançar em todas as políticas, não só para estudantes, mas nas contratações de técnicos nas contratações de docentes. Temos que ampliar [a diversidade]. Temos alunos pretos que têm que ter professores pretos. A universidade está se transformando e essa transformação daqui pra frente vai se agigantar.

Como pretende atuar para que a Unesp seja mais diversa?

Eu gostaria muito de criar nos 100 dias de gestão, e a discussão está bem avançada, uma pró-reitoria que trata de ações afirmativas de pertencimento pra universidade, de inclusão e de equidade. Nós sairemos de uma coordenadoria e passaremos para uma pró-reitoria. O que isso muda? Nós levamos voz para os conselhos. Vai ter um pró-reitor discutindo isso no conselho de ensino, pesquisa e extensão, que é o CEP, e ele tem presença no conselho universitário. É uma mudança fundamental.

Vocês avaliam criar uma política de cotas para servidores?

Passamos um período de quase 10 anos sem contratar não só docentes, como também corpo técnico-administrativo.

Estávamos com um déficit de funcionários, e, em 2021, sob a política de que os órgãos públicos não podiam contratar por causa da pandemia. Em 2022, iniciamos o processo de contratação. As necessidades eram tantas, que não tínhamos condições de implementar cotas. Não tínhamos uma comunidade preparada para isso. Depois, fizemos um letramento sobre as questões de políticas de cotas, sobre a importância de estendê-la também para o quadro acadêmico.

Hoje, estamos em condição para avançarmos. A universidade é colegiada: se você não a prepara, você não avança.

O vestibular de 2026 vai ter cotas trans?

Bom, primeiro eu gostaria de colocar que a Unesp foi pioneira no sistema de cotas. Isso pra nós nos traz uma consolidação que é única no estado. A [nova] pró-reitoria vai estar a cargo de fazer esta discussão. Temos que finalizar o processo para vestibular em junho. Então, depende dos colegiados.

Mesmo que a gente não faça para o vestibular de 2026 e faça para 2027, isto, para nós, é curto prazo. O objetivo é preparar a universidade para que a gente possa realmente ter uma discussão franca e justa com a comunidade.

Mas a expectativa da senhora é positiva?

É positiva. Eu acho que toda a questão de maturidade aconteceu. Estou otimista que isso caminhe.

Vamos botar a cota para pessoas trans para ser discutida e as outras também. Mas tem que ser um processo democrático e republicano. E isso leva um tempo. Para nós, esse tempo, se for para o vestibular de 2027, já é curto prazo.

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