Chovendo no molhado (por Antônio Carlos de Medeiros)

A valsa eleitoreira continua. É miopia política colocar a antecipação da sucessão presidencial como pauta relevante para o país. É preciso antes navegar por 2025. Sair da encruzilhada do varejo político. O foco precisa ser a grave ausência de uma Agenda para o Brasil.

Quem pode ou vai ser presidente em 2027 não é relevante agora. É varejo. É hora de tratar da agonia da inflação de alimentos e serviços; da desancoragem das expectativas políticas e econômicas; e dessa ausência de Agenda.

A população vive hoje com perspectiva de encruzilhadas, rodando em círculo e retornando sempre ao início. Cada dia um recomeço.

Enquanto isto, uma crise de Autoridade mostra a cara e pode escalar. A vitória eleitoral de Lula em 2022 não se configurou como vitória política cabal. Ali estava o germe e fantasma de crise. Que não foi contornada pelo caminho da costura de uma Frente Ampla. Não temos Frente Ampla governando o país.

O Brasil precisa sair da encruzilhada. É preciso uma inflexão política. Não basta um ajuste fiscal. A crise não é só de governo. É de poder. Para sair dela, há que se construir uma virtuosa combinação de entendimento político com sucesso econômico. O que requer uma reforma ministerial que contribua para a produção de consenso e formatação de uma Agenda Mínima.

Nesta direção, é recomendável o co-protagonismo dos novos presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre. O presidente Lula parece já estar trilhando este caminho. A conferir.

E também o co-protagonismo dos governadores. O federalismo é um pilar básico do sistema político brasileiro. Os governadores precisam participar da produção do consenso e articulação da Agenda Mínima. E do ajuste fiscal. Os estados e municípios são partes relevantes dos problemas fiscais do país. Muitos têm crises fiscais a galope.

O foco é uma Agenda política e econômica enxuta. E uma nova configuração ministerial, mirando representatividade, execução da Agenda e contenção da escalada da crise fiscal. Já enxergamos uma inflação inercial à nossa porta.

Carlos Pereira chama a atenção para o reposicionamento das forças políticas depois das eleições de 2024. E para a grande heterogeneidade do ministério do governo Lula, com baixa representatividade da mediana política do Congresso.

Pereira mostra que existem 18 partidos no ministério de 39 ministros. Mas que o PT tem predominância desproporcional. Tem 68 (13,26%) cadeiras na Câmara. Mas tem 17 (43,59%) dos 39 ministérios.

Ou seja, o ministério não representa a correlação de forças. Há, portanto, dificuldade de ação coordenada do governo e alto custo de governabilidade, diz Pereira. Predomina o toma lá dá cá e a guerra de emendas.

Neste contexto, vemos frágil compromisso político com o governo. E muito menos com alianças para 2026.

Tudo somado, a resultante é a fragilidade do Centro de Poder e a incerteza sobre o rumo do país.

 

*Pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.