Mãe de babá escravizada no Morumbi trabalhou para mesma patroa

São Paulo — A mãe da babá boliviana resgatada nessa quinta (20/2), vítima de cárcere privado e trabalho análogo à escravidão em um apartamento de médicos no Morumbi, trabalhou como cozinheira para a mesma patroa na Bolívia. As três mulheres são naturais do país sulamericano. Kathia Nineth Porcel Rosales (foto em destaque), a patroa, é médica em São Paulo.

A informação consta no boletim de ocorrência (B.O.) que registrou o caso, e foi obtido pelo Metrópoles.

A babá, de 19 anos, foi resgatada após passar seis meses em cárcere privado sendo vítima de trabalho escravo. Ela foi contratada para trabalhar para um casal de médicos: Kathia e Eduardo dos Reis, ambos com registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) ativo em São Paulo. Os dois prestaram depoimento no 89º Distrito Policial (Portal do Morumbi) e foram liberados.


O que a vítima disse à polícia

  • Em depoimento, a babá afirmou que veio para o Brasil em agosto do ano passado com Kathia para trabalhar cuidando dos filhos da médica. Ela disse que conheceu a patroa através da mãe.
  • A vítima foi paga com o primeiro salário e depois não recebeu mais nenhum pagamento.
  • Ela relatou ser proibida de se alimentar da comida da casa. A patroa teria dito que a jovem devia providenciar a própria alimentação.
  • A babá pedia comida para a diarista que trabalhava no apartamento duas vezes por semana, e para outra babá que conheceu no condomínio.
  • Em um episódio recente, a patroa encontrou um pacote de bolachas no quarto da babá, e questionou se a jovem havia roubado dinheiro do casal para comprar o alimento. Ela imediatamente negou.
  • A vítima disse ainda que, apesar de ter celular, era proibida de usar o aparelho. Por isso, ela estava impedida de entrar em contato com a família. A jovem teria aproveitado um momento escondida para avisar ao pai das condições às quais foi submetida.
  • Ela também relatou que, mesmo tendo sido contratada como babá, realizava todas as atividades da casa, trabalhando todos os dias das 6h30 à 1h30 — totalizando 19 horas por dia.
  • Ainda no depoimento, a vítima disse ter sofrido uma lesão no punho por carregar peso durante o trabalho. A mãe do patrão também teria jogado roupas no rosto da babá enquanto ela passava as peças.

Entenda o caso

O Sindicato das Empregadas e Trabalhadoras Domésticas da Grande São Paulo (Sindoméstica) recebeu uma denúncia do grupo Conexão Babá de que a jovem boliviana estaria em cárcere privado, sendo vítima de trabalho escravo.

De acordo com Janaína Souza, presidente do Sindoméstica, a vítima recebeu somente o primeiro mês de salário, no valor de R$ 2 mil. Conforme relato da jovem ao sindicato, a empregadora teria dito que guardava o salário dos outros meses para, mais tarde, entregar a ela.

Além disso, a vítima não tinha contrato de trabalho e não podia contatar a própria família ou as outras babás do condomínio, chamado Grand Panamby. Ela também não podia sair da propriedade, tendo autorização para ir às áreas comuns apenas quando estivesse acompanhada da criança.

“Quando [as babás] souberam da situação dela, começaram a auxiliar com alimentação, porque no imóvel ela não podia nem se alimentar e nem beber água”, disse Janaina.

No momento em que foi liberta, a vítima apresentava bastante fome. A presidente do sindicato afirmou que a jovem sofria abusos psicológicos e fazia “absolutamente tudo” dentro da casa.

Janaina disse ainda que, após o resgate, os envolvidos foram levados para a delegacia, onde foi registrado um boletim de ocorrência não criminal. O casal foi ouvido e liberado em seguida.

O Metrópoles questionou a Secretaria da Segurança Pública (SSP) a razão para a liberação dos suspeitos. Em resposta, a pasta afirmou que a Polícia Civil “realiza diligências visando a oitiva do casal, bem como demais testemunhas, além de buscas por subsídios que auxiliem no devido esclarecimento dos fatos”.

Após o resgate, a jovem foi levada para um local seguro. O Sindoméstica afirmou que vai dar andamento à situação da imigrante, que foi resgatada com “muito medo”, informou Janaina.

 

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