Ação na Suprema Corte pode fazer preço dos alimentos subir ainda mais, alertam lideranças do agronegócio; entenda o caso

 

Uma ação movida pelo PSOL no Supremo Tribunal Federal (STF) tem potencial para aumentar ainda mais o preço dos alimentos, segundo alertam lideranças do agronegócio. O partido de esquerda pediu, ainda em 2016, para que os ministros da Corte considerem inconstitucionais os benefícios fiscais para compra de defensivos agrícolas. Se isso ocorrer, os custos de produção no campo devem aumentar, impactando diretamente produtos da cesta básica.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o PSOL alegou que a isenção de impostos, em vigor desde 1997, viola princípios constitucionais, como o direito à saúde, ao meio ambiente equilibrado e à dignidade da pessoa humana.

Eles questionam cláusulas do chamado “Convênio 100”, que foi estabelecido para reduzir a base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas saídas de insumos agropecuários comercializados entre estados e Distrito Federal. Atualmente essa redução é de 60% para o caso de defensivos, sementes e mudas, e de 30% para fertilizantes.

O ministro Edson Fachin é relator da ação, que começou a ser julgada em plenário virtual com votos favoráveis de Fachin e Cármen Lúcia pela inconstitucionalidade. Um pedido de destaque do ministro André Mendonça, porém, levou o julgamento para plenário físico, o que na prática o reinicia, desconsiderando todos os votos virtuais.

Estudo estimou impacto de mais de R$ 6 bilhões no custo de produção

A última movimentação do processo ocorreu em novembro de 2024, quando uma audiência pública ouviu opiniões e argumentos técnicos de 37 representantes de setores e partes envolvidos na ação. Embora não haja previsão de que o tema seja pautado no plenário da Corte, o agronegócio alerta para os impactos diretos ao consumidor e para as exportações brasileiras em meio a um cenário atual de inflação dos alimentos.

Um estudo desenvolvido pelo Ministério da Agricultura em 2020 aponta que o acréscimo de preço decorrente de alterações no Convênio 100 seria repassado aos produtores rurais, resultando em aumento dos custos de produção e perda de competitividade. De acordo com a publicação, caso o Convênio 100 deixe de valer para os defensivos, o impacto sobre os custos de produção seria de R$ 6,7 bilhões. O estudo leva em conta somente as 11 principais culturas produzidas no Brasil, dentre elas, soja, milho, arroz, café, trigo e laranja. A decisão, porém, afetará todos os alimentos e produtos que chegam ao consumidor final, desde a carne até o pão, por exemplo.

A Gazeta do Povo tentou contato com o governo federal, por meio da Secretaria de Comunicação e do Ministério da Fazenda, para saber seu posicionamento sobre a ação, mas não obteve retorno até o fechamento da matéria. A Advocacia-Geral da União (AGU) retornou o contato, dizendo que atuará somente depois do julgamento do STF, para avaliar a decisão da Corte. A reportagem também tentou falar com integrantes do PSOL, mas não houve retorno.

CNA diz que o fim da isenção terá impacto direto no preço dos alimentos

Caso a ação do PSOL seja acatada, cortando o benefício da isenção de impostos para os defensivos agrícolas, os impactos devem ser sentidos por todos os brasileiros.

Em sua manifestação, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) pontuou que “o eventual fim da desoneração terá impacto direto no preço dos alimentos, uma vez que, sendo os defensivos agrícolas – como são – produtos essenciais à produção, não poderão ter seu uso dispensado”.

A posição da entidade é reforçada pelo advogado tributarista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito SP e FGV Agro, Fábio Calcini. “O produto final vai ficar mais caro. O impacto é óbvio, já que a cadeia do agronegócio não vai parar de usar os defensivos”, afirma o tributarista.

Para o deputado Alceu Moreira (MDB-RS), coordenador de política agrícola da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) a manutenção dos benefícios concedidos ao agro por meio do Convênio 100 é imprescindível. “Sua ausência seria um desastre, acarretando o aumento do custo de produção e tirando a competitividade do setor”, avalia o parlamentar gaúcho.

Calcini rebate o argumento do PSOL de que direitos fundamentais seriam afetados pelo uso dos defensivos. Para ele, impor a inconstitucionalidade não terá como efeito a suspensão de impactos ao meio ambiente ou à saúde como o partido defende.

“O aumento da carga fiscal tornará o acesso ao alimento mais oneroso, sem, de outro lado, resguardar os direitos que se pretende proteger. Inclusive, a inconstitucionalidade, além de não ser uma medida adequada, causaria uma maior lesão, pois, para se produzir a mesma quantidade de alimentos, seria necessária uma área de produção maior, reforçando o dano aos cofres públicos, meio ambiente e saúde”, explica o advogado tributarista. Calcini ainda aponta que o PSOL se utiliza de revanchismo ideológico ao propor a ação e defende que o agronegócio deveria ter tributação diferenciada.

No processo de julgamento da ação do PSOL, o ministro Alexandre de Moraes destacou que “análises econômicas trazidas aos autos estimam que o fim da desoneração tributária para produtos fitossanitários [defensivos agrícolas] elevaria de 46,4% para 50,8% o comprometimento do salário mínimo do trabalhador brasileiro com a compra da cesta básica de alimentos”.

Benefícios previstos na Reforma Tributária também são alvo de ação no STF

Além da ação protocolada pelo PSOL em 2016, benefícios concedidos ao agro na reforma tributária (Lei nº 14.785/2023) também já são alvo de ação no STF. O Partido Verde (PV) entrou com uma ação (ADI 7.755) questionando tratamento diferenciado para os defensivos, com redução de 60% na alíquota, previstos na reforma tributária.

Com a nova lei, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) deixará de existir, mas o benefício estabelecido por meio do Convênio 100 deve permanecer vigente.

A ação do PV alega que essa previsão “promove o uso desenfreado e temerário de produtos proibidos em diversos países, violando preceitos fundamentais como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, à saúde e à integridade física”.

Fonte: Gazeta do Povo

 

 

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