Cardápio do golpe: reunião de kids pretos teve coxinha, Coca e guaraná

A defesa do coronel Márcio Nunes de Resende alegou ao  Supremo Tribunal Federal (STF) que seu cliente não discutiu golpe, “carta ao comandante” ou qualquer tipo de pressão a militares para a execução de um golpe de Estado. Denunciado pela Procuradoria Geral da República (PGR) pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e deterioração de patrimônio tombado, o coronel negou que reunião realizada na casa de seu pai, na Asa Norte, área nobre de Brasília, em 28 de novembro de 2022, tenha sido para tratar de golpe. A alegação é de que foi uma “confraternização entre militares que já serviram juntos”.

A Polícia Federal apontou o encontro na casa do aposentado Márcio Resende como reunião golpista entre militares em um salão de festas. Resende é pai do coronel Márcio Resende Júnior, que se defende agora de denúncia da PGR. A reunião foi citada pela PF em seis depoimentos de militares e um ex-assessor de Jair Bolsonaro na investigação de uma articulação golpista no governo Bolsonaro. O nome do coronel Márcio Nunes, conhecido como “kid preto” por prestar serviço como uma espécie de “força especial” militar, foi citado quatro vezes.

Ainda assim, Resende Júnior não foi indiciado pela PF, mas foi denunciado pela PGR, que viu elementos. Em sua defesa, o coronel alega que a reunião no salão de festas do apartamento de seu pai não teve intuito golpista. Diz que era um encontro de amigos no qual cada um levava algum quitute.

Para comprovar sua versão, o coronel apresentou nota da Biscoitos Mineiros, confeitaria famosa na capital. Para o encontro com os amigos militares, pediu 50 coxinhas, 50 empadas, coca-cola e guaraná. A atendente informou que não tinha empada, mas enviou as coxinhas e os refrigerantes.

O coronel apresentou nota do serviço e endossou: “O que a denúncia trata como uma reunião secreta com intuito golpista foi, em verdade, uma confraternização entre militares que já serviram juntos”.

Veja:

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Nota apresentada da compra de coxinhas e refrigerantes

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Pedido feito por “kid preto” para reunião em 28 de novembro, em Brasília

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Nota apresentada da compra de coxinhas e refrigerantes

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Segundo informações da Polícia Federal, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, participou do encontro com outros militares do Exército. A suspeita levantada foi de que o encontro serviu para o grupo elaborar uma carta pressionando o comandante do Exército por um golpe de Estado após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na eleição.

A “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro” foi enviada para o celular de Cid pelo coronel Bernardo Romão, outro integrante no encontro, na noite de 28 de novembro de 2022.

“Covardia, injustiça e fraqueza são os atributos mais abominados para um soldado. Nossa nação, aquela que entrega os maiores índices de confiança às Forças Armadas, sabe que seus militares não a abandonarão”, dizia o texto, segundo a PF.

Outro militar que admitiu à PF ter participado do encontro no salão de festas foi o coronel Cleverson Ney Magalhães. Magalhães era assistente do general Estevam Theophilo, do Comando de Operações Terrestres, que é suspeito de apoiar o plano golpista. Cid afirmou em mensagens apreendidas pelos investigadores que a presença de Magalhães era “a mais importante”.

O coronel Márcio Resende Júnior também estava na reunião no salão de festas da Quadra 305 da Asa Norte. Segundo Magalhães relatou à PF, Resende Júnior era o anfitrião, uma vez que seu pai, Márcio Resende, mora naquele prédio.

Além de Magalhães e Romão, a PF citou a reunião nos depoimentos do general Theophilo, o tenente-coronel Guilherme Marques Almeida, o tenente-coronel Sergio Ricardo Cavaliere e Tercio Arnaud, ex-assessor de Jair Bolsonaro no Planalto e atual funcionário de Bolsonaro no PL.

Pedidos

Ao negar qualquer discussão sobre golpe, a defesa do coronel Márcio Resende pede à Primeira Turma do STF que:

  • Decline da competência para processar e julgar a presente ação penal ao juízo Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal;
  • Reconheça a suspeição do ministro relator, Alexandre de Moraes para processar e julgar o feito;
  • Rejeite a denúncia em relação ao kid preto;
  • Rejeite a denúncia em relação a Márcio Resende por ausência de justa causa e o absolva;
  • Reconheça, em última análise, o excesso de acusação (overcharging), procedendo a desclassificação das imputações contidas na denúncia.

Denúncia

A denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) ocorreu após uma força-tarefa da PGR analisar inquérito da Polícia Federal com mais de 884 páginas sobre as investigações que levaram ao indiciamento de Bolsonaro e outras 33 pessoas, incluindo Márcio Resende. Os denunciados tiveram 15 dias para apresentar defesa. Se houver contestação a trechos da denúncia, o relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, abre vista à PGR para resposta aos questionamentos.

A PGR tem o prazo de cinco dias para responder às contestações. A denúncia volta ao STF, e o relator avalia a acusação e os argumentos da defesa. Nessa etapa, não há prazo. Quando o caso estiver apto a julgamento, o relator libera a denúncia para análise da Primeira Turma, que vai julgar o caso e decidir se transforma os denunciados em réus ou não.

⁠Se a denúncia for aceita, é aberta uma ação penal e começa a fase de contraditório, coleta de provas e de depoimentos de testemunhas de defesa e acusação.

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