‘Foi execução’: dois meses após morte de ‘Anão da Solidão’ pela PM, família pede justiça

A família de Ernesto Schmitz Neto, conhecido como “Anão da Solidão”, pede agilidade à Polícia Civil de Santa Catarina nas investigações acerca da morte. Neto, de 48 anos, morreu em 4 de janeiro após ser baleado pela Polícia Militar em Florianópolis.

Ernesto Schmitz Neto ao lado da filha, Eduarda Schmitz

Eduarda Schmitz, filha de Betinho, organiza manifestação neste domingo (9) para cobrar agilidade nas investigações – Foto: Acervo pessoal/ND

“A gente quer justiça porque o que foi feito não foi normal. Não foi legítima defesa, não foi uma coisa proporcional. Foi totalmente desproporcional e covarde e injusto”, reivindica Eduarda Schmitz, de 24 anos, filha única da vítima.

A polícia foi acionada na Praia da Solidão após uma inquilina dizer que estava sendo ameaçada pelo homem com uma faca. Também conhecido como Betinho, o “Anão da Solidão” estava trancado dentro de casa quando os agentes arrombaram a porta e dispararam ao menos quatro vezes.

A versão da PMSC é de que ele tentou esfaquear os agentes antes de ser baleado. Familiares e amigos, no entanto, questionam o uso da força letal, visto que Betinho media cerca de um metro de altura e estava com uma faquinha de serra na mão.


Moradores registraram o momento em que polícia efetua disparos em ‘Betinho’ – Vídeo: Divulgação/ND

“Ninguém acredita nessa questão de legítima defesa. Foi uma execução. Eles não poderiam nem ter entrado. Meu pai estava sozinho e trancado dentro da casa dele. A polícia arrombou a porta, subiu as escadas e em questão de segundos deu quatro tiros fatais”, considera Eduarda.

Ela aponta que a polícia não tentou outra forma de imobilizá-lo e que o pai estava sozinho, sem apresentar risco para ninguém. A inquilina que havia acionado a PM estava do lado de fora da casa.

“Existem outras formas de imobilizar. Inclusive, é preciso tentar todos os meios antes de usar uma arma letal. Só em último caso se usa esse tipo de coisa. Poderia ser gás, spray de pimenta. Os policiais, com a altura e o preparo físico que têm, poderiam facilmente imobilizar uma pessoa de um metro”, avalia.

Anão da Solidão foi morto pela Polícia Militar em Florianópolis

‘Anão da Solidão’ foi morto com quatro tiros disparados pela PM dentro de casa – Foto: Divulgação/ND

A filha diz que ficou “chocada” ao ler o laudo cadavérico. Segundo ela, os quatro tiros atingiram o tórax do pai, na região do peito. “É uma coisa bem dolorosa”, lamenta.

Para cobrar celeridade nas investigações e exigir justiça, amigos e familiares do “Anão da Solidão” fazem uma manifestação neste domingo (9), às 10h30, na Praia da Solidão.

Polícia Civil afirma que inquérito sobre a morte do ‘Anão da Solidão’ está em fase final

O caso é investigado pela Delegacia de Homicídios da Capital. Ao ND Mais, o delegado Ênio Matos esclareceu que o inquérito sobre a morte do “Anão da Solidão” está sendo finalizado e deve ser remetido ao Fórum na próxima semana.

Delegado Ênio Matos informa que o inquérito está sendo finalizado

Advogado de defesa diz que inquérito policial sobre a morte do “Anão da Solidão” estava parado – Foto: Germano Rorato/ND

Anderson Almeida, advogado da família de Ernesto Schmitz Neto, afirma que o inquérito estava parado porque o escrivão responsável havia sido convocado para a Operação Veraneio.

“O intuito da defesa é que o policial seja indiciado por homicídio, até porque existem provas cabais. O laudo atestou que houve divergência quanto aos disparos”, defende o advogado.

“O policial afirmou que estava em um local, mas o laudo disse uma coisa completamente diferente. Tem uma prova robusta de que ele faltou com a verdade no depoimento que prestou na delegacia”, reitera.

Além do inquérito da Polícia Civil, um IPM (Inquérito Policial Militar) foi instaurado para investigar a conduta e a reação dos policiais. O ND Mais entrou em contato com a PMSC, mas não obteve retorno até o momento desta publicação.

Inquérito Policial Militar investiga atuação dos agentes na Praia da Solidão

Inquérito da Policial Militar apura conduta dos agentes envolvidos – Foto: Divulgação/PMSC/ND

Métodos não letais em ocorrências atendidas pela PM

Em janeiro, após a divulgação do caso, a PMSC pontuou que atualmente os policiais têm a opção de usar um “dispositivo elétrico incapacitante” como método não letal em atendimento de ocorrências.

No entanto, em casos de atendimento a cidadãos em surto psicótico, se “o suspeito está armado ou parte de forma agressiva em confronto contra uma guarnição da PMSC, os policiais estarão preparados para deter este cidadão”.

A corporação também informou que o “Anão da Solidão” tinha passagens por diversos delitos, incluindo ameaça, lesão corporal, desacordo comercial, invasão de propriedade, calúnia, dano, furto, dirigir sob efeito de álcool ou drogas, desacato, resistência (desobediência).

Quem era Betinho, morto a tiros pela PM em Florianópolis

Anão da Solidão abraça a mãe, dona Joaquina

O “Anão da Solidão” era filho único de dona Joaquina, tradicional moradora da região – Foto: Divulgação/ND

Apesar dos surtos psicóticos frequentes, Ernesto Schmitz Neto era “querido pela maioria dos moradores” da Praia da Solidão, garante o psicólogo Thomas Fidryszewski, residente do bairro.

Ele afirma que Betinho “sofria de transtornos psicológicos que o levaram à dependência química, fatos que potencializavam suas crises psicológicas”.

Natural de Florianópolis, o “Anão da Solidão” era filho único de dona Joaquina, moradora da região que alugava quartos na sua casa para turistas durante a temporada de verão.

"Sempre foi um pai super amoroso", descreve a filha de Betinho

“Pai amoroso e ótimo amigo”, descreve a filha Eduarda Schmitz – Foto: Divulgação/ND

A filha Eduarda Schmitz o descreve como uma pessoa carinhosa e do bem. “Sempre foi um pai super amoroso, bem preocupado. Nunca me faltou carinho, afeto e amor por parte dele”, garante.

Ernesto usava medicamentos controlados para epilepsia. Segundo a filha, tinha outros problemas psicológicos não diagnosticados. “Ele tinha depressão, umas crises. Em questão mental, era complicado. Mas era uma pessoa de um coração enorme, queria agradar todo mundo, era carinhoso, de demonstrar muito afeto”, lembra.

“Quem conheceu o meu pai feliz, brincalhão e amoroso sente essa indignação que estou sentindo agora”, lamenta. “A gente quer que as pessoas deem importância para esse caso, para não ser só mais um”, finaliza Eduarda.

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