Cientistas liderados por brasileiro descobrem buraco negro de tipo raro

Um buraco negro ultramassivo parece estar escondido em um sistema de galáxias a cerca de 5 bilhões de anos-luz da Terra. O misterioso objeto foi encontrado por uma equipe de pesquisadores liderada por Carlos Melo-Carneiro, doutorando na Universidade de Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

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Atualmente, Melo-Carneiro está no último ano do doutorado em Astrofísica na UFRGS e vem se dedicando ao estudo da massa das galáxias. “Como não é possível simplesmente ‘colocar uma galáxia em uma balança’, precisamos usar métodos indiretos e criativos para estimar a massa desses objetos gigantescos”, explicou em entrevista ao Canaltech

Para isso, ele trabalha com dois métodos. Um deles consiste em analisar o movimento das estrelas da galáxia em questão, parâmetros que dependem diretamente da massa delas. O outro envolve as chamadas lentes gravitacionais, um fenômeno previsto pela Teoria da Relatividade Geral, de Albert Einstein. 


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Exemplo de lente gravitacional (Imagem: Reprodução/P. van Dokkum et al., Nature Astronomy)

De forma resumida, as lentes gravitacionais ocorrem quando dois objetos cósmicos estão alinhados na perspectiva do observador, e aquele que está mais próximo é bastante massivo. “Devido à sua enorme massa, o objeto mais próximo curva o caminho da luz emitida pelo objeto mais distante, fazendo com que essa luz chegue até nós de forma distorcida”, disse ele. 

O efeito é importante porque, ao analisar a distorção, os pesquisadores conseguem estimar a massa do objeto, já que a intensidade da distorção depende da massa. E foi uma lente destas que indicou a presença do buraco negro supermassivo no sistema de galáxias.

Buraco negro ultramassivo

Foi em 2007 que cientistas descobriram a Ferradura Cósmica, um sistema de galáxias a cerca de 5 bilhões de anos-luz de nós. A galáxia da frente, designada LRG 3-757, é tão massiva que distorceu a imagem daquela ao fundo, cuja luz precisou viajar por bilhões de anos até nos alcançar. A equipe descobriu que o buraco negro ultramassivo parece estar em LRG 3-757, 100 vezes mais massiva que a Via Láctea

Este objeto parece ter impressionantes 36 bilhões de massas solares, ou seja, sua massa equivale a 36 bilhões de vezes à do nosso Sol, de 1.989 × 10^30 kg. “Isso não significa que ele ocupe um espaço proporcionalmente maior”, ressaltou ele. Mesmo assim, o buraco negro é considerado ultramassivo. Segundo Melo-Carneiro, esta definição é relativamente nova, e tem sido aplicada àqueles com pelo menos 10 bilhões de massas solares. 

Lente gravitacional da Ferradura Cósmica (Reprodução/NASA/ESA/Hubble)

Embora sejam poucos os buracos negros tão massivos conhecidos, os pesquisadores já conseguriam notar alguns efeitos interessantes neles — um deles é a correlação entre a dispersão de velocidades das estrelas da galáxia e os buracos negros supermassivos, que pode revelar a massa da galáxia em questão. 

Segundo o autor, parece que os ultramassivos desafiam esta regra porque são muito mais massivos do que o esperado com base na dispersão de velocidade da galáxia onde estão. “Isso sugere que eles podem ter evoluído de maneira diferente dos buracos negros supermassivos, o que os torna objetos ainda mais interessantes”, acrescentou. 

Encontrando o gigante invisível 

Além da sua massa impressionante, o buraco negro em questão está adormecido, ou seja, não tem atividade no momento. Mas seu “silêncio” não impediu que a equipe o encontrasse. “Isso foi possível graças aos efeitos gravitacionais que ele exerce sobre o movimento das estrelas em sua galáxia e na deformação da luz que passa em sua vizinhança”, explicou o autor. 

Eles combinaram os dados do movimento das estrelas e das lentes gravitacionais para estimar a massa do buraco negro. “O que observamos, e que já havia sido sugerido anteriormente, é que algumas galáxias abrigam buracos negros supermassivos ainda mais massivos do que se esperava”, concluiu. Menos de 10 buracos negros ultramassivos haviam sido detectados, e a descoberta amplia a lista. 

O buraco negro em questão está inativo (Reprodução/ESA/Hbble, Digitized Sky Survey, Nick Risinger, N. Bartmann)

Além disso, os resultados vão ajudar os pesquisadores a entenderem melhor a evolução dos buracos negros, bem como a relação entre estes misteriosos objetos e suas galáxias. “Os buracos negros supermassivos ‘comuns’ geralmente apresentam uma correlação entre sua massa e a dispersão de velocidades das estrelas na galáxia”, explicou, acrescentando que os buracos negros ultramassivos parecem desafiar esta compreensão. 

Isso sugere que talvez eles tenham surgido ou evoluído de alguma outra forma — por exemplo, existe a possibilidade de que tais buracos negros tenham surgido com massa alta quando o universo ainda era jovem. “Se esse for o caso, com o passar do tempo eles apenas continuaram a crescer, acumulando mais massa e se tornando os objetos extremamente massivos que observamos hoje”, sugeriu. 

Evolução dos buracos negros 

Vale lembrar que esta, bem como outras hipóteses, ainda exigem mais estudos. “Para chegarmos a uma conclusão definitiva, serão necessárias mais pesquisas e dados observacionais”, ressaltou ele. O artigo que descreve as descobertas foi enviado à revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society para a revisão por pares, etapa em que outros especialistas da área analisam o estudo e propõem melhorias e ideias. 

“É importante destacar que esse estudo foi uma colaboração entre o Instituto de Física da UFRGS e o Instituto de Cosmologia e Gravitação (Institute of Cosmology and Gravitation, ICG), no Reino Unido. Além disso, o projeto só foi possível graças ao financiamento da CAPES”, destacou o especialista. 

Enquanto isso, mais buracos negros supermassivos — e, claro, ultramassivos — podem ser identificados com futuros levantamentos astronômicos com observatórios como o Euclid, da Agência Espacial Europeia e o Extremely Large Telescope, no Chile. “Com um número crescente de detecções, poderemos, no futuro, entender melhor como esses buracos negros ultramassivos se formam e se tornam tão imensos”, concluiu Melo-Carneiro.

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