MPF recorre para codenar União por morte de sindicalista na ditadura

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com um recurso contra decisão da Justiça Federal do Acre que negou os pedidos de responsabilização da União e do estado do Acre pela suposta omissão na investigação da morte do líder sindical e seringueiro Wilson Souza Pinheiro, assassinado durante a ditadura militar.

Pinheiro era presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasiléia e um dos principais atuantes contra a exploração fundiária na região. Sua morte, em 1980, ocorreu em meio a um contexto de intensos conflitos agrários na Amazônia.

Segundo o órgão, ele foi morto dentro do sindicato por três tiros nas costas. No entanto, o inquérito policial foi arquivado como “crime insolúvel” e aqueles que cobravam a apuração do caso teriam sido intimidados por agentes do Estado.

O caso se estende pelo menos desde 2021, quando a Procuradoria decidiu apurar a suposta omissão estatal na investigação da morte de Pinheiro, uma vez que as circunstâncias não teriam sido esclarecidas. Depois, em 2023, foi ajuizada uma ação civil pública.

Na ação, o MPF pediu medidas de reparo como um pedido formal de desculpas à família e à sociedade brasileira, a retificação da certidão de óbito de Pinheiro para reconhecer que ele foi vítima de assassinato no contexto de “violações sistemáticas de direitos humanos promovidas pela ditadura”, além do pagamento de R$ 1 milhão em danos morais coletivos, que seriam revertidos para projetos educativos.

Também foi solicitada a criação de um espaço de memória em Rio Branco, capital acreana, e a restauração do Memorial Wilson Pinheiro, em Brasiléia (AC).

“Wilson Souza Pinheiro, como presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia, tornou-se um dos principais ícones da luta contra a exploração fundiária e pela preservação dos direitos dos seringueiros e trabalhadores da região amazônica, e consequentemente, tornou-se um alvo em potencial”, afirma o MPF.

Os pedidos, no entanto, foram negados. O juiz do caso reconheceu a importância histórica do sindicalista, mas não identificou conexão direta entre a morte de Wilson Pinheiro e o regime militar.

O magistrado decidiu também,  segundo o MPF, que a ausência de apuração reflete mais a ineficiência estrutural dos órgãos de segurança pública da época e que não foram apresentados elementos que comprovassem a omissão específica de agentes estatais no caso.

“Repise-se: não se menciona nenhum ato, nenhuma palavra que indique que o Governo da época, Estadual e Federal, tenha tentado interferir na apuração do delito (a rigor, não precisava, dada a estrutura existente). A morte de Wilson Pinheiro foi fruto de um descaso, da ausência de políticas públicas focadas nos problemas relacionados à luta no campo e não poderia ser compreendida como um desentendimento entre fazendeiros e seringueiros/posseiros, mas como expressão de um movimento maior a reclamar ações afirmativas e proativas para a ocupação e regularização da terra”, diz trecho da decisão.

No recurso, a Procuradoria rebate dizendo que a omissão estatal em regimes democráticos, embora grave, geralmente decorre de falhas estruturais, técnicas ou administrativas, sem evidência de “conivência deliberada”.

Já em regimes de exceção, como a ditadura militar, a omissão se caracteriza como parte de uma “política estatal de repressão, seja por ação direta ou tolerância a violações.”

A Procuradoria também destaca a recomendação da Comissão Nacional da Verdade para que o caso fosse investigado e cita jurisprudências que reconhecem a necessidade de reparação a vítimas de violações de direitos humanos durante regimes autoritários.

O órgão pede, ainda, que familiares de Wilson Pinheiro sejam ouvidos no processo. O caso será analisado peloTribunal Regional Federal da 1ª Região, que decidirá se mantém a decisão de primeira instância ou se acata o pedido do MPF para reabrir a discussão sobre a responsabilização do Estado.

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