Caso Vitória: após erros e recuos, Civil nega culpa por desinformação

São Paulo — Ao apresentar uma nova versão para o assassinato brutal da menina Vitória Regina, de 17 anos, delegados Polícia Civil de São Paulo cobraram da imprensa responsabilidade na divulgação de informações sobre o caso, sem mencionar os erros e as contradições da própria polícia durante as investigações.

“As redes sociais vem acabando por implementar um potencial ‘show business’ nesse tipo de crime. Isso é muito lamentável”, disse o delegado de Cajamar Fabio Cenachi, responsável pelo inquérito, em entrevista coletiva ao lado do diretor do Departamento de Polícia da Macro São Paulo (Demacro), Luiz Carlos do Carmo, nessa terça-feira (18/3).

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Vitória Regina

Vitória em festa de formatura
Vitória Regina de Souza, de 17 anos
Jovem desapareceu em Cajamar, na região metropolitana de SP
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Corpo de Vitória Regina de Souza, 17, foi encontrado com sinais de tortura e decapitado em Cajamar (SP). Polícia ouviu 14 pessoas envolvidas

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Vitória Regina de Souza, de 17 anos

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Jovem desapareceu em Cajamar, na região metropolitana de SP

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A adolescente Vitória Regina de Souza, de 17 anos, foi encontrada morta em Cajamar

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“Nós sabemos que a difusão de informações especulativas acaba gerando um feedback que demanda que só faz atrapalhar o andamento do serviço. Se você divulga uma informação que não corresponde à verdade, você começa a provocar uma demanda de denúncias”, acrescentou.

Durante as investigações, a polícia divulgou uma série de especulações sobre o que teria acontecido com Vitória, chegando a dizer que a menina poderia estar envolvida em “talaricagem” e que poderia ter sido vítima do Primeiro Comando da Capital (PCC).

Nada disso é verdade, segundo as informações dadas pela polícia nessa terça-feira. A equipe de investigação agora afirma que o crime teria sido cometido por Maicol Sales dos Santos, apontado como um homem obcecado por Vitória, que a “stalkeava” pelo menos desde o ano passado. Ele teria agido sozinho. Preso desde o último dia 8 de março, Maicol teria confessado o crime na terça.

Para além das teorias que não se comprovaram, a polícia também divulgou informações desmentidas pelo laudo do Instituto Médico Legal (IML). O documento aponta que Vitória não foi decapitada, nem faz menção a supostas marcas de tortura mencionadas anteriormente. Vitória foi vítima de três perfurações, no tórax, no pescoço e no rosto.

Decapitada

A informação de que Vitória Regina havia sido torturada e decapitada surgiu em 5 de março, mesmo dia em que foi encontrada sem vida após ficar uma semana desaparecida. O corpo da menina estava em uma área de mata no bairro Ponunduva, onde ela mora, na região rural de Cajamar.

A história partiu do delegado seccional de Franco da Rocha, Aldo Galiano, quando questionado por jornalistas de diferentes veículos. Ao Metrópoles, ele afirmou em “on” via WhatsApp: “[O corpo] foi encontrado. [Ela estava] bem torturada e decapitada”.

A informação, amplamente repercutida na imprensa, foi reiterada por Galiano em uma entrevista coletiva concedida em 7 de março. Na ocasião, ele ainda acrescentou detalhes, dizendo que a menina teria tido um grande afundamento no crânio e tido a cabeça raspada.

O estado em que o corpo foi encontrado, afirmou o delegado, seria um “sinal evidente” do suposto envolvimento do PCC e a possível “talaricagem”.

“Quem é o talarico? É uma mulher que traiu alguém do PCC”, disse Galiano. “Ou um homem que traiu alguém do PCC. O sinal é a raspagem do cabelo. Eles querem deixar para mandar um recado. Ela estava com o cabelo raspado. Então, aí é um sinal evidente”, disse.

“Segundo sinal é que nós prendemos há quatro meses atrás o integrante do PCC, que era a sintonia da área. Então, próximo ao local que ela está, há uma presença de célula no PCC”, completou.

Assista:

Nessa terça-feira (18/3), o delegados Fabio Cenachi e Luiz Carlos do Carmo afirmaram que o fato de Vitória estar sem cabelo pode estar relacionado ao estado de decomposição e garantiram que não há indícios de tortura.

“Pode ter havido o despregamento do couro cabeludo pela instalação da fase de liquefação. Não há elementos que denunciem nesse sentido. Nem os médicos legistas acreditam que tenha sido raspado”, afirmou Cenachi.

Suposto cativeiro

Na mesma entrevista coletiva, Galiano também sugeriu que Vitória Regina poderia ter sido mantida em um cativeiro, dizendo que a estimada data em que ela havia morrido, feita a partir do estado de decomposição, não batia com a data em que ela havia desaparecido.

Além disso, segundo o delegado, o celular da menina teria sido rastreado por meio do sistema de geolocalização a dezenas de quilômetros de onde o corpo foi achado.

“Sobre cativeiro, nós temos uma área e nós triangulamos o telefone dela. Só pra esclarecer, o corpo dela estava descartado em decomposição há 4 ou 5 dias. Ela estava desaparecida há 7. Nesses dois primeiros dias, nós fizemos uma triangulação de antena, que deu em uma zona completamente distante do local onde foi encontrado e da casa dela”, afirmou.

“Essa localização, nós fizemos várias diligências na terça-feira, foi exaustivamente vasculhada, não se achou nada e, na quarta-feira, foi achado o corpo, mas é distante. Com certeza, pelas antenas, as ERBs [Estações de Rádio Base], ela esteve nesse local ou o celular dela esteve nesse local”, acrescentou o delegado.

A hipótese também foi afastada na entrevista coletiva concedida nessa terça-feira (18/3). De acordo com o delegado Luiz Carlos do Carmo, Vitória Regina foi morta no momento do arrebatamento, dentro do carro de Maicol, enquanto a menina voltava do trabalho.

A teoria é que Vitória reagiu à tentativa de sequestro e acabou sendo esfaqueada. O corpo teria sido levado para área de mata no mesmo momento.

“[Na confissão], ele fala da arma. Ele fala que realmente esfaqueou a vítima naquele momento do arrebatamento[e], por isso, o laudo sexológico não tem sêmen. […] A gente não tem a menor dúvida quanto a ele ser o autor desse crime”, disse Luiz Carlos do Carmo.

Outros suspeitos

Na coletiva dessa terça-feira, os delegados também cobraram responsabilidade na divulgação de nomes de suspeitos feita durante a investigação.

“A minha pergunta é: se fosse uma pessoa da nossa família, seria justo que fôssemos expostos em rede mundial por um fato que eventualmente não se comprova?”, questionou Fabio Cenachi. “Muitas vezes, pior do que não se comprovar, se demonstra inexistente. Ou não conta com a participação daquela pessoa”.

Os nomes divulgados pela imprensa, no entanto, partiram da própria polícia. Na semana passada, o próprio delegado Luiz Carlos do Carmo divulgou os nomes dos três suspeitos de envolvimento no caso. Além de Maicol, Daniel Lucas, que seria amigo da família, e Gustavo Vinícius, que teria um caso com a vítima.

Na ocasião, Luiz Carlos deu detalhes sobre as suspeitas envolvendo Daniel. Ele disse que, dias antes de Vitória ser sequestrada, o jovem teria feito vídeos do trajeto feito pela menina.

“Daniel permanece como suspeito em razão de que temos aqui o celular dele apreendido. No aparelho, tem imagens feitas dias antes no local onde a vítima desceria. Foi gravado no celular dele. Poderia ser uma filmagem já preparando o arrebatamento”, disse o delegado em 10 de março.

O nome de Gustavo Vinícius havia sido amplamente divulgado pelo delegado Aldo Galiano. Na entrevista coletiva de 7 de março, ele afirmou que “com certeza” ele sabia de “alguma coisa” sobre o crime.

“Nós já temos informações que 0h35 ele estava próximo ao local do crime, tá? Então, já furou toda a conversa que ele apresentou pela própria cronologia do tempo. Eu ainda trato como investigado. Se a gente tivesse algo contundente de prova, ele até pedia uma preventiva. A gente ainda trata como investigado. Com certeza alguma coisa essa pessoa sabia”, afirmou.

A hipótese da participação de outros envolvidos foi descartada nessa terça-feira. Segundo Luiz Carlos do Carmo, Maicol seria um “psicopata” e por isso teria agido sozinho.

“Uma pessoa dessa [se referindo ao Maicol] não consegue trabalhar com outro psicopata. Ele é um psicopata. Um psicopata. Ele não comenta, não fala sobre o aconteceu depois.”

A morte de Vitória

  • Vitória Regina de Souza, de 17 anos, foi encontrada morta na tarde do dia 5 de março, em uma área rural de Cajamar, na Grande São Paulo. Ela estava desaparecida desde o dia 26 de fevereiro, quando voltava do trabalho.
  • Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou que o corpo estava em avançado estado de decomposição. A família reconheceu o corpo por conta das tatuagens no braço e na perna e um piercing no umbigo.
  • Imagens de câmeras de segurança mostram a jovem chegando a um ponto de ônibus no dia 26 de fevereiro e, posteriormente, entrando no transporte público. Antes de entrar no coletivo, a adolescente enviou áudios para uma amiga nos quais relatou a abordagem de homens suspeitos em um carro, enquanto ela estava no ponto de ônibus.
  • Nos prints da conversa, a adolescente afirma que outros dois homens estavam no mesmo ponto de ônibus e que lhe causavam medo. Em seguida, ela entra no ônibus e diz que os dois subiram junto com ela no transporte público — e um sentou atrás dela.
  • Por fim, Vitória desce do transporte público e caminha em direção a sua casa, em uma área rural de Cajamar. No caminho, ela enviou um último áudio para a amiga, dizendo que os dois não haviam descido junto com ela. “Ta de boaça”. Foi o último sinal de Vitória com vida.
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