Musculação protege cérebro de idosos contra atrofia e doenças como Alzheimer, aponta Unicamp

 

Um estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) indicou que a musculação protege o cérebro de idosos contra demências e doenças como Alzheimer. Os resultados foram publicados pela revista americana GeroScience, em janeiro deste ano.

A pesquisa acompanhou 44 idosos no interior de São Paulo diagnosticados com comprometimento cognitivo leve – um quadro clínico considerado “pré-Alzheimer”, segundo a doutora em neurociência pela Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp Isadora Ribeiro, responsável pelo estudo.

De acordo com a pesquisadora, no comprometimento cognitivo leve, o paciente é sintomático, mas não atinge uma pontuação ideal para receber o diagnóstico de Alzheimer quando é submetido a testes neuropsicológicos.

Os participantes foram divididos em dois grupos: metade realizou treino de força com progressão de carga duas vezes na semana, ao longo de seis meses. Os demais não realizaram qualquer exercício físico no período.

Os participantes que faziam treino de força mostraram uma melhor performance da memória, além de apresentarem alterações na anatomia cerebral, e em alguns casos, a remissão do quadro clínico.

A pesquisa foi conduzida no Instituto de Pesquisa sobre Neurociências e Neurotecnologia em Campinas (SP), um centro de pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) dentro do campus da Unicamp.

Mudança na anatomia e remissão

Ao fim dos seis meses de estudo, o grupo que praticou a musculação apresentou uma proteção parcial contra a redução do volume no hipocampo e do pré-cutâneo, regiões do cérebro que exercem papel importante na memória e na cognição. Já o o grupo que não fez o exercício desenvolveu a atrofia.

  • dois idosos que não praticaram musculação converteram o quadro inicial para a doença de Alzheimer
  • e cinco que praticaram a musculação, não pontuaram no teste neuropsicológico, indicando que estavam com a cognição preservada.

“Quem fez a musculação, a redução do volume do cérebro parou naquelas regiões [hipocampo e do pré-cutâneo]. E quem não fez, continuou”, afirma a pesquisadora.

Em entrevista ao g1, a e responsável pelo estudo, explicou que, apesar de já ser comprovado que o aumento da força muscular está relacionado com o crescimento da cognição, ela queria entender qual seria a alteração no cérebro.

“Já sabíamos que alguns tipos de exercício melhoravam a cognição em idosos, como os exercícios aeróbicos, entre outros. Mas a gente queria ver, com o treinamento de força, o que acontecia. Porque o aumento da força muscular está relacionado com o aumento da cognição, e também com a diminuição da incidência da doença de Alzheimer”, explica a a pesquisadora.

“‘Eles têm uma perda cognitiva acentuada de memória ou de atenção, ou até de funções executivas, que estão relacionadas com o planejamento de atividades da vida diária”, diz Ribeiro.

Saúde dos neurônios

O trabalho foi o primeiro a demonstrar o que acontece com a integridade da substância branca —tecido do sistema nervoso que constitui as redes neurais relacionadas a funções cognitivas — dos idosos diagnosticados com comprometimento cognitivo leve após a prática de musculação.

Ribeiro explica que, além de perceber o que acontece com o volume do cérebro após uma intervenção com a musculação, também observou que o treino de força melhorou a “saúde dos neurônios”.

“A gente consegue medir na ressonância magnética, [na análise] que vai falar sobre a saúde do neurônio, se ele está preservado ou se, anatomicamente, ele não está preservado. Quando ele está preservado, a gente tem uma estrutura cerebral mais saudável. Quando ele não está, a gente não tem”, explica.

“Percebemos que o grupo ‘treinamento’ [que fez a musculação] melhorou esses parâmetros [que indicam a saúde do neurônio]. E o grupo ‘controle’ piorou, porque eles não fizeram nada. Então, o exercício também melhorou a saúde do neurônio”, reitera a pesquisadora

Memória episódica verbal

Os benefícios observados não se restringiram à anatomia. A pesquisa também indicou que, depois dos seis meses de prática de musculação, os idosos participantes na pesquisa apresentaram uma melhora significativa na memória episódica verbal — que, na linguagem popular, pode ser traduzida como a “memória recente”.

Para chegarem a essa constatação, todos os pacientes precisaram fazer um teste de memória conhecido no campo da neurociência como “RA-VLP”, que tem o seguinte passo a passo:

  1. O médico passa uma lista para o paciente, e fala algumas palavras
  2. O paciente precisa lembrar das palavras apresentadas
  3. Após essa primeira fase, o especialista apresenta uma lista confundidora, com outras palavras
  4. Ao final de algum tempo, o paciente precisa se recordar das palavras que estavam na primeira relação apresentada.

Ribeiro explica que o bom desempenho no exercício e na memória episódica verbal está diretamente relacionado a preservação do hipocampo, uma das áreas do cérebro que recebeu a proteção contra atrofia, conforme o estudo.

“Quando a gente pensa na doença de Alzheimer, o hipocampo é responsável pela formação de novas memórias —pela memória recente, principalmente. Então, quando a gente vê nesse paciente, que a memória recente dele ainda está boa, é um bom resultado”, explica.

Efeito cumulativo: quanto mais cedo, melhor

A pesquisadora também afirma que o efeito de proteção no cérebro é cumulativo. Ou seja, quanto mais cedo a pessoa começa a se proteger, maior será a sua reserva cognitiva.

“A massa muscular se comporta de uma forma muito parecida: quanto mais massa muscular você tem, melhor. É claro que ao longo do envelhecimento vai existir uma perda natural [tanto na massa muscular, quanto na reserva cognitiva], mas ela também vai influenciar nessa perda”, diz.

Ribeiro afirma que a musculação pode ser usada como uma “ferramenta não farmacológica”, que pode atrasar a progressão da demência — e quem sabe, até evita-lá.

“É uma terapia de fácil acesso, porque ela é acessível econômica. Muito mais barata do que você ficar comprando medicação, que vai melhorar só a cognição, mas não vai melhorar a independência funcional [a capacidade de realizar atividades cotidianas], por exemplo. Também não vai, possivelmente, parar a diminuição cerebral”, conclui.

Fonte: G1

Adicionar aos favoritos o Link permanente.