A Corte Constitucional da Coreia do Sul confirmou nesta sexta-feira (4/4), por unanimidade, a destituição do presidente Yoon Suk Yeol, quatro meses após sua tentativa de impor a lei marcial no país.
Com a decisão, Yoon perde imediatamente o cargo — ele estava apenas suspenso até então — e o país deverá realizar uma eleição presidencial antecipada em até 60 dias. No entanto, especialistas acreditam que a decisão da Corte pode não ser suficiente para tirar o país do atual caos político.
O líder da oposição, Lee Jae-myung, grande favorito para a sucessão, comemorou a saída do presidente conservador, acusando-o de ter “ameaçado o povo e a democracia”.
Em uma decisão contundente, lida em 23 minutos pelo presidente da Corte, Moon Hyung-bae, e transmitida ao vivo para milhões de sul-coreanos, os juízes confirmaram o processo de impeachment aprovado pelo Parlamento em 14 de dezembro.
A Corte considerou que as ações de Yoon “violaram os princípios fundamentais do Estado de Direito e da governança democrática”.
Segundo a Corte, Yoon “cometeu atos que violaram a Constituição e as leis, incluindo a mobilização de tropas e forças policiais para impedir que o Parlamento exercesse sua autoridade”. A decisão de usar os militares para tentar calar o legislativo também teria “quebrado a neutralidade política das Forças Armadas”.
“As ações inconstitucionais e ilegais do réu traem a confiança do povo e representam uma violação grave da lei, inadmissível sob a ótica da proteção da Constituição”, declarou a Corte. “Proferimos a seguinte decisão, com a concordância unânime dos juízes: destituímos o presidente Yoon Suk-yeol.”
Logo após o veredito, todas as instalações militares do país foram orientadas a retirar imediatamente os retratos de Yoon de suas repartições, informou o Ministério da Defesa, citado pela agência Yonhap.
“Estou profundamente arrependido e com o coração partido por não ter correspondido às expectativas de vocês”, declarou Yoon, em um breve comunicado. Seu partido afirmou que “aceita solenemente” a decisão.
Reações populares e cenário político
Milhares de manifestantes contrários a Yoon se reuniram ao ar livre para acompanhar a leitura da decisão, de mãos dadas em sinal de união. “Quando a destituição foi anunciada, os aplausos foram tão ensurdecedores que parecia que a multidão estava vibrando como numa onda”, contou Kim Min-ji, de 25 anos. “Choramos muito e gritamos que nós, cidadãos, vencemos!”
A decisão representa “antes de tudo, a resiliência da democracia sul-coreana”, afirmou Byunghwan Son, professor da Universidade George Mason. “O simples fato de que o sistema não desmoronou já mostra que a democracia coreana pode sobreviver até mesmo à pior das ameaças: uma tentativa de golpe de Estado.”
Manifestantes pró-Yoon também se concentraram no centro de Seul. Um manifestante foi preso após tentar atacar um veículo da polícia com um bastão, segundo autoridades.
O julgamento era aguardado com grande expectativa em um país profundamente polarizado, ainda em choque com a tentativa de golpe em dezembro e tenso após meses de protestos massivos de ambos os lados.
Em 19 de janeiro, apoiadores radicais de Yoon invadiram um tribunal que acabava de renovar sua prisão preventiva. Desde o início do ano, pelo menos dois de seus partidários atearam fogo ao próprio corpo em protesto contra sua situação.
Eleito em 2022 e sem nunca ter contado com maioria parlamentar, o ex-promotor de 64 anos foi perdendo apoio popular até decretar, de forma surpreendente, a lei marcial na madrugada de 3 para 4 de dezembro.
Apesar da presença de tropas cercando o Parlamento, um número suficiente de deputados conseguiu se trancar no plenário e aprovar por unanimidade uma resolução exigindo a revogação imediata da medida, obrigando Yoon a recuar.
Yoon sempre alegou que a decisão foi necessária para conter “forças comunistas norte-coreanas” e “eliminar elementos hostis ao Estado”. Ele se dizia vítima de uma “ditadura parlamentar” que bloqueava sistematicamente todos os projetos do governo, incluindo o orçamento nacional.
Yoon também foi indiciado por “insurreição”, crime que pode levar à pena de morte. Preso em janeiro e colocado em detenção provisória, ele foi libertado em 8 de março por um erro processual. Seu julgamento criminal começou em fevereiro, em Seul.
O anúncio da decisão da Corte levantou temores de violência. Os arredores do tribunal foram completamente isolados. Diversas embaixadas aconselharam seus cidadãos a evitarem a região.
Em 2017, quatro pessoas morreram em confrontos após a destituição da então presidente Park Geun-hye.
Futuro político da Coreia do Sul
Apesar da queda, Yoon “conseguiu mobilizar uma base política consistente, especialmente entre os grupos da extrema direita”, avalia Ji Yeon Hong, professora de Ciência Política da Universidade de Michigan.
“Esse movimento é mais estrutural e ideológico”, afirma ela, alertando que esse legado pode sobreviver a Yoon.
O próximo presidente enfrentará diversos desafios: uma economia estagnada e uma sociedade profundamente dividida — num momento em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, declarou uma guerra comercial ao restante do mundo.
“Um dos desafios mais urgentes será manter uma aliança sólida com os Estados Unidos e também com o Japão”, ressalta Gi-wook Shin, professor de Sociologia da Universidade de Stanford.
Durante seu primeiro mandato, Trump chegou a se reunir várias vezes com o líder norte-coreano Kim Jong-un, defendendo a distensão, mas sem sucesso em pôr fim ao programa nuclear do país.
“As relações com a Coreia do Norte não podem ser ignoradas”, afirma Vladimir Tikhonov, professor de Estudos Coreanos da Universidade de Oslo. “Para o próximo presidente sul-coreano, lidar com esses desafios diplomáticos será uma prioridade absoluta”, conclui.