O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu livrar o ex-ministro da Previdência durante o governo Lula 2, Carlos Gabas, em um caso que analisava a compra de 300 respiradores na época da pandemia de covid-19 pelo Consórcio do Nordeste.
O caso que envolve o ex-ministro da Previdência, que na época dos fatos era secretário executivo do Consórcio, se deu em 2020, em um dos momentos mais críticos da pandemia de covid-19, com uma alta de casos e mortes diárias no Brasil em decorrência da emergência de saúde.
Na época, o Consórcio do Nordeste comprou os aparelhos de uma empresa chinesa por R$ 48,7 milhões. O valor foi pago adiantado para a Hempcare Pharma, cuja especialidade era venda de medicamentos a base de cannabis. Os aparelhos, no entanto, sequer foram entregues.
O voto vencedor foi apresentado pelo ministro Bruno Dantas, que entendeu pela a conversão do processo em tomada de contas especial para recuperar o valor do prejuízo, mas exclusivamente junto à empresa, e não aos gestores.
Para Dantas, a conduta, por mais não que não tenha seguido os ritos normais da contratação pública, se deveu à atipicidade do contexto da época, em que o Brasil vivia uma pandemia inédita na saúde pública.
“A nossa atividade de interpretar normas e fatos exige uma análise cuidadosa das circunstâncias fáticas, o pano de fundo para o transcurso dos eventos, reconhecendo que a percepção sobre os mesmos fatos se altera ao longo do tempo e a partir de novas perspectivas”, afirmou.
Quanto a Carlos Gabas, foram acolhidas as razões de justificativa apresentadas pela defesa, representada pelo advogado Pablo Domingues Ferreira de Castro, e o caso quanto a ele foi arquivado.
Em sustentação oral no julgamento, o advogado negou qualquer irregularidade por parte do então secretário executivo do Consórcio.
O caso foi relatado pelo ministro Jorge Oliveira, que teve o voto vencido. Ele se manifestou no sentido de converter o processo em uma tomada de contas especial para continuar a apuração dos fatos.
Oliveira afirmou que seu voto não é reflexo de uma “insensibilidade” em razão dos momentos “caóticos” vividos por gestores durante a pandemia de covid-19, mas que afastar desde já uma possibilidade de apuração seria imprudente.
“A contratação ocorreu em momento atípico, caracterizado pela pandemia de covid-19, que demandava ações céleres por parte da União e dos entes federativos. Todavia, os elementos constantes dos autos revelaram o açodamento da contratação dos respiradores pulmonares pelo Consórcio”, disse.
O ministro afirma que a responsabilidade de Gabas foi constatada por meio de documentos do consórcio que apontaram a necessidade de contratação da empresa Hempcare como fornecedora dos equipamentos, assim como pela definição das condições de pagamento e de fornecimento dos produtos.
“Além disso, incorreu em omissão grave no dever de regulamentação e supervisão de seus subordinados”, afirmou.
O Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste, popularmente chamado apenas de Consórcio do Nordeste, é um grupo que representa os nove estados integrantes da região.
A aquisição conjunta de equipamentos para tratar pessoas com covid-19 veio a partir de uma resolução do Consórcio, de março de 2020, que determinava a compra de bens e serviços destinados ao enfrentamento da pandemia.
Em relatório da área técnica foram elencados alguns problemas na contratação, como a constituição da empresa cerca de 9 meses antes da assinatura do contrato, o capital social relativamente baixo, de apenas R$ 100 mil, e o fato de que nunca havia fornecido produtos para a administração pública.
Na mesma esteira do TCU, a Polícia Federal (PF) tem investigado o mesmo tema. Esse é o objeto da operação Cianose, deflagrada em abril de 2022 e cuja segunda fase deu continuidade à investigação no ano passado.
Defesa
No julgamento, o advogado Pablo Ferreira de Castro, que representa Carlos Gabas, teve 10 minutos para fazer sua sustentação oral em favor do cliente.
Segundo ele, Gabas, assim como os estados que compõem o Consórcio do Nordeste, foram “vítimas” de um golpe aplicado na compra dos respiradores.
“Aquele período era muito difícil. Havia pessoas morrendo nos leitos médicos, estavam faltando equipamentos para tratar as pessoas. Aí surge a necessidade de se adquirir respiradores”, afirmou.
Ele alegou que, por conta da pandemia, não seria possível que o processo de compra dos itens seguisse o trâmite normal das aquisições públicas, por meio de licitações, o que dificultou que o Consórcio fechasse o negócio com mais cautela.
“As questões naquela época tinham que ser tratadas um pouco a toque de caixa […] E a lei permitia que se fizesse este tipo de contratação com o pagamento antecipado, até porque não se tinha oferta de equipamentos”, afirmou.
Ainda, Castro disse que o processo de compra foi submetido ao crivo do controle interno do Consórcio.