São Paulo — O soldado de 19 anos que denuncia ter sofrido agressões em um quartel do Exército em Barueri, na Grande São Paulo, relatou ter perdido o movimento das pernas. Ao Metrópoles, Valdir de Oliveira Franco Filho afirmou que não consegue mais andar, e que continua vomitando sangue, mesmo um mês e meio após a tortura, que ocorreu em 10 de março.
Uma ressonância magnética feita em 14 de abril apontou que Valdir está com sacralização de L5 – uma fusão, parcial ou completa, da vértebra da lombar com o sacro, formando um único osso.
A condição – causada por diversos fatores, incluindo traumas e lesões – pode levar a dor lombar e alterações na biomecânica da coluna.
“Desde criança, meu sonho é ser mecânico do Exército. Era um sonho, que foi destruído”, disse à reportagem. “O que eu mais queria era ser mecânico lá dentro, e eles conseguiram destruir isso.”
Esperando tratamento
O jovem pode recuperar o movimento das pernas caso receba o tratamento adequado — o que ele espera receber dos médicos do Exército.
“Eles [superiores do Exército] falaram que os médicos iriam aparecer aqui para começar o tratamento e até agora nada. Falaram que ainda essa semana o médico ia aparecer”, disse o soldado.
Para Valdir, este é um exemplo do descaso das Forças Armadas com o seu caso. “Para você ver como o suporte do Exército é grande com os soldados que eles têm lá. Se isso acontece com o que está aparecendo até na televisão, imagina com os outros”, afirmou ao Metrópoles.
Cronologia do caso
- O soldado relatou à polícia que sofreu agressões verbais e psicológicas desde a formatura no Exército, no Arsenal de Guerra de São Paulo do Exército Brasileiro.
- Em 10 de março, quando informou seus superiores que perdeu uma fivela do fardamento, foi levado a uma sala sem iluminação e sem supervisão de testemunhas ou câmeras.
- No local, ele foi forçado a pagar flexões enquanto levava chutes de coturno no peito, “sendo questionado de maneira grosseira, o quanto custava a fivela”, diz o BO.
- No mesmo dia, voltou ao treinamento físico e sentiu gosto de sangue na boca. Ainda assim, o jovem foi instruído a continuar o exercício, o que teria lhe gerado fortes dores de cabeça.
- À noite, foi trancado no quarto. No dia seguinte, foi levado a praticar novas atividades físicas intensas, o que gerou mais dores.
- Com os sintomas, Valdir foi encaminhado ao Hospital do Serviço de Assistência Médica de Barueri (Sameb), sem que seus familiares fossem avisados.
- Após retornar ao quartel, foi obrigado a jantar em três minutos, o que fez com que vomitasse a refeição e, em seguida, sangue “em excesso”.
- Valmir foi encaminhado ao Hospital Sameb novamente e dispensado com a indicação de tirar três dias de repouso. O Exército não teria acatado a recomendação médica.
- No dia seguinte, já em 12 de março, o soldado foi levado ao Hospital Militar de Área de São Paulo (HMASP), no bairro do Cambuci, em São Paulo, onde ficou 18 dias internado.
- Ainda no hospital, Valdir já apresentou perda de movimentos nas pernas. Apesar disso, recebeu alta sob a alegação de risco de contrair alguma bactéria, explicou o soldado.
- “Todos exames foram feitos e o mesmo não possui doenças de base, o que leva a doenças geradas por agressão e maus-tratos”, finaliza o BO.
- O caso foi registrado como maus-tratos no 1º Distrito Policial (DP) de Barueri.
Tortura
O advogado do soldado afirmou ao Metrópoles que Valmir “viveu dias de tortura no alojamento do Exército, o qual se apresentou para cumprir um dever cívico”.
Segundo Eduardo Barbosa, o jovem sofreu agressões físicas e psicológicas, que deixaram “sequelas pro resto da vida”.
O que diz o Exército
Em nota, o Exército afirmou que o soldado apresentou mal-estar durante o expediente do dia 12 de março e foi prontamente encaminhado ao Posto Médico do Arsenal de Guerra de São Paulo. Em seguida, foi transferido para o Serviço de Assistência Médica de Barueri (SAMEB), onde recebeu atendimento, alta e retornou à organização militar.
No dia seguinte, 13 de março, o soldado voltou a apresentar os mesmos sintomas e foi encaminhado ao Hospital Militar de Área de São Paulo (HMASP), onde foi submetido aos exames pertinentes e permaneceu internado até o dia 21 de março. Desde então, encontra-se em recuperação em casa, seguindo o tratamento prescrito pelos médicos responsáveis, afirmou o Exército.
Segundo as Forças Armadas, desde o momento em que foi constatado que ele não se encontrava em plenas condições de saúde, o militar vem recebendo do Exército Brasileiro a devida assistência médica.
“Assim que tomou conhecimento do relato narrado na solicitação, em 17 de abril de 2025, o Arsenal de Guerra de São Paulo instaurou uma sindicância para apurar os fatos. Até o momento, não há qualquer indício de ocorrência de crime no interior daquela Organização Militar. Por fim, o Exército Brasileiro reitera seu compromisso com a observância rigorosa dos preceitos legais, dos princípios éticos e dos valores morais que norteiam a conduta de todos os seus integrantes”, finaliza a nota.