Uso de bebês reborn pode virar caso de polícia; entenda

Nos últimos anos, os chamados bebês reborn — bonecos hiper-realistas feitos à mão para se parecerem com recém-nascidos — têm ganhado cada vez mais popularidade no Brasil.

O que começou como uma vertente artística passou a ser visto por muitos como um recurso terapêutico ou mesmo uma substituição simbólica de filhos.

No entanto, por trás da aparência inofensiva, há um fenômeno que precisa ser analisado com cautela: como o uso indiscriminado desses bonecos pode impactar o ordenamento jurídico, os serviços públicos e até a formulação de políticas sociais?

Advogada criminalista fez alerta

“Não estamos falando apenas de brinquedos. Há registros crescentes de adultos que simulam maternidade real com bebês reborn, registram os bonecos com nomes fictícios, fazem ensaios fotográficos, realizam batizados simbólicos e até solicitam licenças ou benefícios sociais. Algumas pessoas estão indo a unidades de pronto atendimento (UPAs) com os bonecos nos braços, exigindo atendimento médico como se estivessem diante de uma criança viva, o que tem gerado perplexidade entre profissionais de saúde e usuários do SUS”, diz a advogada criminalista Suéllen Paulino.

Esse tipo de conduta, embora muitas vezes associada a quadros psicológicos ou lutos mal elaborados, já está chegando aos legisladores. Projetos de lei começam a surgir em alguns estados e municípios para proibir o atendimento de bonecos reborn em hospitais públicos, buscando proteger os recursos do sistema de saúde e evitar desvio de finalidade. A pergunta que se impõe é: onde está o limite entre o simbólico e o patológico?

Riscos jurídicos: fraude, falsidade ideológica e má-fé

Segundo Suéllen Paulino, do ponto de vista jurídico, o uso desses bonecos pode ultrapassar o campo da fantasia e adentrar a seara da ilicitude em várias situações. Ela citou alguns:

  • Fraudes em pedidos de benefícios sociais, como Bolsa Família, auxílio-maternidade ou isenção de tarifas;
  • Simulações enganosas em redes sociais com finalidades de arrecadação de dinheiro sob pretexto de adoção, luto ou tratamento de “filhos” que não existem;
  • Confecção de documentos falsos, como supostas certidões de nascimento ou carteiras de vacinação, podendo configurar falsidade ideológica (art. 299 do Código Penal).

“Além disso, há a insegurança jurídica gerada quando serviços públicos são acionados em contextos simulados, ocupando vagas e recursos que deveriam estar disponíveis para cidadãos reais, especialmente crianças em situação de vulnerabilidade”, completa.

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Os bebês reborn surgiram na década de 1990, nos Estados Unidos

Deputado quer proibir que bebês reborn  sejam levados a hospitais
Bebê reborn
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Bebê reborn é usado em terapias para pessoas com Alzheimer, depressão, ansiedade e até para mães que perderam filhos

Esra Bilgin/Anadolu Agency via Getty Images

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Os bebês reborn surgiram na década de 1990, nos Estados Unidos

Esra Bilgin/Anadolu Agency via Getty Images

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Deputado quer proibir que bebês reborn sejam levados a hospitais

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Arquivo pessoal

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Bebê reborn

Arquivo pessoal

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Arquivo pessoal

Justiça e ética em debate

Suéllen Paulino diz que o Direito deve se posicionar com urgência sobre o uso desses bonecos. “O ordenamento jurídico brasileiro valoriza a autonomia da vontade e a liberdade individual. Cada pessoa é livre para lidar com suas emoções e afetos da maneira que entender mais adequada, inclusive com uso simbólico de objetos. No entanto, o uso dos bebês reborn não pode se transformar em um escudo para fraudes, desperdício de recursos públicos ou dissimulações capazes de comprometer a integridade do sistema legal e social.”

A advogada esclarece que a ausência de regulação específica deixa margem para abusos. “É urgente que o Legislativo, a Psicologia e o Direito caminhem juntos para delimitar até onde vai o uso lícito e legítimo desses bonecos e a partir de que ponto passa a haver desvio de finalidade, má-fé ou até crime.”

Suéllen Paulino também fez questão de destacar que o debate sobre os bebês reborn não é sobre proibir ou estigmatizar quem encontra afeto neles. “Mas é necessário reconhecer que o avanço desse fenômeno exige respostas jurídicas, éticas e sociais proporcionais à complexidade do tema. Precisamos garantir que a fantasia não se sobreponha à realidade — especialmente em um país onde tantas crianças reais ainda esperam por acolhimento, assistência e justiça”, finaliza.

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