O presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, reiterou nesta segunda-feira (19/5) o compromisso da autoridade monetária em usar todos os instrumentos para tentar levar a inflação para a meta, sem “contemporização”, apesar de eventuais críticas à elevada taxa básica de juros da economia brasileira.
Galípolo participou, nesta manhã, de um evento promovido pelo Goldman Sachs, em São Paulo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), também esteve no encontro, mais cedo.
Em sua última reunião, no dia 7 de maio, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC decidiu aumentar a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, de 14,25% para 14,75% ao ano. É o maior nível dos juros no Brasil em quase 20 anos, desde 2006, e a sexta alta consecutiva.
A taxa básica de juros é o principal instrumento do BC para controlar a inflação. A Selic é utilizada nas negociações de títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional no Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic) e serve de referência para as demais taxas da economia.
Quando o Copom aumenta os juros, o objetivo é conter a demanda aquecida, o que se reflete nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. Assim, taxas mais altas também podem conter a atividade econômica.
Ao reduzir a Selic, por outro lado, a tendência é a de que o crédito fique mais barato, com incentivo à produção e ao consumo, reduzindo o controle da inflação e estimulando a atividade econômica.
“Estamos atentos ao cenário inflacionário. Do que a gente já fez, quase gabaritamos as condições para iniciar uma alta de juros. Isso está justificado por todo esse cenário. É normal você ver críticas em um momento como este. Se você pegar o núcleo de alimentos, a inflação foi de 17% entre janeiro de 2024 e abril de 2025. Está ali bem justificado o porquê da elevação do tamanho que foi feita”, afirmou Galípolo no evento do Goldman Sachs.
“O mercado de trabalho ainda é resiliente e a inflação de serviços ainda é resiliente. É importante olhar menos para a volatilidade de um dado específico de um mês e reunir informações para ver a tendência que está sendo apontada”, explicou o presidente do BC.
Nesta segunda-feira, o BC informou que o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br) mostrou que a economia brasileira cresceu 1,3% no primeiro trimestre. Com isso, o indicador mostrou uma aceleração da atividade econômica do país. No quarto trimestre do ano passado, o IBC-Br avançou um pouco menos, registrando crescimento de 0,5% no período.
Para chegar ao resultado, o BC fez um ajuste sazonal — ou seja, um cálculo que remove as flutuações sazonais de uma série temporal para comparar períodos diferentes. Neste caso, a comparação foi feita com o quatro trimestre de 2024.
“A nossa posição hoje é entender que a taxa de juros migrou para um patamar contracionista. Acho normal que comece essa discussão sobre o prazo de manutenção dos juros em um patamar restritivo”, prosseguiu Galípolo.
“Com as expectativas desancoradas e o cenário a que temos assistido, faz sentido permanecermos com essas taxas de juros em um patamar restritivo por um tempo mais prolongado do que usualmente se costuma praticar.”
BC vai perseguir a meta, diz Galípolo
Ainda segundo Gabriel Galípolo, agora é o momento de a autoridade monetária “falar como vai reagir e não o que vai fazer”.
“O BC vai perseguir a meta de inflação. Nosso mandato é este. Vamos colocar a taxa de juros em um patamar suficiente pelo tempo que for necessário para levar a inflação à meta. Não há qualquer tipo de contemporização”, assegurou Galípolo. “Não há qualquer tipo de flexibilização do ponto de vista da percepção da meta [de inflação] e do nosso horizonte relevante.”
Segundo o Conselho Monetário Nacional (CMN), a meta de inflação no Brasil para este ano é de 3%. Como há um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo, ela será cumprida se ficar entre 1,5% e 4,5%.
Durante sua participação no evento em São Paulo, o presidente do BC reconheceu que, nos últimos meses, houve um descompasso entre as políticas monetárias adotadas pelo Brasil e por outros países do mundo – e isso se deve às especificidades internas de cada região.
“É normal que, a partir da dissipação dos choques externos que nós vivenciamos, comecemos a assistir essa quebra na sincronia que existia nas políticas monetárias. O caso do Brasil é evidente de quem foi no caminho distinto em relação às demais economias, muito em função do dinamismo doméstico. A resposta da autoridade monetária é ao dinamismo da economia doméstica”, disse Galípolo.
“Uma preocupação [do mercado] é a de que, a partir de uma desaceleração da economia, você poderia ter uma reação do fiscal para compensar essa desaceleração. Aí entra um pouco identificar que botões teriam disponíveis para apertar no fiscal, o quanto cada uma das políticas dá conta ou não de compensar ou mitigar os canais de transmissão da política monetária”, destacou o chefe do BC.
“Como você reage ou coloca a taxa de juros em um patamar ainda mais contracionista para reagir a uma política que ainda não está ali? Esta é a dança, que não é simples, que o BC tem de fazer.”
Tarifas no radar
Durante o evento do Goldman Sachs em São Paulo, Gabriel Galípolo também falou sobre o impacto das tarifas comerciais anunciadas pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre as demais economias do mundo.
Segundo o chefe do BC, o cenário global ainda é marcado por muita incerteza.
“As dificuldades existem hoje para poder mensurar, seja porque não temos clareza sobre o resultado das tarifas ao final das negociações, seja porque, uma vez definidas, existem muitas dúvidas sobre sua viabilidade”, explicou. “Do ponto de vista prático, aplicar essas tarifas não é simples.”
Para Galípolo, “tudo isso introduz uma grande complexidade de entender o que vai ser implementado, como estimar a implementação disso e quais serão os resultados em função do que já foi gerado de incerteza e de dúvida”.
“Isso amplia muito as tensões que já são comuns em comunicações de autoridade monetária”, admitiu.
“A gente tem tido um processo de comunicação que conseguiu durar ao longo do tempo porque tivemos a humildade de reconhecer um ambiente que demanda essa cautela e flexibilidade. Para o Brasil, os principais canais de transmissão são as commodities e o câmbio”, concluiu Galípolo.