Discriminação racial: Brasil ainda escolhe quem merece respeito

Rio de Janeiro – No Brasil, a cor da pele ainda decide o tratamento que alguém recebe. Uma pesquisa divulgada nesta terça-feira (20), com apoio do Ministério da Igualdade Racial (MIR), escancarou uma realidade dolorosa: 84% da população preta já sofreu discriminação racial.

Feita com base na escala de discriminação cotidiana, a pesquisa ouviu mais de duas mil pessoas de diferentes perfis e regiões do país. Entre os relatos, situações comuns como ser seguido em lojas, receber atendimento pior e até ser tratado com menos respeito. Para quem é branco, isso é exceção. Para quem é preto, é rotina.


Racismo em série

O levantamento, conduzido pelas organizações Vital Strategies Brasil e Umane, em parceria com a UFPel e o Instituto Devive, expôs mais que números — mostrou o país real. Um Brasil onde pretos recebem 2,7 vezes mais tiros, vivem nas favelas, têm menos empregos, menos analgesia, menos respeito.

E quando são mulheres pretas, o abismo é ainda maior: 72% afirmam sofrer mais de um tipo de preconceito — seja por raça, gênero, classe, aparência ou tudo junto. “Brutal desigualdade racial”, define Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies, sem meias palavras.


A rotina da humilhação

Os dados são cristalinos. Veja alguns recortes da pesquisa:

  • 57% dos pretos recebem atendimento pior em lojas e restaurantes.
  • 49,5% são tratados com menos respeito.
  • 21,3% são seguidos em lojas – sim, ainda em 2025.
  • Entre brancos, os mesmos indicadores ficam em 7% a 13%.

E mais: 84% dos pretos disseram que a discriminação é diretamente por cor da pele. Já entre os brancos, só 8,3% relataram qualquer tipo de preconceito. A matemática da exclusão nunca falha — e o Brasil insiste em ignorá-la.


Racismo que adoece

A pesquisa vai além do constrangimento: aponta como a discriminação corrói a vida das pessoas. Segundo os especialistas, os impactos atingem a saúde mental, a autoestima, o bem-estar, o acesso ao trabalho e ao sistema de saúde.

Pedro de Paula lembra: “A gente sabe que tem muito mais violência obstétrica com mulheres negras do que com mulheres brancas. Tem menos dispensação de analgésicos, menos acesso e menos cuidado.” É racismo até no parto.


O país que sangra em silêncio

O Brasil que prende mais, que mata mais e que humilha mais — sempre os mesmos. Dados do Atlas da Violência mostram que pretos têm quase 3 vezes mais chance de serem assassinados. Segundo o IBGE, são também maioria nas favelas (72,9%) e entre os desempregados.

Mas o que impressiona não é o número. É a naturalização. A aceitação de que essas violências são parte da paisagem. Como se ser preto no Brasil fosse sinônimo de resistência obrigatória — da infância à morte.


Políticas públicas ou paliativos?

A pesquisa busca ser ponto de partida para políticas públicas mais firmes. Os organizadores alertam: não dá pra falar em saúde, educação, emprego ou segurança sem enfrentar o racismo estrutural que atravessa tudo isso.

Qualquer organização que atua na área social precisa assumir a luta contra essa estrutura absolutamente desigual”, reforça Pedro de Paula. Só que até agora, o que se vê são gestos tímidos diante de um problema que grita.


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