STF mantém depoimento de comandante da Marinha sobre tentativa de golpe

Brasília – O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou o pedido de dispensa feito pelo atual comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, e manteve seu depoimento marcado para esta sexta-feira (23 de maio) às 14h, na ação penal que investiga a cúpula militar envolvida na tentativa de golpe bolsonarista. Olsen foi indicado como testemunha de Almir Garnier, ex-comandante da Marinha durante o governo Jair Bolsonaro e hoje réu no processo.

Em ofício encaminhado ao STF, Olsen afirmou que “desconhece os fatos objeto de apreciação” e tentou se esquivar do compromisso. A estratégia foi lida como mais uma tentativa de blindagem corporativa dentro das Forças Armadas, que seguem resistindo à responsabilização plena pelos bastidores do golpe fracassado de 2022.

A decisão de Moraes, no entanto, reforça a linha adotada pelo Supremo: não haverá proteção institucional para militares envolvidos nas articulações antidemocráticas do bolsonarismo. O depoimento é considerado estratégico pela acusação, já que Garnier é apontado como um dos principais nomes do chamado Núcleo 1 da trama golpista, responsável por tentar viabilizar apoio militar a uma ruptura institucional.

O ex-comandante da Marinha é acusado de colocar a força naval à disposição de Bolsonaro caso fosse decretado um estado de sítio ou uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) — instrumentos que o ex-presidente cogitou usar para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, eleito democraticamente em outubro de 2022.

Além de Garnier, o grupo é formado por:

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da República e chefe da conspiração;
  • Walter Braga Netto, general da reserva e vice na chapa derrotada;
  • General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
  • Alexandre Ramagem, deputado e ex-diretor da Abin;
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF;
  • Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa e general do Exército;
  • Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Todos respondem por tentativa de golpe, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa e outros crimes previstos no Código Penal. A oitiva de Olsen deve esclarecer se havia mobilização real de tropas da Marinha para sustentar a aventura golpista, mesmo após a derrota eleitoral do ex-capitão.

A ofensiva contra a democracia não se deu por acaso. Como revelou a Polícia Federal em inquéritos já tornados públicos, o golpe de 2022 foi meticulosamente planejado em reuniões paralelas, com apoio de setores das Forças Armadas e aval de Bolsonaro. O envolvimento de militares da ativa e da reserva é a peça central que distingue o caso brasileiro de outras tentativas autoritárias recentes.

O STF vem adotando uma postura firme diante da tentativa de ruptura institucional, mas enfrenta resistência tanto no meio militar quanto no Congresso, onde parlamentares bolsonaristas e figuras do centrão seguem tentando relativizar a gravidade do caso ou frear investigações.

A manutenção do depoimento de Olsen é uma resposta direta a essa pressão. Moraes sinaliza que, mesmo diante das tentativas de obstrução, os militares não estarão acima da lei — especialmente quando flertam com o autoritarismo.

Para além das questões jurídicas, o episódio reacende o debate sobre o papel das Forças Armadas na política brasileira. Desde a redemocratização, os militares jamais foram responsabilizados por seus crimes durante a ditadura de 1964, e essa impunidade histórica tem servido de terreno fértil para novas aventuras golpistas.

A presença de figuras como Garnier e Heleno entre os réus da ação penal revela que o bolsonarismo não foi um surto isolado, mas expressão de uma cultura autoritária entranhada nas instituições de farda.

Enquanto isso, Bolsonaro segue manobrando politicamente, mesmo inelegível, apostando no caos e na fidelidade de sua base radical. O depoimento de Olsen pode não mudar os rumos do processo sozinho, mas é mais um passo para desmantelar o silêncio cúmplice dentro da hierarquia militar.

O Carioca esclarece

Quem é Marcos Sampaio Olsen?
É o atual comandante da Marinha, nomeado por Lula em 2023. Foi indicado como testemunha de Almir Garnier na ação penal que investiga a tentativa de golpe de 2022.

Qual o papel de Almir Garnier na tentativa de golpe?
Garnier é acusado de colocar a Marinha à disposição de Bolsonaro caso ele decidisse decretar estado de sítio ou GLO para impedir a posse de Lula.

O que o depoimento de Olsen pode esclarecer?
Se houve conversas internas ou movimentações de tropas da Marinha ligadas à conspiração golpista. O STF quer saber se a força naval também foi mobilizada no plano.

Como isso afeta a democracia no Brasil?
Mostra que as Forças Armadas seguem com autonomia perigosa e pouca accountability. A responsabilização dos militares é essencial para evitar novas rupturas institucionais.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.