Casos recentes trazem à tona o luto perinatal no Brasil

Casos recentes de perda gestacional em estágio avançado, como os vividos nesta semana pela apresentadora Tati Machado e a atriz Micheli Machado, que se somam à perda enfrentada recentemente pela cantora Lexa, trouxeram à tona um tema ainda pouco debatido: o luto perinatal. A morte de um bebê durante a gestação ou nos primeiros dias de vida é uma experiência devastadora que impacta profundamente pais, familiares e todo o núcleo de apoio – mas que ainda encontra questionamentos sociais em relação ao luto vivido por essas mães.

O Ministério da saúde define morte fetal como aquela que ocorre a partir da 20ª semana de gestação ou com peso igual ou superior a 500g. Já o luto perinatal refere-se à dor da perda gestacional (incluindo abortos espontâneos) ou neonatal (durante os primeiros 28 dias de vida).

Especialista em luto e saúde mental materna, a psicóloga Daniela Bittar, uma das organizadoras do Grupo Colcha e colunista do portal Além da Perda, explica que o luto perinatal é muitas vezes invisibilizado pela sociedade, o que intensifica ainda mais o sofrimento de quem passa por ele. “O luto não é nosso inimigo. Ele é o amigo que vai abraçar a possibilidade dessa transformação. Uma mãe se mistura visceralmente com o filho durante a gestação. A existência dele se consolida nela, mesmo que ele não nasça com vida”, afirma Daniela.

Segundo ela, a dor da perda é profunda e permanente. “Não há um tempo específico para o luto acabar – ele caminha junto com o amor por aquele filho”, ressalta. Daniela destaca que frases como “ela é nova, vai ter outros filhos” ou “foi melhor assim” não devem ser ditas. Pelo contrário, o acolhimento, a escuta e o reconhecimento dessa criança na história da família são fundamentais. “A mãe quer falar sobre o filho. É preciso chamá-lo pelo nome, lembrar das datas importantes, incluí-lo na árvore genealógica. Quando a sociedade silencia essa dor ou tenta substituí-la, ela fere ainda mais quem já está ferido”, reforça a psicóloga.

Além da dor, muitas mães enfrentam sentimentos de culpa, alimentados por julgamentos externos e por pressões sociais. A busca por causas para a perda pode levar a questionamentos dolorosos: “E se eu tivesse feito diferente?” – uma tentativa de racionalizar o inaceitável. Para Daniela, nesses casos, o apoio psicológico é essencial. Em situações mais severas, a dor pode ser acompanhada de traumas que exigem tratamento especializado.

Apesar da invisibilidade social, iniciativas como o Grupo Colcha e o portal Além da Perda, criado pelo Grupo Zelo, têm sido espaços seguros de acolhimento e informação. Ali, mães e famílias encontram escuta ativa, relatos reais e conteúdo produzido por especialistas.

Neste mês de maio, em alusão ao Dia das Mães, o Grupo Zelo e o podcast Bucket List promoveram uma live especial sobre o luto perinatal, reunindo relatos comoventes de mulheres que enfrentaram a perda de seus filhos. A transmissão, disponível no canal do Grupo Zelo no YouTube, gerou grande comoção e abriu espaço para uma conversa sobre o tema. “O processo de luto é individual. Não se trata de esquecer, mas de seguir vivendo com aquela dor transformada em saudade. É preciso dar espaço à dor e também à possibilidade de novos sonhos, mesmo que isso leve tempo”, afirma Daniela.

A psicóloga ainda observa que, à medida que figuras públicas compartilham suas experiências, cresce a visibilidade e a legitimidade do tema. “Reconhecer o luto perinatal como legítimo é um passo essencial para garantir que nenhuma mãe precise sofrer em silêncio”, conclui.

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