Brasília – CBF troca comando em eleição simbólica
Samir Xaud é o novo presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A eleição deste domingo (25 de maio) consagrou a única chapa inscrita, batizada com ironia institucional de “Futebol para Todos: Transparência, Inclusão e Modernização”.
Com 103 votos de 46 eleitores (sim, você leu certo), Xaud, de apenas 41 anos, foi conduzido ao topo do futebol nacional como quem herda um clube privado — e não uma entidade que deveria servir ao interesse público de um país inteiro.
A votação, realizada presencialmente na sede da CBF no Rio de Janeiro, não contou com concorrência. Nenhuma outra candidatura resistiu ao bloco federativo montado nos bastidores. O resultado foi previsível, mas não menos revelador: o futebol brasileiro continua sendo gerido como uma confraria fechada, sob o verniz da “governança”.

Créditos: Rafael Ribeiro/CBF
Quem é Samir Xaud?
Pouco conhecido do grande público, Samir Xaud nasceu em Boa Vista, Roraima, e vinha exercendo cargos internos na CBF. Sua chapa foi sustentada por um conglomerado de 27 federações estaduais, incluindo Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Minas Gerais, além de clubes como Botafogo, Grêmio, Palmeiras, Vasco, Paysandu e Criciúma.
Mas a unanimidade esconde o fato de que a “eleição” teve cara de aclamação. Nada de debates abertos, campanhas transparentes ou ampla participação dos clubes e da sociedade. Reinaldo Carneiro Bastos, presidente da Federação Paulista, chegou a ensaiar uma candidatura, mas recuou. O campo estava marcado — e muito bem irrigado.
“Nova” CBF: discurso velho, promessas recicladas
Em seu primeiro discurso, Xaud repetiu a ladainha de sempre: “modernização, inclusão, transparência”. Palavras bonitas que já vimos serem usadas por ex-presidentes como Marco Polo Del Nero e Ricardo Teixeira, ambos lembrados mais por escândalos do que por reformas.
Xaud prometeu um calendário mais racional, com no máximo 11 datas para os campeonatos estaduais. Tentou agradar gregos e troianos ao dizer que valoriza os estaduais, ao mesmo tempo em que prepara seu esvaziamento técnico e financeiro — um velho truque de dirigentes que querem fazer o futebol caber na lógica da televisão.
A liga que não vem e o fair play de mentira
Outro cavalo de batalha é a prometida criação da liga nacional de clubes. Xaud diz que irá liderar esse processo com “as portas da CBF abertas”. Mas o histórico da entidade é o oposto: sabotagens sucessivas a qualquer tentativa de autonomia dos clubes.
O tal “fair play financeiro” também volta à cena, agora como panfleto de campanha. Foi anunciada a criação de um grupo de trabalho — a versão cartorial do “empurrar com a barriga”. A promessa de uma CBF que “debate com especialistas” soa como piada num país onde os clubes grandes seguem endividados até o pescoço e os pequenos mendigam visibilidade.
Diversidade para inglês ver
A chapa de Xaud inclui Michelle Ramalho Cardoso, primeira mulher vice-presidente da história da CBF. Uma conquista simbólica, mas que escancara o anacronismo da entidade: em pleno 2025, a CBF ainda celebra o óbvio como se fosse revolução.
Xaud falou em “combate ao racismo”, em “retomar a Taça Indígena” e “educação climática nos gramados” — enquanto a CBF continua alheia a denúncias de injúrias raciais em campeonatos nacionais e indiferente à destruição ambiental patrocinada por patrocinadores e obras superfaturadas.
O Norte existe — mas a CBF continua no Sudeste
O novo presidente fez questão de exaltar sua origem nortista: “Essa nova CBF nasce com a alma do Norte”, disse. Bonito. Mas será que, além do discurso, o futebol nortista terá espaço real no calendário, no orçamento e na transmissão?
Se o passado for referência, a resposta é não. O eixo Rio-São Paulo segue dominando a estrutura, os contratos e a visibilidade.
O Carioca esclarece (FAQ)
Quem é Samir Xaud?
Um dirigente de Roraima, ex-braço administrativo da CBF, que assumiu a presidência com o apoio das federações e sem enfrentar concorrência real.
Por que a eleição da CBF foi com chapa única?
Porque o sistema eleitoral da CBF é montado para proteger o status quo: poucas vagas, alto controle federativo e nenhuma exigência de transparência pública.
Quais as consequências da eleição de Xaud?
A continuidade de uma estrutura pouco democrática, blindada por interesses federativos e com promessas recicladas que dificilmente se materializarão.
Como isso afeta a democracia no esporte?
A CBF, mesmo sendo privada, regula um bem público — o futebol. A falta de eleições abertas e participação ampla fere os princípios democráticos e perpetua a concentração de poder.