Mônaco, 8 de junho de 2025 – No encerramento do Fórum de Economia e Finanças Azuis, realizado neste domingo no principado de Mônaco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um alerta direto à comunidade internacional: “Ou agimos ou o planeta corre risco”. Em pleno Dia Mundial dos Oceanos, o líder brasileiro condenou a negligência dos países ricos com o financiamento de ações sustentáveis e apresentou propostas concretas para transformar o discurso em ação global coordenada.
Lula ressaltou que a economia dos oceanos já movimenta mais de 2,6 trilhões de dólares por ano e representa mais de 80% do comércio internacional, mas, paradoxalmente, recebe um dos menores volumes de financiamento dentro da Agenda 2030 das Nações Unidas. O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14 (ODS 14), voltado à conservação marinha, sofre com um déficit anual estimado em US$ 150 bilhões, o que compromete sua efetivação.
Brasil cobra coerência e lidera esforços multilaterais
Com quase 8 mil quilômetros de litoral, o Brasil assume protagonismo nos debates sobre os oceanos. Segundo Lula, o país atua como agente diplomático e técnico em fóruns internacionais e tenta preencher o vácuo deixado pelos países desenvolvidos.
Ao citar a realização da COP30 em Belém, marcada para o fim do ano, o presidente reforçou que a crise climática exige compromissos concretos, não promessas vazias. “No ano passado, saímos da COP de Baku com resultados aquém do esperado. Agora estamos construindo o ‘mapa do caminho Baku-Belém’, junto ao Azerbaijão, para cobrar metas ambiciosas e factíveis”, afirmou.
Ele também denunciou a disparidade na alocação de recursos globais: enquanto a assistência oficial ao desenvolvimento caiu 7% em 2024, os gastos militares dos países ricos cresceram 9,4%. “Não falta dinheiro. Falta é vontade política”, provocou.
Crise ecológica atinge mais os países do Sul Global
Lula alertou que a inação global penaliza sobretudo os países do Sul Global. “Dos 33 países da América Latina e Caribe, 23 possuem mais território marítimo do que terrestre. A África tem 13 milhões de quilômetros quadrados de território marítimo – área equivalente ao território combinado dos EUA e da União Europeia”, destacou.
Para ele, fortalecer a economia azul nesses países é uma saída estratégica para aliar crescimento sustentável, combate à desigualdade e preservação ambiental. O tema, inclusive, foi uma das prioridades da presidência brasileira no G20, exercida em 2024.
Reformar as instituições e criar mecanismos eficazes
Lula da Silva também defendeu mudanças profundas nas instituições financeiras multilaterais, acusadas de operar segundo lógicas obsoletas e excludentes. “Precisamos de bancos multilaterais melhores, maiores e mais eficazes”, declarou. Entre as propostas apresentadas estão:
- Criação de mecanismos de troca de dívida por desenvolvimento sustentável;
- Ampliação da emissão de Direitos Especiais de Saque (SDRs);
- Financiamento climático com metas claras e vinculantes.
Ele citou como exemplo positivo a Organização Marítima Internacional, que aprovou metas para zerar as emissões de carbono na navegação até 2050, o que deve impulsionar a demanda por energias renováveis no setor naval.
Compromisso doméstico: o “dever de casa” do Brasil
Lula aproveitou o palco internacional para mostrar o que o Brasil tem feito internamente. Entre os programas destacados:
- Bolsa Verde, que transfere renda a mais de 12 mil famílias que preservam áreas marinhas protegidas;
- Carteira de US$ 70 milhões no BNDES, voltada exclusivamente para projetos de economia azul;
- Investimentos em planejamento espacial marinho, conservação costeira, recuperação de manguezais e recifes de coral, e descarbonização da frota naval e infraestrutura portuária.
“Estamos investindo em pesca sustentável e na gestão de recursos hídricos. Mas o que fazemos sozinhos não basta. Precisamos de um mutirão global, como dizem os povos originários – esforço coletivo em prol de um bem comum”, concluiu.
BRICS e financiamento climático no centro da agenda
A Cúpula do BRICS, que ocorrerá no Rio de Janeiro em julho, será outro espaço estratégico para avançar nas propostas. O Novo Banco de Desenvolvimento, controlado pelo bloco, já destinou mais de US$ 2,6 bilhões a projetos de água e saneamento, sinalizando um potencial de financiamento climático alternativo às estruturas dominadas por países do Norte.
Lula reafirmou que, diante da crise sistêmica que ameaça a sobrevivência dos oceanos e da humanidade, o Brasil continuará a pressionar por ações reais, articuladas e justas: “O planeta não aguenta mais promessas não cumpridas. Não há saída isolada para desafios que exigem ação coletiva”.
O Carioca Esclarece
Por que Lula da Silva escolheu falar sobre economia azul em Mônaco?
Mônaco sedia um dos fóruns mais estratégicos sobre economia e finanças azuis no mundo. O evento antecede a Conferência da ONU sobre os Oceanos e funciona como ponte entre política ambiental e mecanismos de financiamento internacional, temas centrais da agenda de Lula da Silva.
Qual a diferença entre economia azul e economia verde?
A economia azul foca no uso sustentável dos recursos marinhos e costeiros – como pesca, transporte naval e turismo –, enquanto a economia verde abrange todas as atividades econômicas voltadas à sustentabilidade ambiental no conjunto do território, incluindo agricultura, energia e transporte terrestre.
O que significa “troca de dívida por desenvolvimento sustentável”?
É um mecanismo pelo qual credores internacionais perdoam parte das dívidas de países em desenvolvimento em troca de investimentos comprovados em projetos ambientais, como preservação marinha, reflorestamento ou energias limpas. É uma proposta defendida pelo Brasil para aliviar dívidas históricas e financiar ações urgentes.