O medo de engravidar é uma experiência comum para muitas mulheres. No entanto, quando esse medo se intensifica e se torna irracional, configura-se um transtorno conhecido como tocofobia. Ela é caracterizada pelo medo intenso da gravidez e do parto e pode impactar significativamente a vida de quem convive com essa condição. Enquanto algumas conseguem superar esse temor, para outras, ele se torna um fator determinante na decisão de não ter filhos.
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“Meu medo me impediu de viver minha sexualidade plenamente”
A designer Karina Gonsalves Jorge sempre soube que não queria engravidar. Seu medo surgiu na adolescência, quando a gravidez era retratada como um grande risco para o futuro.
“As mudanças corporais, a dor e o comprometimento a longo prazo com um filho sempre me assustaram”, diz. Mas não era só isso: o receio de engravidar afetava sua vida de forma direta. “Durante muito tempo, não conseguia aproveitar minha vida sexual. Mesmo usando métodos contraceptivos, não me sentia segura”, conta.
Com a maturidade, Karina percebeu que seu medo da gravidez se misturava a uma certeza mais profunda: ela simplesmente não queria ser mãe. “A gravidez acaba em nove meses, mas a maternidade dura para sempre. Não quero expor meu corpo ao estresse da gestação, e também tenho medo da responsabilidade de criar um filho sozinha.”
A decisão de não ter filhos trouxe julgamentos, mas hoje ela se sente em paz. A cobrança, assegura, diminuiu, embora ainda existe uma pressão social para que a mulher cumpra esse papel.
A designer optou pela salpingectomia, cirurgia ginecológica de remoção das trompas de Falópio. Ela conta que fez o procedimento para evitar a gravidez. A decisão foi tomada com acompanhamento médico, devido à aversão a anticoncepcionais e DIU. “Aos 34 anos, achei que fosse a hora certa, o que a médica que me operou confirmou”, explica.
Muitas mulheres possuem medo de ver um teste positivo
“Não me sentia preparada para ver um teste positivo”
Já a jornalista Carol Rodrigues percebeu que tinha medo de engravidar quando ficou noiva. A pressão social para casar e ter filhos despertou nela uma ansiedade intensa.
“A minha vontade era usar todos os métodos contraceptivos juntos para evitar a gravidez. Sempre fui muito rigorosa com o uso do anticoncepcional e do preservativo para não correr o risco”, recorda.
O medo de Carol não surgiu de forma repentina. Durante anos de terapia, ela conseguiu identificar um dos principais gatilhos: a história da própria mãe. “Ela engravidou sem planejar, em uma época em que isso era um escândalo. Desde cedo, me ensinou que eu precisava me cuidar, porque uma gravidez atrapalharia minha vida. Isso criou um bloqueio em mim“, pontua.
O receio de ver um teste positivo só aumentou quando sua irmã engravidou. Ela, entretanto, pensava que nunca estaria pronta.
Com o tempo, e muita terapia, Carol conseguiu ressignificar esse medo. Hoje, cogita até congelar óvulos para ter a opção de ser mãe no futuro. No entanto, a pressão social nunca deixou de existir. “Já ouvi que precisava ter um filho para cuidar de mim na velhice. Acho isso um absurdo.”
Para outras mulheres que enfrentam a tocofobia, ela deixa um conselho: “Buscar ajuda é essencial para entender se você realmente não quer ter filhos ou se é a fobia que está te impedindo de refletir sobre isso.”
A maternidade é para vida inteira, pondera uma das mulheres que optou por não engravidar após enfrentar a doença
Quando o medo se torna um problema?
Segundo a ginecologista e obstetra Tatianna Ribeiro, o medo da gravidez e do parto pode ser tão intenso que leva algumas mulheres a evitarem relações sexuais ou até descartarem a maternidade, mesmo quando desejam ter filhos.
“A tocofobia pode causar crises de ansiedade, insônia, taquicardia e até tremores ao ver relatos de parto ou ficar perto de bebês”, explica a especialista.
Entenda mais sobre a tocofobia
- As causas variam. Algumas mulheres desenvolvem o medo a partir de experiências traumáticas, como partos difíceis ou relatos negativos. Outras sofrem com a pressão social ou têm transtornos de ansiedade pré-existentes.
- O tratamento existe, mas exige acompanhamento profissional. Psicoterapia, apoio ginecológico e, em alguns casos, medicação podem ser necessários.
- A psicóloga Andressa Taketa explica que o acompanhamento psicológico é fundamental. “A terapia proporciona um espaço seguro para a ressignificação do medo, permitindo identificar as origens específicas da fobia, sejam experiências pessoais, traumas ou informações distorcidas.”
- Taketa ainda reforça que a terapia é uma recuperação da autonomia para as mulheres. “O acompanhamento psicológico, nesse contexto, não busca apenas “curar” a tocofobia, mas principalmente oferecer às mulheres a possibilidade de reconexão com seus corpos, desejos e escolhas autênticas, seja qual for sua decisão em relação à maternidade”.
Por fim, Karina reflete que a terapia foi essencial para lidar com o transtorno. “Com ajuda profissional, aprendi a diferenciar medo irracional de decisão consciente. Hoje, sei que minha escolha de não ser mãe não vem de um trauma, mas sim de um desejo legítimo”.