O Ministério do Esporte vai cobrar um “pedágio” para liberar emendas parlamentares. A pasta ficará com 2% do valor direcionado por deputados e senadores para projetos na área, sob o pretexto de que o dinheiro servirá para administrar e fiscalizar os repasses. O que significa que R$ 54 milhões que deveriam bancar eventos esportivos serão desviados para despesas administrativas.
É a primeira vez que isso ocorre, segundo quatro especialistas em orçamento ouvidos pela coluna, que consideraram a medida despropositada. Eles argumentam que já existe, no orçamento da pasta, verba destinada a custeio.
“Não faz sentido colocar dentro de uma despesa finalística (construção de uma quadra de esporte, um curso de futebol…) um percentual para despesa administrativa. É como se o parlamentar estivesse contratando o ministério para prestar um serviço”, explica um consultor.
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Desde que o Centrão assumiu o ministério, com André Fufuca (PP-MA), o volume de emendas direcionadas à pasta explodiu.
Em 2024, o orçamento do ministério passou de R$ 607,8 milhões para R$ 1,4 bilhão graças às emendas. Em 2025, parlamentares direcionaram R$ 2,29 bilhões, quase o dobro do valor anterior.
Inicialmente, o pedágio era de 4%. O ministério, contudo, alterou a portaria que instituiu a cobrança e reduziu o valor para 2%. Ou seja, R$ 54 milhões poderão ficar retidos pela pasta, em vez de serem destinados a projetos na área do esporte. O ato foi assinado pelo próprio ministro.
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Lula e o ministro do Esporte, André Fufuca (PP-MA)
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André Fufuca assumiu no lugar de Ana Moser
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André Fufuca assume Ministério do Esporte
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Ana Moser, ex-ministra do Esporte
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A portaria prevê que a cobrança incide sobre todos os tipos de emendas — parlamentares individuais, de bancada ou de comissão.
“Esta Portaria dispõe sobre a aplicação da dedução de percentual do valor das transferências financeiras oriundas de emendas parlamentares ao Ministério do Esporte, com vistas ao custeio dos serviços administrativos necessários à celebração, execução, acompanhamento e fiscalização dos instrumentos pactuados.” Portaria 45/2025
O ministério afirma que usará o valor arrecadado com o pedágio para:
Contratação de estudos para a melhoria e evolução dos programas e das políticas públicas;
Contratação de consultoria para aperfeiçoamento de processos de trabalho;
Contratação de pessoal técnico qualificado;
E, até mesmo, “atividades de fiscalização” dos projetos bancados com recursos públicos.
Na portaria, o ministério informa que o valor do pedágio será reavaliado anualmente, “se necessário, com base nos custos efetivos de operacionalização, volume de propostas, capacidade institucional/operacional e impacto orçamentário”.
Pedágio será cobrado já no momento do empenho
Procurado, o ministério informou que “a retenção dos 2% se dará somente sobre os valores relativos às emendas de bancada e emendas de comissão, destinadas à realização de eventos e projetos esportivos”. O que soma aproximadamente R$ 18,4 milhões retidos. A portaria, contudo, menciona todos os tipos de emendas.
Art. 2º Para o exercício de 2025, o percentual de dedução será de 2% (dois por cento) sobre o valor total das transferências financeiras oriundas de emendas parlamentares individuais, de bancada ou de comissão, operacionalizadas diretamente pelo Ministério do Esporte. Portaria 45/2025
A pasta justifica que em 2024, cerca de 19 mil propostas começaram a tramitar, além das que já estão em acompanhamento ou prestação de contas nos últimos cinco anos e que “não dispõe de corpo técnico capaz de dar vazão com a celeridade necessária a esse volume de processos, o que justifica a utilização do mecanismo previsto na Portaria 45, mesmo recurso já utilizado pela CAIXA para acompanhar propostas executadas nos contratos com a instituição financeira federal.”
No caso da Caixa, contudo, o ministério repassa valores para fiscalização das obras e não para custeio.
Segundo o ministério, o percentual de 2% será retido no momento do empenho “para permitir o acompanhamento adequado do processo, a contratação de pessoal”. O empenho é uma fase anterior ao pagamento da emenda. Funciona como um compromisso de que o valor será liberado adiante.
A mesma iniciativa pode ser seguida por outros ministérios num valor até 4%. A coluna apurou que a maioria deve estabelecer os mesmos 2%.
Ministro assumiu vaga com demissão de Ana Moser
André Fufuca assumiu o Ministério do Esporte numa tentativa do governo Lula de atender ao Centrão e aumentar sua base de apoio no Congresso. A ex-jogadora da seleção de vôlei disse à época que sua demissão “foi uma decisão política e representa um abandono do esporte no país”.
O ingresso do PP no governo, contudo, não se traduziu em apoio para o petista. O PP e o União Brasil, que também tem ministérios, se uniram numa federação e irão atuar juntos nas eleições de 2026. A chance de apoio a reeleição de Lula nessa composição é nula, uma vez que o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), é o maior opositor ao petista.