Vídeo em canal do YouTube desmascarou falsa astronauta brasileira

Desde 2022, a mineira Laysa Peixoto, de 22 anos, compartilhava nas redes sociais uma trajetória até então impressionante: dizia ser astronauta da Nasa, cursar mestrado em física quântica nos Estados Unidos e ter sido aprovada em universidades de prestígio, como Harvard e MIT. Na última semana, a jovem anunciou que seria a primeira brasileira a viajar ao espaço em uma missão inaugural da Titans Space, empresa privada do mercado aeroespacial, marcada para 2029.

“Bati o olho e vi que tinha algo errado. Não fazia sentido”, conta Pedro Pallotta, do Space Orbit, ao Metrópoles.

5 imagensOs cursos de astronauta que Laysa alegava ter feito e compartilhava nas redes foram identificados como cursos educacionais, sem valor nenhum para a formação de profissionaisLaysa nem chegou a terminar a faculdade de física na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)A Nasa informou ao Metrópoles que a mineira não tem vínculos com a agência espacialFechar modal.1 de 5

Laysa Peixoto, falsa astronauta

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Os cursos de astronauta que Laysa alegava ter feito e compartilhava nas redes foram identificados como cursos educacionais, sem valor nenhum para a formação de profissionais

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Laysa nem chegou a terminar a faculdade de física na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

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A Nasa informou ao Metrópoles que a mineira não tem vínculos com a agência espacial

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Ele e a equipe por trás do canal do YouTube especializado em temas aeroespaciais descobriram que, na verdade, Laysa nem chegou a terminar a faculdade de física na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O canal confirmou que a jovem foi desligada da instituição depois que deixou de se matricular para o segundo período letivo de 2023 do curso de física.

“Tudo isso é mentira. Tudo o que ela fala ou é invenção ou um exagero grotesco. Foi tão escrachado que nós, mesmo sendo um canal de divulgação científica, decidimos romper nossa linha editorial — que evita comentar sobre pessoas — para fazer essa denúncia. Por respeito à ciência, ao espaço e às pessoas que realmente lutam para chegar lá”, conta Pedro.

O vídeo foi publicado na última sexta-feira (6/6).

De acordo com o dono do canal, a jovem tenta se posicionar como porta-voz da comunidade científica. “Isso desmerece o trabalho de tantas pessoas, que, todos os dias, se dedicam a tornar a ciência mais acessível. É um desserviço para a sociedade. Criou-se uma falsa esperança nas pessoas, com a ideia de que teríamos uma astronauta brasileira na Nasa, quando isso não corresponde à realidade. Eu repudio totalmente esse tipo de ação”, ressaltou Pedro.

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A análise do Space Orbit levou em consideração informações sobre Laysa Peixoto, a Titans Space Industries, os projetos da Nasa (MADSS e AquaMoon) e a Elliptica Foundation, empresa que teria sido fundada por Laysa para promover cursos gratuitos.

Foram examinados artigos jornalísticos, sites institucionais e páginas oficiais. A ausência de fontes primárias da Nasa e a escassa presença da Elliptica Foundation em registros públicos foram elementos centrais na investigação.

O relatório feito pelo canal com todas as descobertas pode ser acessado aqui.

Fotos de uniforme feitas em curso de R$ 6 mil

Por meio das redes, a moradora de Contagem (MG) alega ter formação em física teórica e computação quântica. Ela teria, inclusive, recebido a Medalha de Honra da Nasa pela descoberta original do asteroide 2021 PS59, apesar de não mostrar documentos que comprovem tal informação.

Além disso, em 2023, Laysa teria sido selecionada para a lista Forbes Under 30, na categoria Ciência e Educação. “Entre conquistas marcantes e lutos silenciosos, decidi que nada poderia me parar, mesmo no ano mais desafiador da minha vida. Foi assim que as oportunidades me encontraram, afinal, para alcançar metas nunca antes alcançadas, são necessários esforços nunca antes feitos”, escreveu a mineira em agradecimento à revista.

De acordo com Pedro, do Space Orbit, os cursos de astronauta que Laysa alegava ter feito e compartilhava nas redes foram identificados como cursos educacionais, sem valor nenhum para a formação de profissionais, sendo mais voltados para “divulgação científica e incentivo”.

Ao Metrópoles ele afirma que um dos “space centers” frequentado por Laysa, o U.S. Space & Rocket Center, custa US$ 1.199 (aproximadamente R$ 6 mil) e promete experiência imersiva.

Baseado no treinamento de astronautas da Nasa, o local tem exposição de foguetes reais, simuladores de voo espacial e programas educacionais que treinam crianças e jovens como “astronautas por um dia”.

“Ela é só mais uma menina que botou uma roupa azul falando que era astronauta. Se você olhar nas fotos dela, tem até escrito [no uniforme] Space and Rocket Center Hunsville Alabama, que é o Space Camp”, afirma o criador de conteúdo.

De acordo com a investigação do canal, a única afirmação feita por Laysa nas redes sociais que pode ser comprovada é a descoberta de um asteroide, em 2021, quando a jovem tinha 18 anos, durante a campanha “Caça Asteroides” da NASA, em parceria com a International Astronomical Search Collaboration (IASC), que permite a estudantes identificar corpos celestes em imagens de telescópios.

Nasa nega vínculo com brasileira

Sobre o envolvimento com a Nasa, Laysa chegou a afirmar que liderava projetos na agência desde 2023. A investigação do canal Space Orbit aponta as seguintes inconsistências:

  • MADSS (Mars Adaptive Support System), descrito como uma sonda para Saturno ou um sistema de suporte para missões a Marte usando IA: não há registros desses projetos no site da Nasa e a ausência de menções em fontes oficiais sugere que pode ser um projeto estudantil ou colaboração menor.
  • AquaMoon, um projeto para extrair água da subsuperfície lunar: ausência de menções em fontes oficiais sugere que pode ser um projeto estudantil ou colaboração menor.
  • Experimento em Gravidade Zero, planejado para 2024, em que a jovem afirmou ser a primeira brasileira a realizá-lo: experimento não foi documentado.
  • Mission Concept Academy, onde Laysa afirma ter atuado como cientista principal no programa “Orbital Study of Vapor Plumes of Enceladus”: é um programa educacional da Nasa e sua participação como cientista principal é plausível, mas carece de confirmação.

A Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa) informou ao Metrópoles que a mineira não tem vínculos com a instituição. “Esta pessoa não é funcionária da Nasa, pesquisadora principal ou candidata a astronauta. O Programa L’Space é um workshop para estudantes – não é um estágio ou emprego na Nasa. Seria inapropriado alegar afiliação à Nasa como parte dessa oportunidade”, afirmou a instituição.

A reportagem tenta contato com Laysa Peixoto, porém, até a publicação dessa reportagem, não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestações.

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