Milícias ampliam domínio no Rio de Janeiro durante governo de direita

RIO DE JANEIRO — Dados alarmantes revelam que as milícias já controlam mais da metade do território do Rio de Janeiro, impactando diretamente a vida de 3,6 milhões de pessoas na Região Metropolitana. Esses grupos, que atuam com lógica empresarial, violência seletiva e influência política, ampliam seu domínio onde o Estado simplesmente não chega.

Ao longo de duas décadas, o avanço foi brutal. Levantamento do Instituto Fogo Cruzado e do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni/UFF) aponta que, desde 2008, o território sob controle miliciano cresceu 204,6%, chegando a 57,5% da área da cidade do Rio em 2022. Isso afeta diretamente 2,17 milhões de cariocas, um terço da população. Na Região Metropolitana, esse número salta para 3,6 milhões de pessoas.

Mesmo com uma breve retração em 2023 — causada principalmente pela ofensiva do Comando Vermelho (CV) —, as milícias seguem firmes. Na cidade do Rio, ainda dominavam 66,2% das áreas em disputa, com foco na Zona Oeste, onde o controle social, econômico e político se tornou regra.


O crime virou empresa

Ao contrário do tráfico, a milícia opera como uma empresa clandestina. Impõe monopólios sobre serviços essenciais — água, gás, internet clandestina, transporte alternativo, energia e até microcrédito — e cobra caro pela “proteção” que oferece. Em locais como Rio das Pedras, o faturamento chega a R$ 169,5 mil por dia, ultrapassando a marca de R$ 60 milhões ao ano.

Só com a venda de internet e TV clandestinas, os lucros passam de R$ 1 milhão anuais, sem qualquer fiscalização. Para os moradores, não há escolha: pagar ou sofrer represálias.


Urbanismo do crime: a cidade sequestrada

As milícias também sequestraram o mercado imobiliário. O chamado “urbanismo miliciano” grila terras públicas, ergue prédios sem nenhuma licença e comercializa moradias precárias. Foi assim que aconteceram tragédias como os desabamentos na Muzema (2019) e em Rio das Pedras (2021), que deixaram mortos, feridos e um rastro de impunidade.

A construção irregular não é exceção — é a regra. Quem se opõe, paga com ameaças, perseguições e até a vida.


Medo como política de controle

Toques de recolher, ameaças, extorsão e assassinatos fazem parte da rotina imposta por esses grupos. Igrejas, comércios, associações de moradores e até projetos sociais são cooptados para legitimar o controle territorial. Quem tenta resistir, some.

A diferença entre eles e o tráfico é só a farda que alguns já vestiram”, resume um ex-policial que atuou na Zona Oeste.


Conexões perigosas: política, milícia e impunidade

O poder das milícias não se explica só pelas armas, mas também pelas conexões institucionais. Investigações como a que apura o assassinato de Marielle Franco escancaram a teia de relações com políticos, empresários e agentes públicos.

Essa blindagem se reflete nos números. Enquanto nas áreas do tráfico 70% dos confrontos envolvem policiais, nos territórios dominados por milicianos esse índice despenca para 31,6%. A polícia está presente em 40% dos tiroteios nas áreas do tráfico, mas apenas em 4% dos tiroteios nas áreas controladas por milícias. A diferença revela uma escolha institucional sobre quem combater — e quem deixar operar livremente.


Crise interna, mas sem fim à vista

As mortes de líderes como Wellington da Silva Braga, o Ecko (2021), e Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho (2023), criaram vácuos de poder e disputas internas. Resultado: 44% de aumento nos homicídios só na Zona Oeste em 2023, segundo o Instituto Fogo Cruzado.

Mas as milícias não recuam. Ao contrário, mostram força. A queima coordenada de ônibus em outubro de 2023, que paralisou bairros inteiros, foi um recado claro: quem manda somos nós.


Enquanto o Estado não chega…

O enfrentamento às milícias exige muito mais do que operações policiais. É necessário desmantelar redes políticas, econômicas e institucionais que sustentam esse poder paralelo. Enquanto isso não acontece, milhões de moradores seguem reféns — pagando caro para sobreviver em territórios onde quem manda é o crime fardado.


O Carioca Esclarece

O termo “urbanismo miliciano” é usado por pesquisadores para descrever a ocupação ilegal e desordenada de territórios dominados pelas milícias no Rio de Janeiro, com grilagem, construção irregular e exploração imobiliária criminosa.


Entenda o Caso

1. As milícias controlam mais território que o tráfico no Rio?
Não. Desde 2023, o Comando Vermelho superou as milícias em áreas totais dominadas na Região Metropolitana. Mas na cidade do Rio, especialmente na Zona Oeste, as milícias seguem predominantes.
(Fonte: Instituto Fogo Cruzado / GENI-UFF)

2. Como as milícias lucram tanto?
Exploram serviços essenciais como água, gás, transporte e internet clandestina. Também lucram com grilagem, construção e venda de imóveis irregulares.
(Fonte: GENI-UFF / Metrópoles)

3. Por que a polícia enfrenta menos as milícias que o tráfico?
Por conta de alianças políticas, econômicas e institucionais que oferecem proteção às milícias. Dados mostram que a repressão é seletiva e muito menor nesses territórios.
(Fonte: Fogo Cruzado / GENI-UFF)

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