Gripe aviária provoca perda a produtores de ovos orgânicos no país

 

A poucos meses de vencer a primeira parcela do financiamento que fez para começar a criar galinhas em sistema orgânico, Carlos Portela Carvalho está em uma encruzilhada. Ele atua no município de Viamão (RS), a 78 quilômetros de Montenegro, onde se registrou o primeiro foco de gripe aviária em granja comercial no Brasil, e ainda não tem previsão de quando poderá receber as 300 galinhas que encomendou para o projeto.

“Foi uma surpresa muito grande. Estávamos com o projeto bem adiantado, mas, quando menos imaginávamos, surgiu essa gripe”, conta o produtor. Além dele, outras dez famílias do assentamento Filhos de Filhos de Sepé, na região metropolitana de Porto Alegre, aguardam o fim da quarentena que o Ministério da Agricultura decretou para dar continuidade ao plano de trabalhar com a produção orgânica de ovos.

Nesse sistema, as galinhas são criadas soltas, com acesso à área externa do galinheiro. Mas, com a confirmação do foco de gripe aviária em uma granja de Montenegro, o Ministério da Agricultura precisou proibir a criação de aves soltas como medida de segurança durante o período de emergência sanitária, ainda vigente no país. Com isso, granjas com mais de mil aves têm buscado adaptar seus sistemas para minimizar os impactos sobre o comportamento e o bem-estar dos plantéis.

“São galinhas que já se acostumaram com a liberdade. Então, quando você fecha as aves no galinheiro, há um impacto muito grande. Elas vão ter mais estresse, queda de imunidade, o que deixa as galinhas suscetíveis também a outras doenças”, explica Roseli Canzarolli, médica veterinária e presidente da Cooperativa dos Produtores Orgânicos de Reforma Agrária de Viamão (Coperav).

Segundo ela, foram três anos de planejamento até o início da construção dos galinheiros e a compra dos animais. Ao todo, o projeto tem capacidade para 1,5 mil aves em sistema orgânico. Outros 25 cooperados já estão na fila para dar início à criação, mas eles estão sendo orientados a aguardar o desfecho da crise sanitária no país. “Estamos em suspensão, sem saber do futuro”, relata Canzarolli.

Em média, cada produtor assumiu financiamentos de valores entre R$ 20 mil e R$ 25 mil. “Para a agricultura familiar, isso é muito investimento”, afirma a veterinária. Até o momento, os galpões seguem vazios: como os viveiros estão a menos de 10 quilômetros do foco de Montenegro, não se pode fazer nem mesmo o transporte das aves que já estão compradas.

De acordo com o Centro de Inteligência em Orgânicos, as vendas de ovos orgânicos representam entre 0,6% e 1% do mercado. É uma fatia pequena, mas com público fiel e crescente: as empresas têm dobrado o volume de comercialização a cada ano.

Mesmo para quem já instalou o plantel, as últimas semanas têm sido de adaptação e jogo de cintura para tentar evitar que as aves se estressem. Também em Viamão, o criador Edson Marcelo Gonçalves Garcia, da granja Quinta da Passiflora, diz que aumentou o controle sanitário em sua propriedade. Como tem menos de mil animais, Garcia ainda poderia manter as aves soltas, mas eles preferiu reduzir o tempo de exposição das galinhas.

“Coloquei cestas de pasto dentro do meu galinheiro para diminuir a circulação delas ao ar livre, mas não estou deixando as aves 100% do tempo presas justamente para não deixá-las estressadas. No momento em que elas se estressam, a tendência é que a imunidade delas baixe”, conta o produtor. Garcia reconhece, contudo, que a saída que ele encontrou não se aplica a qualquer criador. “Dependendo da quantidade de animais, fica inviável ter um manejo igual ao meu porque eu já trabalho com uma quantidade menor. Isso me dá mais agilidade”, ressalta.

Segundo Luizinho Caron, pesquisador da Embrapa Suínos e Aves, quanto maior a interação das aves com o meio externo, mais frágil será o aspecto sanitário do sistema de produção. “Ninguém quer produzir aves se não for para ter retorno. Por isso, essas estruturas de biosseguridade são importantes para o produtor resguardar o seu capital investido”, destaca.

Nesse sentido, o pesquisador alerta que, mesmo em pequenas criações de subsistência, com menos de mil aves, é fundamental manter as aves presas durante o período de emergência sanitária. “É importante saber que a influenza pode estar por aí, circulando em aves silvestres, e que por isso os produtores devem tomar essas medidas de biosseguridade”, diz.

A orientação é que os produtores ampliem os espaços que já existem, para que as estruturas possam comportar mais aves nesse período, ou que construam estruturas a partir de materiais já disponíveis na propriedade. Caron ressalta ainda que, mesmo quando soltas, essas aves precisam de mais atenção. “Não é necessariamente porque uma criação é de subsistência que ela é mais vulnerável. Tudo depende de como elas são criadas soltas”, completa o pesquisador.

Fonte: Globo Rural

 

 

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