“Let it Be” (Inglaterra, 1970), que estreia hoje no canal Disney+, é um dos mais torturantes documentos sobre a desintegração de uma banda. Dirigido por Michael Lindsay-Hogg, ele tem como ponto de partida uma ideia –que pouco tempo depois se mostrou desastrosa– do baixista e vocalista Paul McCartney: registrar o processo de criação e gravação de um disco dos Beatles.
O problema é que, naquela altura do campeonato, o quarteto era um poço de mágoa e desunião. O guitarrista e vocalista John Lennon estava afundado em heroína e não desgrudava da mulher, a cantora e artista plástica Yoko Ono –cuja presença causa desconforto nos músicos e, principalmente, em quem assiste ao documentário. George Harrison, guitarrista, não aceitava mais a posição de coadjuvante. É lendária a cena em que ele “peita” McCartney sobre a maneira correta de tocar uma canção do baixista. O baterista Ringo Starr não escondia a cara de decepção e a sensação de estar sendo esnobado.
O filme, portanto, é uma luta inglória de Paul McCartney em animar os outros Beatles. Ele chama para o jogo, sugere arranjos, canta “Besame Mucho” como se fosse Elvis Presley. Premia o trio com versões de “Let it Be” e “The Long and Winding Road” (que no disco homônimo foi acrescida de cordas e corais pelo produtor Phil Spector, uma versão que Paul odeia até hoje), além de criar várias versões para “Two of Us”, uma das minhas prediletas. Instrui Lennon em como tocar a guitarra de “I’ve Got a Feeling”.
O concerto no topo do prédio da Apple, empresa dos Beatles, é um breve sinal de como o quarteto de Liverpool era mágico quando estava conectado. Reforçados pelo pianista e tecladista Billy Preston, que mal é anunciado, eles tocam canções que estavam sendo trabalhadas e posteriormente seriam incluídas em “Let it Be” – entre elas “Get Back”, “Dig a Pony” e “For You Blue”.
O processo de gravação do álbum foi tão angustiante para os Beatles que eles engavetaram o material e passaram um tempo separados. Depois, fizeram “Abbey Road” (1969) e entraram novamente em crise. “Let it Be” foi montado pelo produtor Phil Spector a partir das fitas contendo centenas de horas de gravação. Chegou às lojas um mês depois da separação do grupo.
Na segunda metade dos anos 2000, o cineasta Peter Jackson se debruçou sobre os vídeos dos Beatles e apresentou outra versão da história. “Get Back”, lançado em 2021, mostra que o clima nem era tão claustrofóbico como aquele urdido por Michael Lindsay-Hogg. Mas até hoje assistir a “Let it Be” é uma experiência dolorosa.
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