Impasse sobre desoneração da folha atrapalha planejamento, afirmam representantes setoriais

Representantes dos 17 setores que se beneficiam da desoneração da folha de pagamento afirmam que o impasse em torno da continuidade do mecanismo – que inicialmente iria até o fim de 2027 – está atrapalhando o planejamento das empresas para o ano. 

A medida provisória (MP) do governo que exclui oito e reonera – de forma gradual – os nove setores restantes entra em vigor a partir de abril.  Em meio à repercussão negativa gerada pela MP, o governo ainda não definiu o que vai fazer em relação ao texto.

Mas, enquanto o Executivo não formaliza se vai retirar a MP e enviar projeto de lei sobre o tema ou se vai bancar o texto enviado ao Congresso Nacional, cresce a incerteza das empresas. É o que afirma Vivien Suruagy, presidente da Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra). 

“É importante solucionar por causa da previsibilidade. Nós temos que ter certeza se vamos manter os empregos ou não, qual vai ser a situação financeira. Nós temos que ter uma definição agora. É um absurdo, em fevereiro, estarmos com a indefinição de uma lei que foi votada, sancionada, houve derrubada de veto, e aí vem esse “segundo veto” do governo com essa medida provisória descabida com relação à desoneração”, critica. 

Indefinição

Na última segunda-feira (19), o líder do Executivo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), disse que o governo retiraria da medida provisória o trecho que trata da desoneração da folha e encaminharia um projeto de lei ao Congresso Nacional. 

Na terça (20), no entanto, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse que a discussão sobre como resolver o assunto ainda estava em andamento e que seria pauta de uma reunião entre o presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o presidente Lula. O envio de um projeto de lei sobre o assunto era uma “possibilidade”, classificou. 

Nesta quarta-feira (21), Randolfe disse que em pouco tempo o governo deve anunciar que encaminhamento dará à questão. Ele destacou que a edição de um projeto de lei no lugar do trecho da MP é uma das possibilidades sob a mesa de negociação. “Acredito que ainda esta semana o governo anunciará qual vai ser o encaminhamento.”

Fernando Pimentel, diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), afirma que o impasse é prejudicial para o setor produtivo. “O que nós estamos vivendo aqui é mais uma insegurança jurídica, que acaba gerando mais judicialização e mais custo pras empresas, mais intranquilidade, mais dificuldade de prever o futuro de curto prazo”, pontuou. 

A Feninfra, a Abit e representantes de outros setores alcançados pela desoneração da folha estiveram em Brasília nesta semana para defender a prorrogação do mecanismo junto a lideranças partidárias no Congresso Nacional. 

Líder do União Brasil e autor do projeto de lei que prorrogou a desoneração por mais 4 anos – proposta que, na prática, foi revogada pela MP do governo –, o senador pela Paraíba Efraim Filho defende que o governo retire a medida. 

“A nossa defesa sempre foi de que se preservasse os empregos para quem trabalha e a redução da carga tributária para quem emprega. É importante que a revogação da medida provisória aconteça agora, porque fica valendo a lei. Aí nós vamos ter tempo e paciência para poder fazer a análise do projeto de lei que o governo vai enviar para buscar alterar e dar sugestões sobre a lei que já foi aprovada”, diz. 

Os 17 setores defendem que eventual projeto de lei do governo sobre a reoneração não altere aquilo que o Congresso aprovou no fim do ano passado, ou seja, a continuidade da desoneração integral da folha para todas as atividades até o fim de 2027. 

“É claro que o governo tem todo o direito de vir com projeto de lei. Se bem que ele devia ter conversado no ano passado. Teve todo o tempo para isso e não o fez. Agora, [somente] a partir de 2027 se pode pensar em alguma nova ideia a respeito da desoneração. Antes disso, negativo”, diz Suruagy. 

Representante do setor têxtil e de confecção, um dos oito que a MP excluiu da desoneração, Pimentel diz que a medida vai aumentar o custo do emprego, prejudicando a geração de postos de trabalho e a competitividade  das empresas. “Ninguém está dizendo que não tem diálogo, não é nada disso, mas durante dez meses, no ano passado, isso foi discutido no Congresso. Se o Executivo não participou, se omitiu, o debate foi travado”, lembra. 

Idas e vindas da desoneração

Em vigor desde janeiro de 2012, a desoneração da folha de pagamento visa reduzir a carga tributária dos setores que mais empregam no país. Ela permite que as empresas optem pelo pagamento de uma alíquota que vai de 1% a 4,5% sobre o faturamento total (receita bruta) do negócio em vez da contribuição patronal de 20% sobre a folha de salários. 

Ao longo dos últimos 12 anos, o benefício foi prorrogado algumas vezes, sendo a última delas no fim do ano passado, quando o Congresso Nacional estendeu a desoneração por mais quatro anos. O governo vetou o texto, mas, em sessão conjunta, deputados e senadores derrubaram o veto. O projeto virou lei. 

Às vésperas do ano novo, já durante o recesso parlamentar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou a medida que onera gradualmente os setores beneficiados pelo mecanismo, indo de encontro à decisão do Legislativo. 

A MP 1202/23 acaba com a opção de as empresas recolherem os impostos tendo como base o faturamento. O texto estabelece a volta da contribuição patronal de 20% sobre a folha para oito setores, já a partir de abril. 

Setores excluídos da desoneração

  1. Call Center
  2. Confecção e vestuário
  3. Têxtil
  4. Fabricação de veículos e carrocerias
  5. Máquinas e equipamentos
  6. Projetos de circuitos integrados
  7. Tecnologia de comunicação (TIC)
  8. Proteína animal

Setores que permanecem na desoneração

  1. Calçados
  2. Couro
  3. Comunicação
  4. Tecnologia da informação (TI)
  5. Construção civil
  6. Construção e obras de infraestrutura
  7. Transporte rodoviário coletivo
  8. Transporte rodoviário de cargas
  9. Transporte metroferroviário de passageiros

As empresas desses nove setores que permanecem na desoneração foram divididas em dois grupos. Para as que ficaram no primeiro grupo, está prevista a volta progressiva da contribuição patronal, entre 2024 e 2027, da seguinte forma:  

  • 2024 – 10%; 
  • 2025 – 12,5%; 
  • 2026 – 15%; 
  • 2027 – 17,5%. 

Já para as que foram classificadas no segundo grupo, o texto estabelece o seguinte calendário: 

  • 2024 – 15%; 
  • 2025 – 17,25%; 
  • 2026 – 17,5%; 
  • 2027 – 18,75%. 

De acordo com o governo, as alíquotas reduzidas só valem para o primeiro salário mínimo de cada trabalhador. Isso significa que, no caso de um funcionário que ganhe dois salários mínimos, uma empresa classificada no primeiro grupo só terá direito ao pagamento da contribuição patronal de 10% em 2024 sobre um salário. Sobre o segundo, a empresa pagaria os 20%. 

A partir de 2028, a contribuição patronal de 20% se aplicaria a todas as atividades econômicas, inclusive sobre o primeiro salário mínimo de cada trabalhador.  

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