Suspeito de lavar dinheiro da milícia diz que sócio é ligado a crime

Um dos donos da empresa de internet da Zona Oeste do Rio de Janeiro investigada por lavar dinheiro da milícia do Bonde do Zinho relatou em depoimento que tinha medo do próprio sócio, porque ele teria vínculo com pessoas que praticam “atividades ilícitas”.

A Estrelar Web, empresa de web com sede no bairro Santa Cruz, foi um dos alvos da operação do Comitê de Inteligência Financeira e Recuperação de Ativos (Cifra), que cumpriu 21 mandados de busca e apreensão no âmbito de uma investigação sobre lavagem de dinheiro da milícia, em 28 de fevereiro deste ano.


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Os donos da Estrelar são o ex-policial militar Cássio Franco e o empresário Sebastião de Paula. No site da empresa, diz que os dois são amigos com visão empreendedora, mas, na verdade, eles brigam na Justiça desde 2021, quando Cássio acusou Sebastião de roubar dinheiro da empresa fazendo repasses para firmas de fachada.

Com cerca de 33 mil clientes nas regiões de Santa Cruz, Sepetiba e Itaguaí, a Estrelar (foto em destaque) foi criada em 2011 e teve um faturamento de mais de R$ 27 milhões no ano passado.

Receio e temor

No contexto da briga na Justiça com Sebastião, Cássio contou à polícia que temia pela integridade física e da família, e afirmou que o próprio sócio e o chefe de Tecnologia da Informação (TI) da empresa, Alexandre Ramos, teriam vínculos com criminosos.

“Que o declarante tem receio a sua integridade física e de sua família, por temer alguma retaliação por comunicar os respectivos fatos, já que Alexandre e Sebastião possui (sic) vínculos com pessoas praticantes de atividades ilícitas na região de Santa Cruz e adjacências”, detalha trecho de depoimento de Cássio em 15 de setembro de 2021.

Captura de tela com arte de documento de depoimento de dono de empresa de internet suspeita de lavagar dinheiro da milícia - Metrópoles

Resguardar a vida

Procurado pela reportagem, o advogado de Cássio, Ewerton Freire, alegou que não pode fazer acusações sem provas e que não se lembrava desse depoimento do cliente, embora estivesse presente no momento, segundo o documento policial.

“Eu não sei explicar. De repente, ele falou isso justamente para resguardar a vida dele. Eu só posso acusar alguém se eu tiver certeza, e eu não tenho certeza. Ele deve ter falado isso em sede policial por medo, para resguardar a vida dele. Eu sinceramente não sei se o Alexandre e o Sebastião têm envolvimento (com criminalidade)”, reforçou o advogado.

O defensor de Cássio alega que o cliente era uma espécie de “sócio oculto” da empresa, que fazia investimentos financeiros na Estrelar, mas não era administrador direto. Cássio nega a relação da empresa com o crime organizado.

“A Zona Oeste é um local em que o poder do Estado não consegue controlar, e ele (Cássio) tem um grande receio, porque ele não sabe o que o sócio dele é capaz de fazer. Sinceramente, fica difícil de a gente falar que a pessoa tem envolvimento com milícia ou tráfico sem provas. Eu não gosto de acusar ninguém sem provas. O que posso falar é que houve, sim, desvios da empresa Estrelar Web”, acrescentou o advogado.

Desvio de recursos

Em 21 de fevereiro deste ano, Sebastião de Paula, Alexandre Ramos e mais três pessoas foram denunciados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) por terem se apropriado indevidamente de R$ 1,2 milhão de recursos da empresa, por meio de 42 notas fiscais falsas.

Desde 28 de fevereiro, data da operação por suspeita de lavagem de dinheiro, a Estrelar está de portas fechadas e sem condições de voltar a operar. Todos os clientes seguem sem sinal de internet. O endereço de Cássio também foi alvo de busca e apreensão. Os endereços de Sebastião e Alexandre não foram alvos de busca na operação do Cifra.

“Nossa empresa está empenhada em lutar pela liberação judicial, que nos permitirá retomar as atividades e continuar a fornecer o serviço essencial de internet”, informa comunicado da Estrelar Web divulgado na quinta-feira (7/3).

Procurado pela reportagem, o advogado de Alexandre, Jorge Costa, declarou que não comenta o teor do processo sobre a briga interna da Estrelar Web, pois o documento entrou em segredo de justiça.

Além disso, Jorge classificou o caso como uma desavença comercial para perseguir desafetos e pontuou que Alexandre não responde a nenhum processo criminal.

Já o advogado de Sebastião, Marcos Cunha, frisou que o cliente não não faz parte dos autos relacionados à suspeita de lavagem de dinheiro. Ele também negou os desvios descritos no processo da briga interna da Estrelar Web.

“Estes autos correm em segredo de Justiça, inclusive estes do suposto desvio, algo que não houve e que vai ser esclarecido conforme o andamento do processo”, declarou.

Bonde do Zinho

A investigação apura lavagem de dinheiro da milícia de Luis Antonio da Silva Braga, o Zinho. Segundo a apuração, ele usa empresas de internet, terraplenagem e até artigos infantis para lavar dinheiro do crime.

Zinho é irmão de Wellington da Silva Braga, o Ecko, morto pela polícia em junho de 2021. Zinho “herdou” a posição de Ecko.

Essa foi a primeira operação do Cifra, que é uma cooperação do governo federal, das forças de Segurança do Rio de Janeiro, do Ministério Público Federal e fluminense e de órgãos de fiscalização financeira, como a Receita Federal.

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