STF analisará uso da Lei da Anistia para desaparecimentos na ditadura

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu analisar se a Lei da Anistia alcança ou não os crimes de ocultação de cadáver cometidos durante a ditadura militar e que permanecem até hoje sem solução.

Os ministros da Suprema Corte entenderam que a matéria objeto do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) nº 1.501.674 tem repercussão geral. Assim, o entendimento deverá ser seguido em julgamentos semelhantes.

O caso foi analisado em plenário virtual durante uma semana. A conclusão dos votos ocorreu às 23h59 desta sexta-feira (14/2). Apenas o ministro André Mendonça não se manifestou. O relator do caso é o ministro Flávio Dino, e o mérito será analisado no Plenário da Corte.


Guerrilha do Araguaia

  • O caso concreto envolve a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, apresentada em 2015, contra dois tenentes-coronéis do Exército.
  • Lício Augusto Ribeiro Maciel foi acusado de matar, em 1973, “mediante emboscada e por motivo torpe”, três opositores ao regime militar iniciado em 1964 e de ocultar os restos mortais deles; enquanto Sebastião Curió Rodrigues de Moura se tornou réu pela ocultação dos cadáveres das vítimas, entre 1974 e 1976.
  • Os fatos ocorreram no contexto da Guerrilha do Araguaia, movimento armado organizado por militantes do Partido Comunista do Brasil (PCB) nas proximidades do Rio Araguaia, entre os estados do Pará e do Tocantins – à época, norte de Goiás.
  • A denúncia foi rejeitada pela Justiça Federal no Pará com base na Lei da Anistia (Lei nº 6.683/1979), que perdoou os crimes políticos e conexos praticados entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.
  • O STF seguiu a mesma linha no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 153. O MPF, então, recorreu.

Delimitar Lei da Anistia

Em manifestação, o relator destacou que a questão não envolve uma proposta de revisão da decisão sobre a ADPF nº 153, mas da delimitação do alcance da Lei de Anistia em relação ao crime permanente de ocultação de cadáver – cuja ação se prolonga no tempo.

Flávio Dino considerou, ainda, que esse delito não ocorre só quando a conduta é cometida no “mundo físico”. “A manutenção da omissão do local onde se encontra o cadáver, além de impedir os familiares de exercerem o direito ao luto, configura a prática do crime, bem como situação de flagrante”, argumentou.

Dino também ressaltou o impacto social da matéria, que se relaciona com a maneira como o Brasil enfrentou a própria história, e lembrou “a conclusão milenar sobre um direito natural de pais e mães de velarem e enterrarem dignamente os filhos, o que se estende a irmãos, sobrinhos, netos, etc.”.

A análise levará em conta o alcance da decisão do STF sobre a Lei da Anistia e questões de direitos humanos relacionadas – em especial, regras e conceitos consagrados pela Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra o Desaparecimento Forçado, promulgada por meio do Decreto nº 8.767/2016.

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