Defensora quer estratégia contra “inclusão de faz de conta” em escolas

São Paulo — Em 20 anos, o número de pessoas com deficiência matriculadas em escolas regulares no Brasil aumentou mais de 11 vezes, saindo de 145 mil alunos em 2003 para 1,6 milhão em 2023. O crescimento é considerado um avanço na inclusão do grupo, mas questões como a falta de capacitação de professores, a ausência de suporte especializado, e os gargalos na adaptação dos conteúdos ainda prejudicam a experiência desses estudantes nas escolas.

“A gente precisa garantir não só acesso, que é a matrícula deste aluno, e permanência, que é a frequência dele na escola, mas também participação e aprendizagem”, afirma Renata Tibyriçá, coordenadora auxiliar do Núcleo do Idoso e da Pessoa com Deficiência da Defensoria de São Paulo.

Em entrevista ao Metrópoles, a especialista defende que é possível criar ambientes mais inclusivos olhando para estratégias como a avaliação das especificidades dos alunos.

À frente de casos em que famílias lutam para uma maior inclusão dos filhos, ela diz que a Defensoria recebe frequentemente denúncias em que pais de crianças autistas relatam que elas têm sido deixadas no fundo da sala desenhando, ou brincando com lego, enquanto outros alunos fazem atividades escolares.

“É o que a gente chama de uma exclusão dentro da inclusão, ou uma inclusão de faz de conta”, afirma.

Pós-doutora em Educação Especial, Renata afirma que é preciso investir em um “novo olhar” para o ensino, que não encare os estudantes de uma mesma turma como uma “massa homogênea”, e que entenda a necessidade de planejar as aulas de acordo com a necessidade desses estudantes.

“Cada um tem um jeito de absorver conteúdo”, afirma. “[O aluno com deficiência] tem que estar participando de todas as atividades, inclusive extracurriculares, aprendendo o currículo que é dado para os outros alunos dentro da sala de aula.”

As estratégias para garantir isso, explica Renata, podem variar de criança para criança. Por isso, a defensora afirma que as escolas devem ter professores de educação especial que ajudem a criar planos de atendimento a esses alunos, em parceria com os professores das disciplinas que atuam como regentes da turma.

Os planos, explica ela, devem avaliar as necessidades de suporte desses estudantes, suas dificuldades e também aquilo em que eles têm mais facilidade — e que pode ser utilizado pelos professores para ajudá-los.

“O que a gente precisa quando vai oferecer apoio para essa criança na escola? Eliminar as barreiras que essa criança tem para que ela consiga participar o mais próximo que as outras crianças participam e aproveitam nesta escola”.

Salas de Recursos

O Ministério da Educação já prevê que as escolas elaborem planos de Atendimento Educacional Especializado (AEE), que consideram informações como as citadas pela defensora, mas Renata afirma que as escolas acabam concentrando parte dos esforços para estes estudantes apenas nas chamadas “Salas de Recursos”.

“A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva foi concebida de uma forma que o principal apoio para o aluno fica na Sala de Recursos Multifuncionais. E aí, dentro da sala de aula, o aluno fica sem nada. Só vai ter um suporte mais específico para ele na Sala de Recursos”, diz.

Espaços equipados com mobiliário e materiais pedagógicos específicos para apoiar alunos com deficiência nos conteúdos, as Salas de Recursos Multifuncionais recebem estudantes no contraturno, em unidades escolares de tempo parcial, ou dentro do horário de aulas em escolas de tempo integral, com atividades específicas para ajudá-los. Cada sala conta com um professor especializado em educação especial.

Profissionais de apoio

Para a especialista, a Política Nacional sobre o tema precisa ser revisitada, unificando diretrizes que estão espalhadas em diferentes documentos, e garantindo uma orientação mais precisa sobre temas como, por exemplo, os acompanhantes especializados. Previstos em lei, os profissionais, que devem ajudar estudantes em sala de aula, não têm regulamentação específica definida a nível federal, fazendo com que cada rede de ensino crie regras próprias para sua atuação.

Renata também defende mudanças no quadro de funcionários das escolas para garantir mais inclusão. “O ideal seria, inclusive, que tivesse um professor de educação especial por sala, ou por grupo de salas”, afirma. O profissional, diz ela, atuaria sempre em conjunto com o professor regente da turma, o apoiando de forma a adaptar o conteúdo de acordo com as especificidades dos alunos.

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