Reprovado nas cotas de concurso do STJ recorre: “Nunca fui branco”

Rejeitado pela Comissão Recursal de Heteroidentificação do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe) para ingressar no cargo de analista do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo sistema de cotas para negros, Bruno de Oliveira Félix, 29 anos, recorreu da decisão da banca. O Cebraspe o considerou “branco, com nariz fino, lábios finos e de cabelo ondulado”, mas Bruno rebateu com fotos e alegações de vida: “Nunca fui considerado branco”, disse.

Servidor público do Tribunal Superior do Trabalho (TST) com ingresso pelo sistema de cotas para negros e também aprovado no concurso do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) como cotista, Bruno viu seu nome envolvido em uma polêmica no certame mais recente de que participou. O prazo para recurso acabou nesta quarta-feira (19/3), quando Bruno apresentou suas alegações.

O candidato contratou uma advogada para ajudá-lo. No documento, o aprovado no certame no STJ pede “revisão da avaliação de Heteroidentificação e reconsideração da decisão”. Entre as justificativas apresentadas está a baseada na Lei Federal nº 12.990/2014, a Instrução Normativa MGI nº 23/2023, e demais dispositivos.


Os argumentos previstos nas leis apresentadas pelo candidato:

  • Poderão concorrer às vagas reservadas os candidatos pretos ou pardos de acordo com o quesito do IBGE.
  • Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (Lei nº 12.990/2014).
  • Para concorrer às vagas reservadas, a pessoa deverá se autodeclarar negra no momento da inscrição no certame, de acordo com os critérios de raça e cor utilizados pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.
  • Outro dispositivo usado, o Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010), “destaca que não há diferença entre preto e pardo”.

Assim, o candidato argumenta que está apto a usufruir das vagas reservadas para candidatos negros, nos exatos termos dos dispositivos legais.

Veja fotos de Bruno:

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Cotas

A análise da comissão de heteroindentificação deu parecer preliminar de que Bruno é “não cotista” após análise. “Entendemos que o candidato não possui caracteres que o credenciam a concorrer às vagas reservadas às pessoas negras”, disse a banca no resultado.

O grupo de cotistas é formado por autodeclarados pretos e pardos, além de indígenas. Mesmo após a autodeclaração, é necessário passar no procedimento de heteroidentificação, que confirma a condição de raça do candidato. Bruno foi aprovado nesse processo em outros dois certames, inclusive o que assumiu. A banca organizadora nas duas ocasiões era a Fundação Getulio Vargas (FGV).

O ingresso no TST se deu após aprovação no certame do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Bruno ingressou na Corte Superior por meio do aproveitamento da lista de candidatos e na vaga reservada para negros.

Ao Metrópoles Bruno ressaltou o desgaste emocional que tem sofrido e que esse resultado, que mesmo preliminar, é “gritante” à realidade”.

O Cebraspe informou que o resultado é provisório. O resultado final, após o recurso será em 2 de abril. Bruno enfatizou que “nunca foi considerado branco, muito menos de cabelos ondulados”. Ressaltou ainda acreditar que as bancas de heteroidentificação devem existir para coibir fraudes, e não para eliminar as pessoas injustamente.

“É normal uma pessoa ser considerada parda em dois outros concursos e em um ser considerada branca? Acredito que é preciso um alinhamento para acabar com esses tratamentos discrepantes”, ressaltou o aprovado no STJ, em segundo lugar, pelo sistema de cotas.

Segundo ele, caso não seja considerado pardo, não será eliminado do concurso porque obteve nota também pela ampla concorrência. “Disputaria com todos os demais, não apenas com cotistas”, disse.

Estudante de escola pública

Bruno ainda contou um pouco de sua história com os estudos. “Filho de pai negro, ex-caseiro, e mãe frentista. Estudei toda a vida em escola pública. Usei programas assistenciais para conseguir me formar em direito. Estudei um ano para a prova do STJ e tive de abdicar de tempo com a família. Obtive pontuação para ficar no segundo lugar da lista de candidatos negros no cargo de analista judiciário, área judiciária”, afirmou.

Recurso

Questionado sobre a situação, o Cebraspe informou sobre a possibilidade do recurso e sobre a necessidade de aguardar o resultado final da avaliação da revisão.

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