Soluções consensuais no TCU: benefícios imediatos ao cidadão

A busca por soluções consensuais de conflitos tem ganhado cada vez mais relevância na administração pública. No Tribunal de Contas da União (TCU), essa necessidade impulsionou a criação da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso).

A SecexConsenso tem o objetivo de ampliar o debate sobre questões de alta complexidade, com abordagem colaborativa, para solucionar ou mesmo evitar longos litígios que prejudicam a entrega de políticas públicas para a sociedade. O foco de atuação da unidade está na realização de mediação técnica de conflitos relacionados a investimentos públicos de grande porte, ajudando a destravar obras e iniciativas paradas e contribuindo para a prevenção de riscos. O Tribunal, ao adotar mecanismos de negociação e conciliação, busca garantir a segurança jurídica e a efetividade das políticas públicas que, por algum motivo, enfrentam impasses que dificultam sua implementação.

A unidade tem atuado em temas contemporâneos de alta relevância e impacto para a sociedade, visando destravar investimentos e permitir a retomada de projetos estratégicos. Muitas dessas iniciativas envolvem soluções para imbróglios contratuais que, em alguns casos, se arrastam por mais de uma década sem solução administrativa, muitas das quais com demandas judiciais ou arbitragens em andamento, impedindo que a população usufrua plenamente de políticas públicas essenciais.

Soluções consensuais têm grande potencial de transformação na vida do cidadão, assegurando que a mediação de conflitos resulte em benefícios rápidos e concretos, como a continuidade de prestação de serviços essenciais, o que está alinhado com as diretrizes da gestão da presidência do TCU, que tem como prioridade contribuir ativamente para a transformação social e o desenvolvimento do país, promovendo uma administração pública mais eficiente, transparente e orientada para o bem-estar do cidadão.

Assim, o Tribunal assume um papel que vai além do controle e fiscalização tradicionais dos atos públicos, passando a impulsionar políticas públicas que melhorem a vida dos brasileiros e fortaleçam a confiança da sociedade em suas instituições.

Atuação nos últimos dois anos

Nos últimos dois anos, o Tribunal recebeu 36 pedidos de solução consensual, dos quais sete não foram admitidos por não atenderem aos requisitos estabelecidos na Instrução Normativa TCU 91/2022, que regulamenta o assunto.

Até o momento, 14 processos de solução consensual resultaram em acordos homologados pelo Plenário do TCU, enquanto quatro foram arquivados sem acordo e sete processos seguem em fase de negociação nas comissões, enquanto outros três já tiveram essa etapa concluída e aguardam homologação pelo Plenário do TCU, havendo também um processo em fase de admissão.

Entre as atuações relevantes da SecexConsenso, alguns casos podem ser destacados. Veja abaixo:

Setor elétrico

No setor energético, a mediação facilitou soluções que impactaram diretamente a conta de luz dos consumidores, permitindo ajustes contratuais e a desativação de usinas ineficientes, gerando economia significativa para o sistema elétrico nacional. Os acordos se deram com o protagonismo do Ministério de Minas e Energia, da Agência Nacional de Energia Elétrica, e de empresas que haviam sido contratadas para o fornecimento de energia elétrica por meio de usinas termelétricas.

Os contratos foram firmados em 2021, a fim de suprir falta de energia ocasionada pela escassez de chuvas que afetara a geração por parte das usinas hidrelétricas. Com a superação da crise hídrica em 2022 e a consequente diminuição da necessidade dessa energia adicional, os contratos tornaram-se economicamente onerosos, primeiro porque previam a geração de energia elétrica denominada “inflexível”, cuja produção não seria ajustável de acordo com a demanda do sistema elétrico, e segundo, em razão do alto custo da energia gerada pelas termelétricas, muito superior ao da energia gerada a partir de uma hidrelétrica.

A negociações mediadas pelo TCU resultaram na redução da obrigação de entrega de energia inflexível, admitindo-se a possibilidade de geração de energia sob demanda do Operador Nacional do Sistema, estimando-se uma economia de mais de R$ 3,1 bilhões para os consumidores até 2025, além de descontos tarifários e o pagamento à União de R$ 354 milhões em multas contratuais. Como resultado, a redução de custos com a geração de energia ajudará a evitar aumentos na conta de luz e poderá até mesmo diminuir o valor pago mensalmente pelos consumidores brasileiros.

Os acordos proporcionarão ainda a redução significativa de emissões de gases poluentes, com eliminação do uso de usinas termelétricas em períodos de baixa necessidade, promovendo eficiência e sustentabilidade no setor elétrico.

Infraestrutura rodoviária

No setor de infraestrutura rodoviária, as soluções consensuais possibilitadas pelo TCU permitiram uma reavaliação de contratos de concessão em que as empresas tinham dificuldades para cumprir os investimentos previstos, como, por exemplo, a manutenção e a duplicação das estradas. A atuação da SecexConsenso viabilizou melhorias e investimentos em rodovias estratégicas, como a BR-101, tanto no Espírito Santo quanto no Rio de Janeiro, e a BR-163 no Mato Grosso do Sul.

Com isso, foi possível superar divergências contratuais e proporcionar avanços para a mobilidade e segurança nas estradas. Como resultado das negociações, prevê-se a concretização de R$ 32 bilhões em investimentos, além da implementação de modernas práticas ambientais, sociais e de governança (padrões ESG), descontos e isenções nos pedágios, antecipação de obras e mitigação de riscos regulatórios e judiciais.

Outro caso relevante foi o encerramento consensual do contrato de concessão da BR-324/116, na Bahia. O acordo trouxe segurança jurídica para a União ao evitar disputas judiciais e arbitrais que, em valores atuais, poderiam ultrapassar R$ 9 bilhões. Com isso, abriu-se caminho para uma nova licitação que melhor atenda às necessidades da população.

Bahia e Mato Grosso: primeira solução consensual interfederativa

Por fim, destaca-se o acordo firmado entre os estados da Bahia e do Mato Grosso para a compra e venda de trens destinados ao Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) em Salvador, em que houve a primeira mediação técnica interfederativa realizada pelo TCU, por meio da SecexConsenso.

O acordo prevê que a Bahia adquira 40 composições de trens, cada uma com sete vagões, além de equipamentos necessários para a instalação do VLT na capital baiana, totalizando um investimento de aproximadamente R$ 1 bilhão. Os trens haviam sido adquiridos pelo Mato Grosso em 2014 para a implantação do VLT em Cuiabá, mas permaneceram sem uso devido à não conclusão do projeto.

Essa negociação viabiliza a execução do VLT em Salvador, cuja obra já havia sido contratada, mas haveria descompasso para recebimento dos trens somente após anos de conclusão das obras. Para o Mato Grosso, os recursos provenientes da venda dos trens serão utilizados na construção de um novo modal de transporte, o Bus Rapid Transit (BRT), e na aquisição de ônibus, modernizando o sistema de transporte público no estado. Além disso, o acordo encerra ao menos sete ações judiciais relacionadas ao consórcio responsável pelo VLT, com a renúncia a disputas que ultrapassavam R$ 800 milhões.

O trabalho envolveu os Executivos dos dois estados (BA e MT), com o apoio dos respectivos Tribunais de Contas, dos Ministérios Públicos de Contas e da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), que indicou técnicos de diferentes tribunais para atuar no caso.

Considerações finais

Os resultados concretizados no TCU após criação da SecexConsenso demonstram que a mediação e a negociação são ferramentas essenciais para modernizar a gestão pública e garantir maior efetividade na implementação de políticas públicas. Ao evitar judicializações prolongadas e promover consensos estratégicos, a unidade reforça a capacidade do Estado de solucionar conflitos de forma célere e eficiente.

Para o futuro, espera-se que a atuação da SecexConsenso continue a evoluir e seja aprimorada por meio da revisão permanente da norma que rege a atuação do TCU via soluções consensuais, consolidando sua metodologia e monitorando a implementação dos acordos homologados, garantindo a concretização dos benefícios que motivaram a celebração dos acordos.

A mediação e a solução consensual de conflitos já se mostram alternativas indispensáveis para modernizar a gestão e garantir maior transparência e previsibilidade na execução de políticas e contratos públicos, com benefícios diretos e imediatos ao cidadão.

  • Vital do Rêgo é presidente do Tribunal de Contas da União. Formado em Medicina pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), foi professor de Direito Eleitoral na UEPB de 1992 a 1995, vereador em Campina Grande de 1989 a 1995 (dois mandatos consecutivos), deputado estadual de 1995 a 2007 (três mandatos consecutivos), deputado federal de 2007 a 2011 e senador pela Paraíba de 2011 até 2014. É ministro do TCU desde 2014.
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