Presentes no rol de homens mais ricos do país, os donos da Americanas ficaram de fora de outra lista: a de denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) pela fraude de R$ 25 bilhões na empresa.
Os nomes de Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Herrmann Telles não estão fora apenas da lista de pessoas que podem ter que responder pelos crimes de organização criminosa e manipulação do mercado, os três não foram sequer citados no documento apresentado à Justiça.
Sobre o relatório da Polícia Federal (PF) sobre as investigações — e que embasou a denúncia — pode-se dizer praticamente o mesmo. O nome de Sicupira (ou Beto, como ele é comumente chamado) é o único que aparece, citado apenas em trechos das delações premiadas que integram a investigação.
Uma das vezes que Beto Sucupira aparece é no relato do delator Fabio Abrate, ex-diretor Financeiro e de Relações com Investidores, sobre como conheceu Sérgio Rial — ex-CEO das Americanas que substituiu Miguel Gutierrez, apontado como líder do esquema fraudulento.
Abrate conta, no registro da delação, que conheceu Rial em um almoço como Sucupira e que, na ocasião, o “dono” da Americanas disse que Rial “seria um potencial membro do Conselho de Administração”. O ex-CEO só foi alçado ao cargo tempos depois.
Depois, Sucupira aparece como presente em reuniões e encontros quando Rial, já prestes a assumir o cargo de CEO, questiona os números apresentados pela equipe de contabilidade das Americanas. A única “conduta” atribuída a Sicupira nos relatos é a de ter “parecido ficar surpreso” em uma dos encontros.
O nome de Lemann aparece uma única vez, em outro trecho das delações. Mas o registro dá conta apenas da participação de um “assessor de Lemann” em uma das reuniões descritas por um dos delatores.
Marcel Telles não aparece nenhuma vez em nenhuma das mais de 300 páginas.
Bilionários
Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Herrmann Telles são sócios desde a década de 1970. A parceria comercial teve início com a criação do extinto Banco Garantia. Logo depois, expandiram os negócios e criaram a 3G capital e a AB Imbev.
Os trio tem participações na Americanas desde o início da década de 1980. Quando o escândalo estourou, eles acumulavam 30% dos papéis da companhia. Com a reestruturação e a recapitalização da empresa, passaram a ser donos de metade do negócio.
Durante anos consecutivos, os empresários ocuparam as três primeiras posições da lista de maiores bilionários do Brasil. Só um deles permanece no topo do ranking: Jorge Paulo Lemann. Na lista da Forbes mais recente, o empresário aparece em 3ª lugar, com uma fortuna de US$ 17 bilhões.
Sicupira aparece na quinta posição, com US$ 7,6 bilhões. Os dois vivem atualmente, na Suiça. Marcel Herrmann Telles ficou na 24ª posição, com fortuna de US$ 2,3 bilhões.
Organização criminosa
A apuração começou buscando indícios de uma possível associação criminosa, crime bem menos grave, mas encontrou provas de que os envolvidos utilizavam a estrutura para cometer crimes que iam muito além do âmbito empresarial.
O Ministério Público Federal (MPF) seguiu o entendimento da Polícia Federal e denunciou os envolvidos pelo crime de organização criminosa, com pena de 5 a 10 anos.
Ex-executivos denunciados
A denúncia aponta que o ex-CEO Miguel Gutierrez seria o líder do esquema de manobras contábeis para inflar artificialmente os lucros da empresa e manipular os preços das ações da companhia.
Gutierrez foi funcionário da Americanas por 30 anos e comandou o grupo por duas décadas. Teria sido responsável, de acordo com a denúncia, por planejar e executar as fraudes, exercendo sua ascendência hierárquica sobre os demais.
Segundo investigação conduzida pela Polícia Federal (PF), há provas de que o esquema funcionou pelo menos desde fevereiro de 2016, perdurando até dezembro de 2022, quando Gutierrez deixou o comando da companhia.
Outro nome apontado como central no esquema é o de Anna Saicali, ex-CEO da B2W. O braço digital do grupo foi criado após a fusão entre a Americanas, Shoptime e Submarino.
Ana também ocupou o cargo de presidente do Conselho de Administração até 2021 e foi fundadora da AME Digital, a plataforma fintech da Americanas – de 2018 até junho de 2023. Assim como Gutierrez, trabalhou nas Americanas por mais de duas décadas.
Também estão no rol de denunciados dois vice-presidentes: Timotheo Barros e Marcio Cruz. Foram acusados ainda os seguintes ex-diretores e executivos: Carlos Padilha, João Guerra, Murilo Corrêa, Maria Christina Nascimento, Fabien Picavet, Raoni Fabiano, Luiz Augusto Saraiva Henriques e Jean Pierre.