Revolução dos Cravos: um abril que dura meio século-por Felipe Sampaio

Neste abril de 2025 em que Portugal segue comemorando os 50 anos da Revolução dos Cravos, vale a pena olharmos como aquele país atravessou o século XX. Primeiramente, porque o Brasil foi a principal colônia ultramarina portuguesa por 300 anos (chegando a sediar o império português no século XIX). Em segundo lugar, porque Portugal, assim como o Brasil, também viveu o último século alternando democracias vacilantes com ditaduras vigorosas.

Antes disso, cabe relembrar a importância de Portugal na História Moderna. O Estado português estabeleceu-se no século XXII com a expulsão dos árabes da região por D. Afonso Henriques, em uma aliança econômica e militar com os Cavaleiros Templários que – escorraçados Europa afora por reis e papas – abrigaram-se na conservadora corte portuguesa, sob o nome de Cavaleiros da Ordem de Cristo.

Desse modo, até o século XV Portugal acumulou conhecimento científico e recursos financeiros para se tornar a primeira potência global, com possessões na América do Sul, Ásia e África, desde o Brasil até Nagasaki no Japão, passando por Guiné, Angola, Moçambique, Goa na índia e Macau na China. Para isso, uma tecnologia de navegação transoceânica foi desenvolvida pela Escola de Sagres (naquela época a algo como uma NASA com um Vale do Silício dentro).

Mais tarde, em 1810, enquanto a família real portuguesa reinava no Rio de Janeiro refugiada das invasões napoleônicas, Lisboa passou por uma revolta que pôs fim ao absolutismo monárquico no país, instalando uma monarquia liberal baseada em três poderes independentes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Bem ou mal, o modelo sobreviveu até a erradicação completa da monarquia em 1910, dois anos depois do assassinato do Rei D. Carlos I e seu herdeiro.

Contudo, após 15 anos de democracia aos trancos e barrancos, em 1926 um golpe de Estado instalou uma ditadura que teria seu auge sob o governo de Antônio Salazar. Um apagão de 50 anos que desconectou Portugal da Europa (de um lado, evitando os estragos da II Guerra, porém, de outro, atrasando seu desenvolvimento até sua entrada na União Europeia). Ao mesmo tempo, o Ato Colonial de 1930 reafirmara o imperialismo português com a alegação de que “É da essência da Nação Portuguesa a função histórica de colonizar domínios ultramarinos e civilizar as populações…”.

Assim, as forças repressivas salazaristas completavam o pacote de privações do povo português e das colônias na África e Ásia. O Manifesto que orientou o pensamento golpista enaltecia o fascismo e o nazismo como “reações espontâneas” que garantiam ao povo os direitos e benefícios que a democracia e o comunismo não haviam conseguido proporcionar.

Em 25 de abril de 1974, setores das forças armadas portuguesas inconformados com as prolongadas “Guerras Coloniais”, desocuparam as “províncias ultramarinas” da África, para se juntarem à sociedade portuguesa para restabelecer a democracia, recolocando Portugal na rota do desenvolvimento humano e econômico.

Hoje, meio século depois, seguem os esforços portugueses pelos objetivos daquele abril inacabado (uma Revolução dos Cravos que já dura cinco décadas). Apesar do atual recrudescimento da direita no mundo e em Portugal, o país demonstra vitalidade política e cultural, modernidade tecnológica, pujança turística e inserção internacional, para enfrentar suas contradições históricas. Exemplo disso é que o atual Secretário-Geral da ONU, Antônio Guterres, é um Ex-Primeiro-Ministro de Portugal.

 

Felipe Sampaio: atuou em grandes empresas, organismos internacionais e 3º setor; foi empreendedor em mineração; cofundador do Centro Soberania e Clima; dirigiu o Instituto de Estudos de Defesa no Ministério da Defesa; foi diretor do sistema de estatísticas no Ministério da Justiça; é chefe de gabinete da secretaria-executiva no Ministério do Empreendedorismo.

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