Um grande estudo clínico internacional revelou que um novo tratamento de imunoterapia foi capaz de dobrar o tempo livre de progressão da doença em pacientes com câncer de cabeça e pescoço.
O tratamento, indicado para pacientes diagnosticados com a forma localmente avançada da doença, está sendo testado em fase 3, a última antes da aprovação de um medicamento. Os dados preliminares foram divulgados durante a reunião anual da Associação Americana de Pesquisa do Câncer (AACR) nesse sábado (26/4).
Dobro de tempo livre do câncer
A pesquisa, chamada Keynote-689, envolveu 714 pacientes em 192 centros médicos espalhados por 24 países, especialmente da Europa. Os resultados mostraram que o medicamento pembrolizumabe, quando administrado antes da cirurgia de retirada do tumor e mantido após o procedimento, pode prolongar o tempo livre de doença para até 60 meses. No grupo do tratamento padrão, a média foi de 30 meses.
Segundo os pesquisadores, o esquema de tratamento tradicional não teve mudanças significativas em mais de duas décadas. Com a introdução da imunoterapia, os especialistas observam um avanço expressivo na resposta ao câncer, especialmente nos casos em que o marcador imunológico PD-L1 estava elevado.
Imunoterapia combinada melhora resultados
Tratamentos de imunoterapia são feitos com substâncias que ensinam o próprio sistema imunológico do paciente a identificar as células tumorais e aniquilá-las. Quando bem indicados (o que tem a ver com os tipos de marcadores tumorais presentes), esses tratamentos costumam ser mais eficazes e com menos efeitos colaterais que a quimioterapia e radioterapia tradicionais.
A combinação de pembrolizumabe com cirurgia e radioterapia apresentou melhor desempenho. Após três anos, 58% dos pacientes tratados com o novo protocolo estavam vivos e sem sinais de recorrência. No grupo controle (sem imunoterapia), a taxa foi de 46%.
Estudos anteriores falharam em mostrar benefícios claros quando a droga era usada apenas com quimiorradioterapia, sem cirurgia. A nova abordagem, ao preparar o sistema imune antes da retirada do tumor, parece ter sido determinante para o sucesso do tratamento, segundo os cientistas envolvidos.
Novo protocolo pode alterar prática clínica
O professor Kevin Harrington, líder do estudo e pesquisador no Instituto de Pesquisa do Câncer de Londres, afirmou que os resultados representam uma potencial mudança de paradigma.
“A imunoterapia tem sido incrivelmente benéfica para pacientes com câncer recorrente ou disseminado pelo corpo, mas, até agora, não tem sido tão eficaz para aqueles que apresentam pela primeira vez a doença localmente avançada. Essa pesquisa mostra que a imunoterapia pode mudar o mundo para esses pacientes. Ela aumenta significativamente a chance de permanecerem livres da doença”, afirmou ele.
Para o professor Kristian Helin, diretor executivo do mesmo instituto, os dados justificam uma rápida aprovação do novo protocolo pelas autoridades sanitárias. “É ótimo ver esses excelentes resultados. Saber que alguns pacientes ainda não viram a doença retornar é realmente encorajador”, comentou.

Relatos pessoais evidenciam impacto
Além dos resultados, os pesquisadores apontaram na prática como o tratamento foi capaz de mudar a vida de pacientes. Um caso apresentado foi o de Laura Marston, 45 anos, que foi diagnosticada com câncer de língua em estágio 4 em 2019.
Após cortar a língua ao comer, a escritora desenvolveu uma úlcera persistente. A biópsia confirmou o tumor na língua e ela foi encaminhada para participar do estudo Keynote-689. O caso dela ilustra o impacto direto que a nova abordagem pode ter na vida dos pacientes.
“Passei por duas rodadas de imunoterapia antes de passar pela cirurgia em 13 de agosto de 2019. Sem essa alternativa, acredito que não teria resistido. Nos meses seguintes à minha cirurgia, tive que reaprender a comer e a falar, além de ter feito mais 10 sessões de imunoterapia, quimioterapia e radioterapia, mas minha equipe clínica foi incrível e se superou em tudo que precisei. Estou impressionada por ainda estar aqui; este tratamento me deu o presente da vida”, disse Laura.
Câncer de cabeça e pescoço
Os cânceres de cabeça e pescoço incluem tumores na cavidade oral, laringe, faringe e áreas próximas. É o sétimo tipo mais comum no mundo. Segundo o oncologista Jefferson Medeiros, de Manaus (AM), que não participou do estudo, a maioria dos diagnósticos ocorre em estágios avançados.
“Cerca de 70% dos casos só são identificados tardiamente, o que reduz significativamente as chances de cura. Precisamos de formas melhores de tratamento e que comecem o mais cedo possível”, afirma.
Entre os principais fatores de risco estão o uso de tabaco, consumo de álcool e infecção pelo vírus HPV. Feridas orais que não cicatrizam, rouquidão persistente, dificuldade para engolir e caroços no pescoço são sinais que exigem avaliação médica imediata.
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