O Dia do Trabalhador é sem dúvida o feriado mais simbólico da França. Desde 1947, o Código do Trabalho do país estabelece que esse é um dia de repouso obrigatório. Diferentemente do Natal e da festa nacional do 14 de julho, o 1° de maio não depende de um acordo coletivo ou da decisão do empregador de permitir ou não que seus empregados folguem.
Poucos setores não interrompem suas atividades neste dia, como hospitais, transportes públicos, serviços de emergência, forças de segurança, veículos de comunicação e hotéis, beneficiando-se de uma derrogação. Em várias destas funções, os funcionários recebem em dobro por trabalhar no 1° de maio. Em caso de desrespeito desta regra, empregadores correm o risco de desembolsar uma multa de € 750 (equivalente a R$ 4.835) por empregado em atividade.
Revolta de padeiros e floristas
No ano passado, padeiros da região da Loire, no oeste da França, foram autuados por abrirem seus comércios e mobilizarem empregados e aprendizes no Dia do Trabalhador. Durante alguns anos, as padarias da França puderam abrir no 1° de maio graças a uma determinação do Ministério do Trabalho – uma derrogação que foi cancelada pela Justiça francesa em 2006, considerando que “não há razão para que a atividade do padeiro seja uma exceção”.
Agora a Confederação Nacional da Panificação e Confeitaria Francesa exigem uma evolução da lei, alegando que devem trabalhar no 1° de maio os empregados de padarias e confeitarias que desejarem. O setor alega que o fechamento de seus comércios no Dia do Trabalhador gera perdas de € 70 milhões em todo o país (mais de R$ 450).
A Federação Francesa dos Artesãos Floristas (FFAF) resolveu entrar na mesma briga em um dia em que os franceses se presenteiam com “muguets”, os lírios-do-vale, uma flor branca que brota nesta época do ano no país. Como as floriculturas não são consideradas uma atividade essencial, elas não podem abrir no 1° de maio, resultando na multiplicação de vendedores ambulantes pelas ruas lucrando com o comércio desta planta. “Todo mundo pode vender muguet no 1° de maio, salvo os floristas”, reclama o presidente da FFAF, Farell Legendre.
Mobilização do governo contra sindicatos
Na última sexta-feira (25/4), senadores centristas registraram um projeto de lei para tentar aliviar a proibição de trabalhar no 1° de maio. “Não se trata, de forma alguma, de questionar o caráter de feriado e descanso dessa data, mas de reconhecer a especificidade de certas atividades, como as padarias ou os floristas”, defendem os autores do texto, Annick Billon e Hervé Marseille.
O projeto de lei ainda não tem data para análise, mas é apoiado pelo governo de Emmanuel Macron. “É um ajuste na lei para atender à tradição do pão”, argumenta a ministra do Trabalho, Catherine Vautrin.
A iniciativa também abre o debate para permitir que outras profissões exerçam suas atividades no 1° de maio. Os deputados Alain Marleix e Alexandre Portier, do Partido Republicano (direita) querem registrar um projeto de lei para permitir que outros comércios abram no Dia do Trabalhador.
No entanto, para as centrais sindicais da França, o 1° de maio não deve perder seu tradicional status. “Há outros 364 dias no ano para os comércios abrirem”, defende Sophie Binet, secretária-geral da Confederação Geral do Trabalho. A sindicalista teme que esse tipo de iniciativa alivie as leis trabalhistas, como ocorreu com as derrogações para a abertura de comércios aos domingos.
Manifestações em toda a França
Além da questão dos padeiros e dos floristas, as palavras de ordem para os protestos deste 1° de maio variam de acordo com as centrais sindicais. Mas os reajustes salariais e a revogação da reforma da Previdência estão no topo da lista de reivindicações neste ano. Outros temas vistos em cartazes nas ruas são a luta “contra a extrema direita, a defesa da paz, das liberdades e justiça social.
Cem dias após a chegada de Donald Trump ao poder, as centrais sindicais CGT, FSU e Solidaires também fazem deste 1° de maio uma data “contra a ‘trumpização’ do mundo e o movimento internacional reacionário que está se desenvolvendo em todos os lugares”. Essas organizações convidaram sindicalistas estrangeiros, principalmente argentinos, americanos e belgas, para participar da passeata parisiense, que começa às 9h pelo horário de Brasília. O trajeto na capital vai da praça da Itália à praça da Nação.
O policiamento foi reforçado com 2.000 agentes na região parisiense. Autoridades policiais temem ações violentas e vandalismo pela infiltração de 200 black blocs, segundo informações dos serviços de inteligência.
Salários defasados
Em seu site, o jornal Libération publica os resultados de um estudo realizado pela ONG Oxfam com 1.984 empresas em 35 países. Enquanto a remuneração dos CEOs aumentou 50% em cinco anos, os salários dos empregados ganharam apenas 0,9%. Dos 18 grupos franceses cobertos pelo levantamento, a remuneração anual dos CEOs ultrapassou US$ 1 milhão em 2024, incluindo bônus e opções de ações.
A remuneração média dos CEOs em todo o mundo atingiu US$ 4,3 milhões em 2024, em comparação com US$ 2,9 milhões (ajustados pela inflação) em 2019. Esse aumento, destaca a Oxfam, “supera amplamente o aumento nos salários médios reais dos empregados, que foi de apenas 0,9% durante o mesmo período em países onde há dados disponíveis sobre a remuneração dos CEOs”. Para a Oxfam, este fenômeno é sistêmico.
As desigualdades salariais entre homens e mulheres também são persistentes. Ainda nesta mesma amostra global, não só as mulheres são raras na liderança das grandes empresas — elas representam apenas 5,7% dos CEOs — como as trabalhadoras nestes países recebem, em média, salários 16,7% inferiores do que os seus colegas homens em 2023.
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