São Paulo — A investigação da Polícia Federal (PF) que deu origem à Operação Narco Vela, deflagrada na última terça-feira (27/4), aponta como traficantes ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) criaram estratégias para exportar cocaína à Europa, driblando mecanismos de fiscalização.
O principal método adotado pelos alvos da PF seria a utilização de pequenas lanchas carregadas da droga, partindo do litoral paulista rumo a veleiros em alto-mar, que cruzam o Oceano Atlântico e são descarregados na costa da África.
Após sucessivas apreensões, o modelo de exportação de cocaína ficou “moiado”, segundo conversas interceptadas entre alvos da PF, e o grupo passou a pensar em rotas alternativas, criando uma base operacional em Belém, no Pará.
O núcleo da organização criminosa, segundo a PF, era coordenado por Klaus de Castro Rios Motta e Silva, diretamente ligado ao empresário Marco Aurélio de Souza, o Lelinho, apontado como um dos principais exportadores de cocaína do país.
A descoberta do novo segmento da organização foi feita a partir da apreensão de 560 kg de cocaína na Ilha do Mosqueiro, em Belém, em maio do ano passado. A droga estava em uma lancha KM1, ancorada na marina Marine Park, quando foi apreendida.
A partir dos pagamentos para manter a embarcação no local, a PF conseguiu rastrear seu vínculo com o grupo criminoso. A responsável pela marina também forneceu prints de conversas de WhatsApp com Klaus e Ivan de Freitas Santos, que teria sido o responsável por trazer a lancha de São Paulo até o Pará.
“Sob a coordenação de Klaus, foi constituído um subgrupo operacional com atuação voltada à região Norte do país, possivelmente como estratégia para se esquivar da crescente fiscalização nas imediações do Porto de Santos. Esse núcleo secundário passou a operar intensamente nos Estados do Maranhão e do Pará”, diz a PF no documento que deu origem à operação.
Além de Klaus e Ivan, participavam do grupo, de acordo com a PF, Anderson Monteiro Gomes, Julio Cesar Fernandes e Sergio Ruiz da Silva. Todos foram alvos da PF na última terça-feira (29/4).
Elo com PCC
Para a Polícia Federal, o elo entre a organização criminosa liderada por Lelinho e o PCC fica explícito a partir de conversas envolvendo Gabriel Gil Bernardo, o Jogador, que seria integrante da facção.
“Segundo os elementos apurados, Jogador ocupa posição de liderança dentro da organização criminosa sob investigação, sendo apontado como responsável direto pela tomada de decisões estratégicas envolvendo o tráfico de entorpecentes em larga escala”, diz a PF.
Além das conversas, a PF apontou que Adenilso Antônio dos Santos, que presta serviço de contabilidade para Jogador, também atua para a empresa de Lelinho, a Máximo Serviços Marítimos. Eles teriam atuado de forma conjunta para a compra de embarcações e para alinhar as estratégias para a exportação das drogas.
Em conversas mencionadas pela PF, Lelinho chega a submeter o nome de Klauss à “disciplina” do PCC, setor da facção responsável por julgar e punir aqueles que infringem o código do crime.
“A submissão do nome de Klaus à disciplina do PCC, em razão de supostos desacordos financeiros entre ambos, reforça a hipótese da existência de relação criminosa estável entre Lelinho, Klaus e a própria organização criminosa”, diz a PF.
Apreensões
A descoberta dos 560 kg de cocaína em Belém, em maio de 2024, ocorreu após duas importantes apreensões de drogas que seriam da organização criminosa em anos anteriores.
- Em julho de 2022, 1,9 tonelada de cocaína foi apreendida em uma lancha do tipo GoFast durante uma operação conjunta entre Brasil e Espanha no município de Aldea de San Nicolás.
- Em fevereiro de 2023, a guarda costeira dos Estados Unidos apreendeu 3 toneladas de cocaína no veleiro Lobo IV em águas internacionais. A embarcação teria partido de Ilhabela, no litoral norte de São Paulo, e seguido em direção a Guiné Bissau, na África, onde seu responsável, Flávio Fontes Pereira, foi preso.
- Por meio das posições dos telefones celulares rastreadas por satélite, há suspeita é que ele também estivesse envolvido na apreensão Aldea de San Nicolás.
- Detido, Flávio Fontes teria fornecido uma série de informações às autoridades que teriam ajudado a compreender o funcionamento do esquema.
- Entre março e abril de 2023, satélites teriam registrado uma travessia internacional envolvendo a empresa JackSupply. A suspeita é que uma embarcação tenha viajado à Europa para entregar cocaína.